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Luiza Pastor

Em Brotas, o ecoturismo que privilegia o automóvel

Rafting, tirolesas, cachoeiras e rapel são alguns dos atrativos da cidade paulista que não quer turismo de massa e vai receber autódromo

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- Mãe, que lugar você sugere para um passeio no mato, não muito longe de São Paulo?

A inquisidora já havia disparado caneladas indiretas várias vezes nos últimos meses, em especial desde que comecei a publicar este blog. A cria, uma mulher linda de 28 anos (sim, mãe coruja presente), fazendo 29 no dia em que começa esta história. E finalmente tivemos nosso momento mamãe-e-filhinha no meio do mato. Quer dizer, nem tão mato assim. Um mato, digamos, diferenciado.

- Que tal passar seu aniversário em Brotas?

E lá fomos nós duas —de ônibus—, emendar três dias de intensa atividade.

Bote desce as corredeiras do rio Jacaré-Pepira, em Brotas
Bote desce as corredeiras do rio Jacaré-Pepira, em Brotas - Arquivo pessoal/Agência EcoBrotas

A pequena Brotas fica a 250 quilômetros de São Paulo, na região central do estado, tradicional produtora de cana-de-açúcar. É um dos destinos de turismo de aventura que melhor se estruturaram nos últimos anos no país, graças à fama das corredeiras que atraem os amantes do rafting, a arte de evitar se esborrachar contra pedras e galhos em meio a fortes correntes de água singradas em botes de borracha rio Jacaré-Pepira abaixo, e uma série de atrativos de ecoturismo que vieram na esteira, como o arborismo, as tirolesas, o boia cross e uma boa dúzia de cachoeiras que valem cada um dos muitos centavos investidos. Sim, porque Brotas é uma cidade cara, e não faz a menor questão de mudar seu perfil.

"Queremos um turismo de qualidade, não de quantidade, porque nosso foco é preservar o meio ambiente e isso não combina com turismo de massa", argumenta Fábio Pontes, secretário de Turismo da cidade. Com um fluxo que, em 2022, chegou a 450 mil visitantes com despesas diárias médias de no mínimo R$ 400 "assim, considerando bem por baixo e sem contar com a informalidade", como diz, o ecoturismo e o turismo de aventura são a segunda maior fonte de receita local, perdendo apenas para o agronegócio e sua vasta produção de cana-de-açúcar. No ano passado, conta Pontes, o setor gerou receita de R$ 180 milhões. Vale lembrar que o município contabilizava, em 2020, uma população fixa estimada em menos de 25 mil habitantes, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas).

Descida de tirolesa em Brotas
Descida de tirolesa em Brotas - Divulgação/Sandro Fraga

Um dos diferenciais que tornam Brotas ainda mais exclusiva é o fato de que não há, na cidade, um sistema de transporte que permita a quem chega lá sem carro próprio acessar a grande maioria dos atrativos. Praticamente só o rafting conta com traslado na maioria das agências que vendem os pacotes aos visitantes. Para os demais passeios, o incauto que chegou lá de ônibus precisa contar com o bom humor de meia dúzia de taxistas que pressionam a prefeitura a assegurar-lhes os privilégios e não autorizar a entrada de aplicativos como a Uber. "Eles são pessoas idosas, em sua maioria, que sempre trabalharam assim", tenta justificar Pontes. Por "assim" ele quer dizer que o preço é combinado com o interessado a olho, em uma tabela informal que chega a valores absurdos, os quais acabam sendo contornados por guias das mesmas agências, que oferecem o serviço em seus carros particulares por valores muito menores. Um sistema amador demais para uma cidade que vive do setor, convenhamos.

"Sim, estamos buscando uma solução e tentando trazer o aplicativo para a cidade, mas ainda estamos negociando", desconversa Pontes, sempre repetindo o mantra da quantidade x qualidade. Sobre a possibilidade de se implantar pelo menos um sistema de aluguel de bicicletas, então, diz que algumas conversas tentadas simplesmente não foram adiante. Embora o cicloturismo seja um dos atrativos locais, cada um que traga a sua bike ou compre o pacote em, claro, alguma das agências.

Acelera, Rubinho!

Para reforçar ainda mais o perfil de destino sofisticado e para poucos, está sendo implantado na cidade o projeto Raceville Speed Club, que Pontes cita três vezes ao longo da conversa de minutos como um clube exclusivo de milionários encabeçados por Rubens Barrichello, ele mesmo, o ex-piloto da Fórmula 1, que vai levar um autódromo para a cidade. O título para desfrutar da sociedade, segundo Pontes, custa R$ 500 mil, e apenas 520 serão vendidos a um público selecionado. E, como os interessados já avisaram que chegarão com seus carros elétricos, Brotas está correndo para implantar pontos de abastecimento específico, coisa que ainda não existe por lá. Além disso, o local terá pista de pouso de aeronaves e heliponto, além de voos compartilhados a serem definidos.

Mas não é uma contradição levar um autódromo, um heliponto e um aeroporto para uma cidade que se orgulha de viver da preservação das maravilhas do meio ambiente? "Não, porque a área de 25 mil alqueires que foi comprada pelos investidores do clube é hoje uma plantação de cana-de-açúcar, que vai ser retirada e reflorestada", responde o secretário. "Apenas 5% vão ser utilizados pela pista, e o projeto prevê capturar 700 toneladas de gás carbônico, recuperando a área hoje ocupada pela cana, além de gerar energia solar cujo excedente vai ser doado para a cidade", acrescenta.

Traçado que abrigará o autódromo de Raceville, em Brotas
Traçado que abrigará o autódromo de Raceville, em Brotas, no que hoje é um canavial - Divulgação

O Raceville, com inauguração prevista para novembro, coincidindo com o Grande Prêmio de Fórmula 1 no Brasil, terá como protagonista a pista de 3,6 quilômetros, cujas curvas pretendem reproduzir as dos autódromos de Silverstone, Spa-Francorchamps, Interlagos, Suzuka e Barcelona, por onde pilotos brasileiros fizeram história na F-1. Aos privilegiados sócios será oferecida ainda uma frota de modelos esportivos de até 600 cavalos de potência que poderá ser utilizada por eles, "em uma mistura de emoção e tecnologia em meio à natureza", como diz o material de divulgação do empreendimento.

Então, tá. Campos do Jordão que se cuide.

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