Que imposto é esse

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Que imposto é esse - Eduardo Cucolo
Eduardo Cucolo
Descrição de chapéu Reforma tributária Folhajus

Teto da reforma tributária abre possibilidade de discutir corte de despesa, diz advogado

Tércio Chiavassa, do Pinheiro Neto Advogados, espera discussão mais demorada no Senado e diz que texto pode ser melhorado

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São Paulo

O teto de 26,5% aprovado pela Câmara dos Deputados na regulamentação da reforma tributária é uma oportunidade não só para rever benefícios fiscais, mas também para adequar os gastos públicos à carga tributária sobre o consumo.

Essa é a avaliação do advogado Tércio Chiavassa, sócio e coordenador da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.

Em entrevista à Folha, ele afirma que é possível que o teto seja derrubado no Senado. Se for aprovado pelo Congresso, pode ter sua constitucionalidade questionada, pois estaria limitando a competência de estados e municípios fixarem suas próprias alíquotas, o que foi assegurado na emenda constitucional da reforma.

homem de terno e gravata
Tércio Chiavassa, sócio e coordenador da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados - Ricardo Reis/Divulgação/Pinheiro Neto Advogados

Essa, no entanto, é uma discussão para a próxima década, quando os novos tributos estiverem sendo implantados.

Chiavassa também afirma que o texto não deve ter uma tramitação tão rápida no Senado e que a Casa revisora terá oportunidade para melhorar vários pontos do projeto, como a inclusão de carros elétricos, bebidas açucaradas e minerais no imposto seletivo.

Ele vê um período turbulento para as empresas durante a transição para o novo sistema, mas diz esperar ganhos para o país no médio e longo prazo.

Veja trechos da entrevista.

Trava na alíquota

É interesse do governo derrubar essa trava, e o governo tem argumentos bons. Isso desbalanceou o cálculo que o Bernard Appy fez no início, que seria 26,5%. Houve mudança de alguns produtos, especialmente na carne e em algumas outras coisas que também tinham uma previsão de redução de alíquota, e agora passaram por uma diminuição ainda maior.

E tem uma possível alegação de inconstitucionalidade, a partir do momento que os estados e municípios não tenham a prerrogativa de disciplinar de forma autônoma as suas alíquotas. Qual é o critério que eles vão utilizar para chegar em 26,5%? Municípios e estados que vão ter que reduzir o IBS [Imposto sobre Bens e Serviços] ou a União vai ter que reduzir a CBS [Contribuição sobre Bens e Serviços]? Lembrando que tudo isso é algo que vai ter que ser verificado lá na frente, em 2030.

Revisão de despesas

O que seria positivo da trava é entregar para a sociedade aquilo que se prometeu, que seria, no máximo, 26,5%. Então tem que ser feito um esforço para que não haja uma carga maior. Mas não adianta só mexer no lado da receita. É uma possibilidade que se abre para ter uma pressão para controle de despesa pública. A gente ainda não tem uma sociedade madura para isso. Mas estamos falando daqui a cinco, seis anos. Vamos discutir os dois lados da equação.

Queda na sonegação

A partir do momento que implemente esse sistema de split payment, que é um dos corações da reforma, você vai ter uma diminuição sensível na sonegação. Ele [Appy] disse que pode chegar a 15%. Com otimismo, 20% a mais. Também vai ser uma forma de equilibrar. Quando a gente vai saber isso? Quando começar a ter arrecadação. Daqui a dois anos começa para a CBS. A gente já vai ter um termômetro. Um pouco mais lá na frente para o IBS.

Aprovação fácil

No Senado, a minha sensação é que a discussão não vai ser tão atropelada. Na Câmara passou fácil demais. O Senado defende o interesse dos estados. Então vai ter agora uma disputa maior. Será que o Senado consegue rapidamente aprovar isso? Eu tenho dúvida.

Crédito condicionado ao pagamento

Esse é um ponto que divide bastante os tributaristas. Muitos acham que é um absurdo você exigir o recolhimento [do imposto pelo fornecedor para ter o crédito]. Os que acabam indo nesse caminho continuam com a cabeça no sistema atual, que não precisa ter o pagamento na cadeia anterior para tomar o crédito.

Agora você precisa ter o pagamento. Temos agora um tributo completamente novo. Ficar pensando com a cabeça do anterior não vai funcionar. Desde que o sistema funcione, que seja realmente rápida essa verificação do pagamento e do crédito, e eles estão falando que vai ser praticamente imediato, não me parece um problema.

Açúcar no imposto do pecado

O imposto seletivo despertou muita polêmica e tem alguns pontos que preocupam. Um exemplo é o do açúcar. Na cesta básica, é alíquota zero. Aí você põe o açúcar no cafezinho e também não paga nada, é zero. Mas se põe açúcar no refrigerante, tem a tributação pelo imposto do pecado. Tem uma discriminação que não é adequada.

A exemplo do açúcar, outros podem ser contestados. Todo mundo vendeu até hoje o carro elétrico como um bem que não é prejudicial para o meio ambiente. Agora vai ser mais tributado pelo imposto do pecado porque ele é prejudicial por causa da bateria. Tem alguns pontos aí que deveriam ter uma discussão mais aprofundada para ter uma base mais efetiva e científica.

Outro exemplo é a questão da mineração. A emenda constitucional do ano passado da reforma tributária fala que você poderia ter uma alíquota até de 1%. Resolveram deixar em 0,25%. Mas tem que lembrar que já existe um tributo, uma cobrança específica, a CFEM, pelo fato de quem explora o solo causar um dano. Então você está tendo uma dupla incidência. Alguma coisa talvez ainda seja revista no Senado. Se não for, vai virar discussão judicial.

Redução do contencioso

A médio e longo prazo você terá, sem dúvida, uma melhora. Em um primeiro momento, vamos dar quatro ou cinco passos para trás. Especialmente no período de transição em que você vai ter dois sistemas ao mesmo tempo. Para as empresas vai ser tumultuado.

Deve diminuir a quantidade de discussões judiciais. Lá na frente, porque a gente tem pelo menos um período de 12 anos em que você vai conviver com as mesmas discussões do passado e as novas. A gente vai ter uma diminuição das discussões judiciais e administrativas daqui 15 anos. Simplificando, vamos ter um Brasil melhor daqui duas décadas.

Neutralidade

Um ponto que também é o coração dessa reforma do consumo é a neutralidade, a certeza que a oneração será só na última cadeia, no consumidor mesmo. Nas cadeias intermediárias, não tem retenção de tributo, vamos chamar assim, só o valor efetivamente agregado vai ser tributado no final. Com isso vai ter uma otimização e uma diminuição na carga.

Essa neutralidade, para ela dar certo, o split payment tem que dar certo. Na teoria vai ser muito bom. Esperamos que realmente ela seja executada de uma forma que corresponda ao que está no papel. Se os mecanismos funcionarem, a neutralidade acontecer, o split payment acontecer, nós teremos sim essa simplificação.

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