Brasileiro é premiado no IgNobel com pesquisa sobre beijo e desigualdade

Marco Varella, que já foi colaborador da Folha, faz parte de grupo de pesquisa internacional que levou láurea

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São Carlos (SP)

Conhecido por premiar os estudos que “primeiro fazem rir e depois levam a pensar”, o IgNobel, ou Nobel da pesquisa improvável, decidiu destacar o trabalho de um cientista brasileiro que se inspira em Darwin para entender a química dos relacionamentos.

Marco Antonio Corrêa Varella, 38, que está fazendo seu segundo pós-doutorado no Instituto de Psicologia da USP, é um dos membros do grupo internacional que faturou o IgNobel de Economia de 2020. Ele e seus colegas demonstraram que, em países com maior desigualdade de renda, os casais costumam trocar mais beijos na boca entre si, enquanto os países mais igualitários têm comportamento menos romântico, ao menos nesse aspecto. A análise, feita a partir de dados de 13 países de seis continentes, saiu na revista especializada Scientific Reports.

Varella, que já foi colaborador da Folha, conta que a equipe já estava sabendo da láurea desde o fim de março. “Apareceu um email com a tarja ‘estritamente confidencial’ na caixa de entrada. O Chris [Watkins, pesquisador da Escócia que coordenou o trabalho] perguntou se alguém tinha objeções a ser associado ao IgNobel, mas todo mundo ficou super animado. A surpresa foi saber que o prêmio ficou na área de economia”, brinca.

O pesquisador brasileiro Marco Varella, vencedor do IgNobel
O pesquisador brasileiro Marco Varella, vencedor do IgNobel - Arquivo pessoal

A psicologia evolucionista tem como objetivo entender a mente e o comportamento humanos com base em motivações que teriam sido forjadas ao longo da evolução da Homo sapiens. Entender como e por que as pessoas escolhem seus parceiros —seja para relações sexuais fugidias, seja para a vida toda— é um tema central da área, já que as características desses parceiros são essenciais para gerar e criar filhos com sucesso. O jogo da seleção natural, por definição, é vencido por aqueles que conseguem deixar mais descendentes férteis.

“Manter a estabilidade da parceria por tempo suficiente para poder criar os filhos, esse ‘eterno enquanto dure’, é um dos principais desafios na espécie humana”, explica o pesquisador. “A frequência do beijo parece ser um elemento importante para fortalecer o elo do casal em ambientes de muita desigualdade, onde você pode estar muito bem na fita ou muito mal na fita, digamos, e pode surgir a tentação de abandonar o relacionamento em favor de uma opção melhor.”

Junto com outros colegas do exterior, Varella também ganhou neste ano o prêmio Margo Wilson, oferecido pela Sociedade do Comportamento Humano e Evolução. No estudo, a equipe criou um índice para mapear os fatores que levam à formação de casais cujos membros normalmente se parecem entre si (de fato, essa semelhança, tanto física quanto mental e cultural, é o mais comum entre casais da nossa espécie).

“A psicologia evolucionista costuma chamar a atenção do IgNobel por tratar desses temas mais populares, que mexem diretamente com a gente. Não vejo problema nenhum. Afinal, está tão raro conseguir fazer as pessoas rirem e, principalmente, pensarem”, pondera ele.

Nascido na capital paulista, Varella cursou biologia na Unesp de São José do Rio Preto ​e fez mestrado e doutorado na USP. Nos congressos científicos de que participou, conheceu sua mulher, Jaroslava Varella Valentova, hoje professora do Instituto de Psicologia da USP, com quem tem dois filhos.

Brasileiros já tinham ganhado edições anteriores do prêmio em 2008 e 2017, em áreas como arqueologia e zoologia. Neste ano, houve ainda o destaque negativo para o Brasil na categoria Educação Médica. O presidente Jair Bolsonaro, junto com o americano Donald Trump e outros chefes de Estado que minimizaram a pandemia, foram premiados por “ensinar ao mundo que políticos podem ter mais efeito sobre a vida e a morte do que cientistas e médicos”. ​

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