Cães, ratos e abelhas podem detectar doenças como câncer e Covid em humanos

Em experimentos, espécies também demonstraram a capacidade de revelar problemas em amostras biológicas

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Jacqueline Boyd

Professora de ciência animal na Universidade Nottingham Trent

The Conversation

Quando se trata de diagnosticar com precisão uma doença, você imediatamente pode pensar que precisa de máquinas e equipamentos caros e de alta tecnologia, aptos a examinar profundamente o que está acontecendo no corpo. Sim, esses aparelhos são incríveis, mas não são os únicos instrumentos capazes de detectar males na saúde. Na verdade, você pode até ter em casa com um desses poderosos agentes detectores de doenças: os animais.

Há numerosos casos de pessoas que ficaram sabendo que tinham uma enfermidade por meio de seus pets. Os estudos incluem cães que lambem, cheiram e até tentam mastigar manchas na pele de seus donos. Em um dos exemplos, essas manchas foram, mais tarde, diagnosticadas como melanoma maligno.

Na verdade, muitas espécies —desde o verme microscópico C. elegans até formigas, camundongos e cães— demonstraram a capacidade de revelar mazelas físicas em humanos e problemas em amostras biológicas durante experimentos.

Cachorro treinado para detectar coronavírus durante demonstração em Milton Keynes, na Inglaterra - Chris Jackson - 9.set.20/Reuters

As doenças descobertas são diversas: câncer, infecções do trato urinário, Covid-19 ou Clostridium difficile (bactéria que induz à colite e outras formações anormais no intestino grosso).

Muitos desses males são potencialmente graves, especialmente em pacientes vulneráveis e imunocomprometidos, portanto, a detecção precisa e precoce é essencial.

Aqui estão apenas alguns dos animais capazes de identificar doenças em humanos.

Cães

Os cães são, possivelmente, o exemplo mais conhecido de animal que pode farejar uma série de doenças, incluindo Parkinson, câncer de bexiga e malária. Convulsões epilépticas e baixo nível de açúcar no sangue em pacientes diabéticos também podem ser percebidos e apontados por cães especialmente treinados para emitir alerta médico.

Tudo indica que o impressionante sentido olfativo do cão é fundamental para a sua capacidade de diferenciar cheiros mesmo em concentrações incrivelmente baixas. De fato, acredita-se que o olfato dos cães seja mais de 10 mil vezes melhor do que o nosso. Eles podem até mesmo usar suas narinas independentemente uma da outra ao investigar novos cheiros.

Cachorro da entidade Medical Detection Dogs em Milton Keynes, Inglaterra - Matthew Stock - 22.out.18/Reuters

Os cães de biodetecção e de alerta médico são inicialmente treinados para associar odores específicos a uma recompensa positiva, como uma guloseima ou um brinquedo. Em seguida, eles são preparados para reconhecer mudanças de cheiro ou mudanças físicas e comportamentais em seu condutor e, assim, prever uma convulsão (ou outro evento de saúde).

Em geral, os cães de biodetecção ficam parados quando reconhecem um aroma peculiar, aguardando a recompensa. Os cães de alerta médico, em situações similares, costumam interagir como condutores; talvez dando-lhe uma pata ou cutucando-o para indicar que ele precisa tomar medidas rápidas para sua própria segurança.

Ratos

Os ratos também são ótimos em farejar odores característicos. O tipo gigante africano foi treinado para identificar o cheiro de explosivos em minas terrestres em Moçambique. Esses ratos também estão se mostrando parceiros valiosos na busca por diagnóstico médico, desempenhando um papel importante na detecção da tuberculose em amostras de escarro colhidas de casos suspeitos.

Eles são rápidos, levando apenas 20 minutos para analisar cem amostras de pacientes. Usam as habilidades de farejar para descobrir a assinatura química da tuberculose nas amostras.

O pagamento por um trabalho bem-feito pode ser um abacate ou uma banana. Os ratos treinados são uma opção valiosa quando o tempo e o dinheiro podem ser limitados nas instalações de diagnóstico e triagem. Eles têm uma taxa de sucesso espetacular, detectando com precisão casos positivos de tuberculose em 81% das vezes.

Abelhas

Até mesmo as abelhas podem identificar os sinais de determinadas enfermidades em amostras, incluindo câncer de pulmão, tuberculose e Covid-19.

As abelhas são extremamente sensíveis a odores de baixa concentração, o que as torna capazes de apontar alterações químicas de forma semelhante à de cães e ratos.

Pesquisadores conseguiram treinar as abelhas para o minucioso trabalho levando-as a estender a língua em busca de uma recompensa de açúcar após a tarefa. Com o treinamento, essa resposta torna-se consistente e altamente sensível a odores associados a estados de doença. Devido ao pequeno tamanho elas podem ser uma opção ainda mais eficiente e de baixo custo para a triagem rápida de amostras.

Sentidos superiores

Mas como os animais são capazes de identificar a presença de doenças específicas? A resposta tem a ver com a capacidade e experiência de muitos deles de perceber pequenas alterações no perfil químico de uma pessoa.

Muitas espécies (incluindo cães, ratos e abelhas) podem notar mudanças muito sutis em substâncias chamadas compostos orgânicos voláteis (VOCs, em inglês) liberadas pelo corpo em níveis muito baixos, mesmo quando saudável. De fato, a respiração humana exalada contém aproximadamente 3.500 VOCs diferentes. A composição e a concentração dos VOCs que o corpo libera mudam de acordo com a saúde da pessoa e serão diferentes se ela estiver combatendo uma infecção ou lidando com um problema de saúde.

Os benefícios dados por animais habilitados a prever enfermidades não são úteis apenas para os humanos. O verme C. elegans, por exemplo, pode usar seus sentidos olfativos superiores para apontar o câncer em amostras de cães e gatos.

Diferentes espécies de animais treinados para farejar patologias com precisão podem ser uma forma eficaz, não invasiva, rápida e econômica de rastrear determinadas condições de saúde e, de quebra, melhorar ainda mais as interações positivas entre pessoas e animais.

Devido às regulamentações, os animais usados para detecção de doenças são, atualmente, vistos apenas como ferramentas de triagem a serem usadas juntamente com técnicas de diagnóstico médico. Mas, se as estruturas regulatórias permitirem, eles poderão se tornar um componente essencial de diagnóstico, um dia.

De fato, os cães de detecção foram mais rápidos (e mais baratos) na triagem de amostras para Covid-19 do que os testes de rotina de PCR. Ao compreender as espantosas capacidades e agilidade dos animais, poderemos ajudar a melhorar ainda mais os testes de diagnóstico laboratorial. O trabalho pode ser conjunto.

Embora a exploração das especificidades de farejamento dos animais possa ser útil para nós, é importante lembrar que a saúde e o bem-estar dos bichos também devem ser priorizados. A ética desse trabalho deve sempre ser levada em conta juntamente com considerações sobre o custo, a segurança e a eficiência de qualquer programa de rastreamento de doenças que os envolva.

Este artigo foi publicado no The Conversation Brasil e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons. Clique aqui para ler a versão original

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