Medicamentos para prolongar a vida de cachorros estão cada vez mais perto da realidade

Dados de uma das drogas já indicam expectativa razoável de eficácia, segundo agência dos EUA

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Emily Anthes
The New York Times

A vida de um cachorro de estimação tem uma trajetória previsível. Com o tempo, o filhote de orelhas caídas que adormece em sua tigela de comida se tornará um adolescente de pernas longas com um interesse insaciável por esquilos —antes de finalmente se estabelecer na vida adulta como um ser canino de hábitos, com um local cuidadosamente escolhido para dormir e um ritual de cumprimento bem ensaiado.

Mas, à medida que os anos passam, suas articulações ficarão rígidas e seu focinho, grisalho. E, um dia, que inevitavelmente chegará cedo demais, seu rabo abanando finalmente se acalmará.

"Quando você adota um cachorro, está adotando uma futura desilusão", disse Emilie Adams, uma nova-iorquina dona de três rhodesian ridgebacks. "Vale a pena ao longo do tempo porque você recebe tanto amor... Mas a vida deles é mais curta que a nossa."

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Dobby, um pastor-alemão de 12 anos, em um parque em North Bend, em Washington (EUA) - Grant Hindsley/The New York Times

Nos últimos anos, cientistas têm buscado medicamentos que possam evitar essa dor no coração, prolongando a vida de nossos companheiros caninos.

Nesta terça-feira (28), a empresa de biotecnologia Loyal anunciou que deu mais um passo para oferecer um desses medicamentos. "Os dados fornecidos são suficientes para mostrar que há uma expectativa razoável de eficácia", afirmou um representante da FDA (agência que regulamenta e fiscaliza alimentos e remédios nos EUA) à empresa em uma carta recente. (A Loyal forneceu uma cópia da carta ao jornal The New York Times).

Isso significa que o medicamento, que a Loyal se recusou a identificar por questões de propriedade, atendeu a um dos requisitos para "aprovação condicional ampliada", um tipo de autorização concedida a medicamentos veterinários voltados a necessidades de saúde ainda não atendidas e que exigem ensaios clínicos difíceis.

O medicamento não está disponível para os donos de animais de estimação, e a FDA ainda precisa revisar os dados de segurança e fabricação da empresa.

A aprovação condicional, que a Loyal espera receber em 2026, permitirá que a empresa passe a comercializá-lo mesmo antes da conclusão de um grande ensaio clínico.

"Vamos buscar pelo menos um ano de extensão da vida saudável", disse Celine Halioua, fundadora e CEO da Loyal.

Se o medicamento realmente cumprirá essa promessa, não se sabe. Embora um pequeno estudo sugira que o LOY-001 possa atenuar as mudanças metabólicas associadas ao envelhecimento, a Loyal ainda não demonstrou que ele prolonga a vida dos cães.

Mas a carta, que veio após anos de discussão entre Loyal e FDA, sugere que a agência está aberta a medicamentos para longevidade canina, afirmou Halioua.

Mais drogas do dia gênero estão em desenvolvimento. Uma equipe de pesquisadores está conduzindo um ensaio clínico canino de rapamicina, que mostrou prolongar a vida de camundongos em laboratório. E própria loyal está recrutando cães para um ensaio clínico de outro medicamento, o LOY-002.

Esses casos sinalizam tanto o ritmo acelerado da ciência quanto a seriedade com que pesquisadores e reguladores estão tratando de um campo que antes parecia ficção científica.

Eles também levantam questões sobre o que pode significar ter sucesso, disse Daniel Promislow, um biogerontologista da Universidade de Washington e codiretor do Dog Aging Project (projeto de envelhecimento de cães), que está conduzindo o ensaio clínico de rapamicina.

"E se funcionar?" ele disse. "Quais são as implicações?"

Fonte da juventude

Envelhecer pode ser inevitável, mas não é algo inflexível. Cientistas já criaram vermes, moscas e ratos com vida mais longa ao ajustar genes relacionados ao envelhecimento.

Essas descobertas levantaram a possibilidade tentadora de que cientistas possam encontrar medicamentos que tenham os mesmos efeitos de prolongamento da vida em pessoas. Isso continua sendo uma área ativa de pesquisa, mas a longevidade canina recentemente começou a atrair mais atenção, em parte porque os cães são bons modelos para o envelhecimento humano e em parte porque muitos donos de animais de estimação adorariam ter mais tempo com eles.

Renzo, um shih-tzu de 11 anos, faz parte de um dos estudos da Loyal, empresa que busca desenvolver medicamentos para prolongar a vida de cachorros - Loyal via The New York Times

As drogas em investigação atuam de maneiras diferentes. A rapamicina, que também tem despertado intenso interesse como uma possível droga de longevidade para humanos, inibe uma proteína conhecida como mTOR, que regula o crescimento celular e o metabolismo.

