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Por que a Nasa está voltando para a Lua

Voo inaugural de novo foguete lunar seria lançado nesta segunda-feira (29), mas foi adiado após falha em um motor

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Kenneth Chang
The New York Times

"Nós vamos." Esse é o slogan que a Nasa está usando na preparação para o voo inaugural de seu novo foguete lunar, que seria lançado na segunda-feira (29), mas foi adiado após uma falha em um dos motores. A frase é repetida por autoridades da agência, adicionada como hashtag em postagens de rede social e proclamada em faixas penduradas no local de lançamento no Centro Espacial Kennedy, na Flórida.

Se você não é um aficionado do espaço, enviar astronautas de volta à Lua pode parecer uma grande bobagem.

O foguete Space Launch System (SLS) com a cápsula Orion repousa sobre a plataforma 39B, antes da falha no lançamento da missão Artemis 1
O foguete Space Launch System (SLS) com a cápsula Orion repousa sobre a plataforma 39B, antes da falha no lançamento da missão Artemis 1 - Joel Kowsky/NASA

Para quê? Já fomos até lá. Por que a Nasa vai repetir o que fez meio século atrás, especialmente já que astronautas não pisarão na Lua por vários anos e, nessa época, a Nasa terá gasto cerca de US$ 100 bilhões?

Os diretores da Nasa afirmam hoje que as missões lunares são vitais para o programa de voos espaciais tripulados, e não uma simples repetição dos pousos lunares da Apollo de 1969 a 1972.

"É um futuro em que a Nasa pousará a primeira mulher e a primeira pessoa de cor na Lua", disse o administrador da Nasa Bill Nelson durante entrevista coletiva este mês. "E nessas missões cada vez mais complexas os astronautas viverão e trabalharão no espaço profundo e desenvolverão a ciência e a tecnologia para enviarmos os primeiros humanos a Marte."

Essa é uma mudança em relação a 2010, quando o presidente Barack Obama fez um discurso no local onde os americanos foram lançados à Lua e disse que a Nasa deveria mirar destinos mais ambiciosos como asteroides e Marte e ir além da Lua.

"Já estivemos lá", disse Obama.

O programa atual foi chamado de Artemis pelos líderes da Nasa durante o governo Trump. Na mitologia grega, Artemis era a irmã gêmea de Apolo. O primeiro passo do programa será o próximo voo de teste do foguete lunar, conhecido como Space Launch System (Sistema de Lançamento Espacial), com a cápsula Orion no topo, onde os astronautas se sentarão nas futuras missões. Esse voo não tripulado, durante o qual Orion vai dar uma volta na Lua antes de retornar à Terra, é para resolver quaisquer problemas com a espaçonave antes de colocar pessoas a bordo.

Após a falha no lançamento do foguete nesta segunda, A Nasa deve tentar novamente na sexta (2) ou na segunda (5). Os meteorologistas previam no sábado (27) uma probabilidade de 70% de clima favorável para o lançamento.

Além da função da missão como um campo de testes das tecnologias necessárias para uma viagem a Marte, muito mais longa, a Nasa também espera impulsionar empresas que desejam montar um negócio estável de levar instrumentos científicos e outras cargas à Lua, e inspirar estudantes a entrar nas áreas de ciências e engenharia.

"Nós exploramos porque faz parte da nossa natureza", disse Nelson.

Não é apenas a Nasa que quer ir à Lua hoje em dia. Nos últimos anos, a China conseguiu pousar com sucesso três missões robóticas no satélite. A Índia e uma organização sem fins lucrativos israelense também enviaram unidades de pouso em 2019, embora ambas tenham caído. Um orbitador sul-coreano está a caminho.

O foguete Space Launch System (SLS) da missão Artemis I
O foguete Space Launch System (SLS) da missão Artemis I - Steve Nesius/Reuters

Nelson disse que as crescentes ambições espaciais da China, que incluem uma base lunar na década de 2030, também motivaram a Artemis. "Temos que nos preocupar que eles digam: 'Esta é nossa zona exclusiva. Você fica de fora'", disse ele. "Sim, essa é uma das coisas que avaliamos."

Para os cientistas, o foco renovado na Lua promete uma abundância de novos dados nos próximos anos.

As rochas coletadas pelos astronautas durante as missões Apollo modificaram a compreensão dos cientistas planetários sobre o sistema solar. A análise de isótopos radioativos forneceu datações precisas de várias regiões da superfície lunar. As rochas também revelaram uma surpreendente história da origem do satélite: parece ter se formado a partir de detritos ejetados no espaço quando um objeto do tamanho de Marte colidiu com a Terra há 4,5 bilhões de anos.

