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Nas redes, bolsonaristas convocam boicote e criam clima de terror contra opositores em Monte Sião (MG)

'Está uma caça às bruxas generalizada', diz filha de dona de estabelecimento; grupo buscará solução jurídica

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São Paulo

Moradores da cidade de Monte Sião, no interior de Minas Gerais, estão se mobilizando em grupos do WhatsApp para boicotar estabelecimentos e serviços de pessoas que teriam votado a favor do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Um grupo chamado "Boicote Petista M Sião" compartilhou a lista com nomes de empresas e seus proprietários.

"Aí tá a lista dos desgraçados que votaram contra nós, contra a cidade nossa. Não pensam em nós que vendemos tricô. Vamos ver se conseguimos não pensar neles também quando forem comprar as coisas que precisarem. Nem que pague mais caro, vamos comprar em outro lugar. Para mostrar para esse povo filha da mãe. Não pensou na cidade nossa, não vamos pensar neles também, não", diz um dos áudios encaminhados, ao qual a Folha teve acesso.

A cidade no sul de Minas Gerais é conhecida como a Capital Nacional do Tricô e tem cerca de 21 mil habitantes, dos quais 76,47% votaram em Jair Bolsonaro (PL) para a reeleição. De acordo com uma publicação do jornal Estado de Minas, foi o maior percentual para Bolsonaro no estado.

Ao saber da mensagem, os proprietários dos estabelecimentos e prestadores de serviços citados se agruparam para buscar aconselhamento jurídico. O objetivo é interromper a circulação da lista e responsabilizar legalmente os envolvidos.

Grupos de WhatsApp de moradores de Monte Sião (MG) divulga lista de empresas supostamente petistas para boicote
Grupos de WhatsApp de moradores de Monte Sião (MG) divulga lista de empresas supostamente petistas para boicote - Reprodução/WhatsApp

Alguns alvos da lista emitiram notas de esclarecimento criticando o repúdio a qualquer candidato ou partido político, defendendo a liberdade de todos e informando sobre medidas judiciais contra o boicote. O grupo foi instruído por advogados a iniciar ações individuais.

A cabeleireira Patrícia Lima Castro, 38, denunciou o movimento com um vídeo em seu Instagram. A sócia do salão de beleza Conceito NVC atende na cidade há 16 anos e diz que nunca se manifestou politicamente para evitar ataques.

"Agora meu nome saiu numa lista para boicote. Quero deixar um recado aqui para as corajosas, porque atendemos exclusivamente mulheres: para vocês, corajosas, que eu atendo aqui e estão espalhando essa lista e nos boicotando, deixarem seus nomes nos comentários", diz na publicação. Comentários de apoio prevalecem. Sua irmã e a família também aparecem na lista divulgada pelos bolsonaristas.

Verônica Canela Estevam dos Santos, 23, filha da dona da loja Cor e Arte, diz que na segunda-feira ninguém foi atendido. Uma pessoa apareceu para fechar a conta. Por enquanto é impossível afirmar se isso está relacionado à lista, porque o fluxo de pessoas na cidade também sofre o impacto das vidas fechadas pelos bolsonaristas. "Tiraram terra das encostas com tratores e colocaram em frente ao portal da cidade. Não deixam ninguém passar", diz.

Verônica diz que seu pai, Maurício Estevam dos Santos, é integrante do PT há 34 anos e atual presidente do diretório do partido em Monte Sião –mas sua mãe, dona da loja, não. Ela diz ainda que a lista está sendo atualizada com frequência. "Está uma caça às bruxas generalizada", diz.

O maquiador Eduardo Faria, 27, diz que se manifestou nas redes sociais antes do segundo turno e ainda não sabe qual será o impacto da lista na sua agenda de trabalho. Ele atende mais aos fins de semana, mas está com medo de sair na rua. "Sou homossexual, fico com medo agora de sair e ouvir piadinhas desnecessárias ou sofrer agressão verbal", diz.

Já o dono do Santo Malte, um bar especializado em cervejas especiais e hambúrguer artesanal, Vitor Guinesi, 37, conta que nunca se posicionou politicamente e foi pego de surpresa por aparecer nas listas que estão circulando nos grupos de WhatsApp da região. "Isso me preocupa, ainda mais nesse momento de ódio e segregação que vivemos".

Gabriel Azevedo, 22, também aparece na lista. Ele é lutador de karatê, funcionário público e motoboy aos fins de semana. Ele conta com parcerias entre comerciantes locais para treinar. Gabriel diz que fazia campanha para Lula nas redes, mas na maioria das vezes não respondia aos ataques.

"Viver isso está sendo inacreditável, nunca imaginei ter medo de andar pelas ruas da minha cidade. Hoje fico com medo de ser agredido". Ele também cita a força bolsonarista em Monte Sião e as barreiras que impedem a passagem de moradores e visitantes. "Estão agindo como donos, que abrem e fecham quando quiserem, deixando várias pessoas sem acesso ao hospital, aos empregos, a tudo. Está difícil de suportar", diz

Se alguma lista de boicote também está circulando na sua cidade, conte para a Folha neste link.

Outros moradores da cidade também compartilharam informações sobre as barricadas e publicações xenofóbicas publicadas por empresários da região, mas pediram para não ser identificados. Nesta segunda-feira, um dia após o segundo turno, a página da prefeitura Monte-Sionense no Facebook publicou imagem informando o cancelamento de um jantar nordestino que aconteceria na cidade.

Na tarde desta terça-feira (1º), a hashtag #DemitaUmPetista aparece no Twitter.

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