Descrição de chapéu The New York Times

Quem beijou primeiro na história? A arqueologia tem uma resposta

Pesquisadores sugerem que ato já era difundo no Oriente Médio pelo menos desde o fim do terceiro milênio a.C.

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Franz Lidz
The New York Times

Esta é uma história de amor. Durante a primavera de 2008, muito antes de produzirem evidências do primeiro beijo registrado da humanidade, Sophie Lund Rasmussen e Troels Pank Arboll se beijaram pela primeira vez ao se despedirem em uma noite. Eles se conheceram uma semana antes em um pub perto da Universidade de Copenhague, onde estudavam.

"Eu tinha perguntado ao meu primo se ele conhecia algum cara solteiro legal com cabelos longos e barba comprida", lembra Rasmussen. "E ele disse: 'É claro, vou te apresentar um'."

Arboll, por sua vez, estava procurando alguém que compartilhasse seu interesse em assiriologia, que envolve o estudo das línguas mesopotâmicas.

"Poucas pessoas sabem o que um assiriólogo realmente faz", Arboll disse a ela.

Peça de argila mantida no British Museum retrata casal na cama por volta de 1.800 anos a.C - British Museum/NYT

"Eu sei", respondeu Rasmussen, que frequentara algumas das mesmas aulas que ele.

"Quando ouvi isso, eu sabia que ela era a pessoa certa", afirmou Arboll, hoje professor de assiriologia na universidade.

Três anos depois, casaram-se.

Rasmussen hoje é ecologista na unidade de pesquisa de conservação da vida selvagem da Universidade de Oxford e na Universidade de Aalborg, na Dinamarca.

Em 2022, durante um jantar, o casal discutiu um novo estudo genético que relacionava variantes modernas do herpes ao beijo boca a boca na Idade do Bronze, de 3300 a.C. a 1200 a.C.

Nos materiais suplementares do artigo, uma breve história do beijo apontou o sul da Ásia como o local de origem e rastreou o primeiro beijo com registro literário até 1500 a.C., quando manuscritos em sânscrito védico estavam sendo transcritos a partir da história oral.

O pesquisador, da Universidade de Cambridge, sugeriu que o costume —um precursor de beijos nos lábios que envolvia esfregar e pressionar os narizes juntos— evoluiu para beijos intensos. Ela observou que por volta de 300 a.C. —quando o manual indiano de sexo, o Kama Sutra, foi publicado— o beijo se espalhou pelo Mediterrâneo com o retorno das tropas de Alexandre, o Grande, do norte da Índia.

Mas o casal acreditava que esse não era o início da história do beijo. "Eu disse a Sophie que conhecia relatos ainda mais antigos escritos nas línguas suméria e acádia", disse Arboll, cuja especialidade são relatos antigos de diagnósticos médicos, prescrições e rituais de cura.

"Então, depois do jantar, verificamos novamente", disse Rasmussen.

Eles consultaram textos cuneiformes em tabuletas de argila da Mesopotâmia (atual Iraque e Síria) e do Egito em busca de exemplos claros de beijos íntimos. A investigação resultou em um comentário recentemente publicado na revista Science que desfez a hipótese de que pessoas de uma região específica foram as primeiras a se beijar.

O casal de pesquisadores dinamarqueses sustentou que, desde pelo menos o final do terceiro milênio a.C., o beijo era uma parte difundida e bem estabelecida do romance no Oriente Médio. "O beijo não era um costume que surgiu de repente em um único local", disse Arboll. "Em vez disso, parece ter sido comum em diversas culturas."

Arboll e Rasmussen propuseram que o relato mais antigo de beijo foi gravado no Cilindro de Barton, uma tabuleta de argila que remonta a cerca de 2400 a.C. O objeto foi descoberto na antiga cidade suméria de Nippur em 1899 e recebeu o nome de George Barton, professor de línguas semíticas no Bryn Mawr College, que o traduziu 19 anos depois. Ele está abrigado no Museu de Arqueologia e Antropologia da Universidade da Pensilvânia, onde, de 1922 a 1931, o docente ensinou línguas semíticas e história da religião.

A narrativa do artefato envolve o mito sumério da criação e problemas com o fornecimento de alimentos em Nippur, a capital religiosa original da Babilônia e o local de adoração de Enlil. Na segunda coluna de texto, uma divindade masculina, possivelmente Enlil, tem relações sexuais com a deusa-mãe Ninhursag, irmã de Enlil, e então a beija. Em meio a essa brincadeira, a divindade masculina planta a semente de "sete pares de deuses" em seu ventre.

Gonzalo Rubio, assiriólogo da Universidade Estadual da Pensilvânia, disse que a parte mais convincente da história é a sequência de eventos. "Nas representações do ato de beijar na literatura suméria, os sujeitos têm relações sexuais primeiro e só depois se beijam", disse ele. "É uma espécie de pós-jogo, em vez de preliminares."

Um beijo sumério era apenas um beijo? Arboll disse que nos primeiros trechos, o beijo era descrito em relação a atos eróticos, com os lábios como o local. Em acadiano, uma língua semítica relacionada ao hebraico e ao árabe de hoje, ele e Rasmussen descobriram que as referências ao beijo se encaixavam em duas categorias: amigável-paternal e romântico-sexual.

O primeiro é uma demonstração de afeto familiar, respeito ou submissão, como quando um súdito real beija os pés de um governante. "O beijo sexual-romântico ocorre em relação a um ato sexual ou em relação ao amor", disse Arboll. Ao contrário da variedade amigável-paternal, não é culturalmente universal.

"O beijo nos lábios foi observado em chimpanzés e bonobos, nossos parentes vivos mais próximos", acrescentou Rasmussen. Enquanto o beijo platônico de chimpanzé determina a compatibilidade, os bonobos se acariciam para excitação sexual —seu contato erótico varia desde sexo oral até torções intensas de língua. "As práticas de beijo desses primatas sugerem algo fundamental que remonta à história humana", disse Rasmussen.

A pesquisadora disse acreditar que o beijo evoluiu como uma forma de avaliar possíveis parceiros através do cheiro deles.

"Tanto com humanos quanto com ouriços tudo se resume a encontrar o parceiro mais forte e saudável para produzir descendentes fortes e saudáveis", afirmou ela. "Então, inconscientemente, você avalia a adequação de uma pessoa por meio de sinais químicos, como mau hálito, que pode indicar dentes ruins, que podem indicar genes ruins."

Rasmussen se lembrou daquele primeiro beijo com Arboll, que tinha o aroma do chá de hibisco que ela acabara de preparar para ele. O que é um beijo? Em sua memória, ecoava uma linha do poeta Robert Herrick: "O cimento seguro, doce, cola e cal do amor".

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