Mas durante duas décadas após o último pouso, da Apollo 17, a Nasa desviou sua atenção da Lua, que para muitos parecia ser um mundo desolado, seco e sem ar. Ela mudou seu foco para outros lugares do sistema solar, como Marte e a multidão de luas de Júpiter e Saturno.

O interesse científico pela Lua nunca desapareceu completamente, entretanto. De fato, sua natureza desolada significa que rochas que endureceram bilhões de anos atrás permanecem em condições quase intocadas.

"Como cientistas, entendemos que a Lua é, em certo sentido, uma pedra da Roseta", disse David A. Kring, do Instituto Lunar e Planetário, perto de Houston (Texas). "É o melhor lugar do sistema solar para estudar a origem e evolução dos planetas."

Os cientistas também descobriram que a Lua não é tão seca quanto eles pensavam.

A água, congelada no fundo de crateras eternamente escuras nos polos, é um recurso valioso. Ela pode fornecer água potável para futuros astronautas que visitam a Lua, e a água pode ser decomposta em hidrogênio e oxigênio.

O oxigênio poderia fornecer ar respirável; oxigênio e hidrogênio poderiam ser usados como propulsores de foguetes. Assim, a Lua, ou uma estação de reabastecimento em órbita ao seu redor, poderia servir de escala para as espaçonaves reabastecerem seus tanques antes de seguirem pelo sistema solar.

Os gelos, se forem acumulações antigas de vários bilhões de anos, poderiam até fornecer um livro de história científica do sistema solar.

O crescente conhecimento dos gelos gerou um interesse renovado pela Lua. No início dos anos 2000, Anthony Colaprete, cientista planetário do Centro de Pesquisa Ames da Nasa em Mountain View, na Califórnia, disse que pensava na Lua "só de vez em quando".

Então a Nasa fez uma licitação para propostas de uma espaçonave que poderia acompanhar a próxima missão do Orbitador de Reconhecimento Lunar. Colaprete, que na época estava envolvido principalmente com modelos climáticos de Marte, propôs o Satélite de Observação e Detecção de Crateras Lunares (LCROSS na sigla em inglês), que ele achava que poderia confirmar indícios de gelo de água que tinham sido detectados por algumas espaçonaves lunares na década de 1990.

O LCROSS dirigiria o estágio superior do foguete de lançamento para dentro de uma das crateras polares a 9.000 km/h, e então uma pequena espaçonave de seguimento mediria o material levantado pelo impacto.

"Era um método de amostragem bastante cru", disse Colaprete.

Mas a Nasa gostou da ideia e a escolheu. Em junho de 2009, foi lançado o foguete que transportava o Orbitador de Reconhecimento Lunar e o LCROSS. Em outubro, o LCROSS fez seu mergulho mortal na cratera Cabeus, perto do polo sul da Lua.

Um mês depois, Colaprete teve sua resposta: havia água no fundo de Cabeus, e bastante.

Instrumentos do orbitador indiano Chandrayaan-1 também encontraram sinais inconfundíveis de água, e cientistas usando técnicas de ponta encontraram água presa nos minerais das antigas rochas das missões Apollo 15 e 17.

Barbara Cohen, cientista planetária do Centro de Voo Espacial Goddard da Nasa em Greenbelt, em Maryland, disse que os cientistas ainda têm muitas perguntas sem resposta.

Existem regiões frias com gelo, mas também regiões frias que parecem não ter gelo. Alguns lugares são gelados na superfície e outros têm gelo abaixo da superfície, mas as duas regiões nem sempre se sobrepõem. "Não entendemos totalmente quando ou como essa água chegou lá", disse ela.

Isso significa que os cientistas também não sabem quanta água existe ou se será fácil extraí-la da rocha e do solo ao redor.

Colaprete ainda está trabalhando na Lua também. "A comunidade cresceu nas últimas duas décadas", disse ele. Agora ele é o principal investigador do veículo robótico Volatiles Investigating Polar Exploration Rover, que deverá pousar perto do polo sul lunar no final de 2024 e se aventurar em algumas das crateras escuras para ver de perto, incluindo a perfuração de um metro no solo.

"Um dos nossos principais objetivos é entender a origem e as formas da água na Lua", disse Colaprete.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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