Neste ano, uma equipe de cientistas, incluindo Promislow e alguns de seus colegas no Dog Aging Project, publicou uma análise de cães que haviam sido aleatoriamente escolhidos para receber uma dose baixa de rapamicina ou um placebo por seis meses. Embora o tamanho da amostra fosse pequeno, 27% dos donos de cães cujos animais receberam a droga relataram melhorias na saúde ou comportamento, incluindo aumento na atividade ou brincadeira, em comparação com 8% dos donos cujos cães receberam um placebo.

LOY-001, um implante de liberação prolongada destinado a cães grandes e adultos, é projetado para modular um composto relacionado ao crescimento diferente: o fator de crescimento insulina-1, ou IGF-1. A via do IGF-1 tem sido associada ao envelhecimento e à longevidade em várias espécies; em cães, sabe-se que desempenha um papel fundamental na determinação do tamanho corporal. Embora a ideia ainda não tenha sido comprovada, alguns cientistas levantam a hipótese de que níveis elevados de IGF-1 impulsionam tanto o crescimento rápido quanto o envelhecimento acelerado em cães grandes, que geralmente têm uma vida útil mais curta do que os pequenos.

A própria pesquisa da Loyal, que ainda não foi publicada, sugere que o LOY-001 reduz os níveis de IGF-1 em cães e que pode conter aumentos relacionados ao envelhecimento na insulina; um estudo observacional de quase 500 cães também sugeriu que níveis mais baixos de insulina estavam correlacionados com redução da fragilidade e uma maior qualidade de vida.

"É uma abordagem bastante empolgante", disse Colin Selman, um biogerontologista do envelhecimento da Universidade de Glasgow, que não estava envolvido na pesquisa e não revisou os dados da empresa.

Mas provar que um medicamento pode realmente prolongar a vida dos cães exigirá grandes ensaios clínicos demorados. Embora alguns estejam em andamento, levará pelo menos mais alguns anos antes que os resultados sejam conhecidos. E, independentemente do medicamento, os pesquisadores precisarão demonstrar que ele adiciona anos bons e saudáveis à vida de um cão, em vez de apenas prolongar seu declínio, disseram os especialistas.

Dilemas Caninos

Ainda é cedo para dizer quanto custarão os medicamentos de longevidade, mas Halioua estima que o LOY-001 custaria "dezenas de dólares por mês".

Para alguns donos, o custo não será um impedimento, afirmou Karen Cornelius, de Illinois, que tem mastins e outras raças "gigantes" há décadas. Muitos morreram por volta dos nove anos, disse Cornelius, que administra vários grupos no Facebook para donos de cães gigantes.

"Era apenas uma discussão em um dos meus fóruns ontem sobre quão curta era a vida deles e como as pessoas dariam qualquer coisa para poder prolongá-la", disse ela.

Alguns especialistas estão preocupados que esse entusiasmo possa ser explorado, sobretudo se os medicamentos forem anunciados como fontes de juventude canina, enquanto questões de segurança e eficácia a longo prazo permanecem sem solução. Eles observaram que os próprios cães não podem dar consentimento.

"Será que é do melhor interesse deles viver um pouco mais quando há algum risco em tomar esses medicamentos?", disse Rebecca Walker, filósofa e bioeticista da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, que afirmou que não daria um medicamento de longevidade ao seu golden retriever. "Ou será que é realmente do melhor interesse dos donos, que são muito apegados a eles?"

O pior efeito colateral do LOY-001 tem sido desconforto gastrointestinal leve e temporário, disse Halioua, embora ela tenha reconhecido que o critério de segurança seria "extremamente, extremamente, extremamente alto".

Medicamentos de longevidade são destinados a cães saudáveis, o que muda o cálculo de risco-benefício. "É uma coisa se um cão está à beira da morte e você está dando a ele um tratamento de última hora", disse Bev Klingensmith, criadora de dogue alemão em Iowa, que também tem um dogue alemão e um golden retriever. "Dar um medicamento novo ao meu cão jovem e saudável pareceria um pouco assustador."

Mesmo medicamentos que cumprem todas as suas promessas levantarão questões éticas. "Se os animais estão vivendo mais, temos os recursos e o compromisso para proporcionar vidas que valham a pena?" disse Anne Quain, veterinária e especialista em ética veterinária na Universidade de Sydney, em um email. "E se virmos mais cães vivendo mais que seus donos?"

Reformar as práticas de reprodução que contribuíram para problemas de saúde que encurtam a vida de muitos cães e expandir o acesso aos cuidados veterinários básicos podem ser uma maneira melhor de melhorar a vida dos cães, acrescentou ela. "Podemos salvar muitos 'anos de cão' garantindo que o maior número possível de cães tenha acesso a esses cuidados."

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