Galáxias observadas pelo telescópio James Webb reescrevem entendimento do universo primitivo

Sistemas parecem tão maduros quanto a nossa Via Láctea, segundo astrônomos

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Will Dunham Juliette Collen
AFP e Reuters

Observações feitas pelo telescópio espacial James Webb, da Nasa, estão mudando a compreensão do universo primitivo, indicando a presença de galáxias grandes e maduras, mas notavelmente compactas, repletas de estrelas, muito mais cedo do que os cientistas consideravam ser possível.

Astrônomos disseram que os dados obtidos pelo telescópio revelam o que parecem ser seis grandes galáxias tão maduras quanto a nossa Via Láctea existindo cerca de 540 a 770 milhões de anos após a explosão do Big Bang, que deu início ao universo há 13,8 bilhões de anos. O universo tinha aproximadamente 3% de sua idade atual na época.

Essas galáxias, uma das quais parece ter uma massa rivalizando com a nossa Via Láctea, mas 30 vezes mais densamente compacta, parecem diferir de maneiras fundamentais daquelas que povoam o universo atualmente.

As seis grandes galáxias tão maduras quanto a nossa Via Láctea captadas pelo telescópio James Webb - Nasa, ESA, CSA e Universidade de Tecnologia de Swinburne/Reuters

"Oh, elas são radicalmente diferentes, criaturas verdadeiramente bizarras", disse o astrofísico Ivo Labbé da Universidade de Tecnologia de Swinburne na Austrália, principal autor do estudo publicado na revista Nature.

"Se a Via Láctea fosse um adulto de tamanho regular e médio, digamos, cerca de 1,75 metro de altura e 70 kg de peso, essas galáxias seriam bebês de um ano de idade pesando o mesmo, mas com menos de sete centímetros de altura. O universo primitivo é um show de horrores."

Os achados foram baseados no primeiro conjunto de dados divulgado pela Nasa em julho do ano passado a partir do Webb, cujo lançamento ocorreu em 2021.

O telescópio, que está em operação desde julho de 2022, pôde explorar essa região desconhecida graças a seu instrumento NIRCam e sua potente visão no infravermelho, que tem um comprimento de onda invisível para o olho humano e cuja observação possibilita ir muito longe no passado.

Segundo a interpretação das novas imagens, as seis galáxias —chamadas de candidatas neste estágio, pois a descoberta ainda terá que ser confirmada por medidas de espectroscopia— contêm muito mais estrelas do que era esperado. Uma delas teria até 100 bilhões de estrelas.

"É mais ou menos do tamanho da Via Láctea, o que é muito impressionante", disse Labbé.

A Via Láctea levou 13,8 bilhões de anos para formar essa quantidade de estrelas, enquanto a jovem galáxia levou apenas 700 milhões de anos, "ou seja, 20 vezes mais rápido", segundo ele.

Galáxias distantes com esse tamanho não têm lugar no modelo cosmológico atual, que busca compreender como o Universo se estruturou.

"A teoria diz que, nessas idades tão antigas, as galáxias eram todas pequenas e cresciam muito lentamente. Acreditava-se que fossem de 10 a 100 vezes menores em quantidade de estrelas", segundo o astrofísico.

Modelo em xeque

Encontrar galáxias tão grandes "é algo que realmente destoa", afirma Labbé.

E qual seria o motivo? Uma possível suspeita é a misteriosa matéria escura, que é invisível e compõe uma quantidade considerável do Universo. Embora os cientistas não possam detectá-la, eles conhecem muito bem o seu comportamento e sabem que ela desempenha um papel-chave na formação das galáxias.

"A matéria escura deve se aglomerar para formar um halo que atrai para si o gás que formará as estrelas", segundo Labbé. Portanto, esse processo de "aglomeração" deveria levar muito mais tempo.

Tudo indica então que "as coisas se aceleraram particularmente" nesse Universo primordial, que teria sido "mais eficiente do que se pensava" para formar estrelas, comenta David Elbaz, astrofísico da Comissão de Energia Atômica e Energias Alternativas (CEA, na sigla em francês) da França, que não participou do estudo.

Isso poderia ser explicado pelo processo de expansão do Universo, que estaria se expandindo mais rápido do que pensávamos, afirma o cientista, que participa do programa de observação do telescópio desenvolvido pela Nasa.

O tema movimenta o debate entre os cosmólogos e essa descoberta "é muito excitante, pois constitui mais um indício de que o modelo está em xeque", analisa David Elbaz.

O telescópio espacial europeu Euclid, que deverá ser colocado em órbita em meados deste ano para tentar desvendar os segredos da matéria escura, poderia ajudar a esclarecer o mistério.

Labbé cita a teoria do cisne negro, segundo a qual um acontecimento imprevisível e improvável de ser concretizado tem um impacto considerável. "Se apenas uma dessas seis galáxias candidatas for confirmada, será preciso rever a teoria."

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