Alexandra Moraes - Ombudsman

Jornalista e quadrinista, é ombudsman da Folha. Já foi secretária-assistente de Redação, editora de Diversidade e editora-adjunta de Especiais e Ilustrada.

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Alexandra Moraes - Ombudsman
Descrição de chapéu Campeonato Brasileiro

Fartura olímpica evidencia carência no futebol

Cobertura do evento poliesportivo no jornal contrasta com acompanhamento cada vez mais frágil do Brasileiro

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A cobertura dos Jogos Olímpicos mobiliza sempre um grande aparato em sua mistura hiperbólica de esporte e entretenimento. Até aí tudo bem, tudo ótimo.

Na Folha, porém, a força dessa cobertura acaba por chamar a atenção para uma fraqueza em outra frente esportiva: a do futebol doméstico.

Nos menus que levam ao noticiário, as vinhetas de Esporte dão lugar às de Olimpíadas. Nos labirintos entre um menu e outro, até quinta-feira da última semana a página do Campeonato Brasileiro ostentava um resumo da tabela de 2023, embora a Folha tenha uma versão deste ano devidamente atualizada. Avisada, a Redação a ajustou.

Semana após semana, ano após ano, leitores do jornal, principalmente da versão impressa, reclamam da falta de informações cada vez mais básicas sobre o que se passa nos gramados brasileiros. Não se trata mais de avaliar se a cobertura é boa ou ruim, mas da existência de qualquer lembrança de uma cobertura.

3 jogadores, dois de uniforme preto e um de branco disputam a bola no canto do campo. A camisa branca tem uma interrogação.
Ilustração de Carvall para coluna da Ombudsman de 28 de julho de 2024 - Carvall /Folhapress

A opção, consciente, por essa redução não é exatamente nova. Nos últimos anos, o jornal deixou de fazer o acompanhamento extenso de todos os jogos por ter priorizado outras áreas (ou seja, o dinheiro que investiria em esporte foi para outros assuntos em que a Folha já mostrava desempenho mais robusto). Transmissões ao vivo dos jogos do dia a dia deixaram de acontecer, mas um texto ainda apresentava a disputa e outro relatava o que se passara em campo.

Em reduções mais recentes, a apresentação acabou e os jogos relatados foram resumidos aos clássicos. Hoje em dia, precisa ser um baita jogo para merecer essa atenção do jornal.

Num tempo mesmerizado pelas apostas esportivas, com a prevalência das "bets" nos uniformes dos clubes, nos estádios e nos anúncios dos sites, parece um contrassenso abrir mão do futebol.

Conteúdo relacionado a esporte (em geral, não só futebol) e apostas/"bets", somado à inexorável pornografia, são hoje os principais vetores de tráfego na internet.

Ainda há, pelo menos, as tabelas. Além daquela do Campeonato Brasileiro, a Folha tem uma do Paulista e outra da Libertadores. Mas a edição impressa pena para recebê-las e não tem dado os resultados dos jogos, e aí a coisa complica.

"Ontem (2/7) no caderno de esportes não saiu uma nota sequer sobre o clássico Palmeiras x Corinthians realizado na segunda (1º/7), jogo este que terminou antes das 22h. Pois bem, na edição de hoje (3/7), com a demissão do técnico alvinegro, além da matéria, tem uma chamada na capa. Será que um clássico que movimenta tanta gente não merece uma nota sequer?", perguntou no início do mês o leitor Leonardo Silva.
"Contrariamente, o Estadão divulga tudo, em mais de meia página", compara o leitor Wilson Gava sobre os resultados dos jogos. "Qual a razão disso? Deveria cancelar a assinatura da Folha?"

É compreensível que, num cenário de vacas mais magras, a Folha priorize informações exclusivas em detrimento de resultados que podem ser facilmente achados na internet. Mas os assinantes que insistem em ler o papel (e pagar por ele) dão peso grande ao jornal para se informar. O impresso tem o problema de frequentemente chegar "velho" ao leitor, mas publicar o placar nesse produto não o tornaria mais obsoleto, pelo contrário.

Nesta segunda (22), Gava voltou a escrever à ombudsman. "O Palmeiras jogou no sábado. Na edição do domingo e da segunda nada foi noticiado. Corinthians e São Paulo jogaram ontem à tarde e a edição de hoje não traz os resultados. Até quando vamos ter de tolerar esta situação?"

O Palmeiras jogou de novo na quarta, perdeu para o Fluminense, que estava na lanterna, e também nada apareceu na edição da Folha do dia seguinte. A situação da qual o leitor reclamava se repetia.

Não valia um quadradinho que fosse com os resultados da rodada, ainda mais num momento em que as Olimpíadas acabam por levar mais leitores a Esporte?

Alexandre Giesbrecht, que mantém um site sobre o São Paulo, diz que sente "falta de ler uma cobertura condensada dos outros times, que não exija a leitura de várias matérias que têm apenas dois ou três parágrafos diferentes".

Pode ser pedir demais nestes tempos, mas o jornal já conta com os insumos para oferecer essa cobertura em seu formato mínimo e automatizado —as tabelas de resultados.

Com os novos desdobramentos da inteligência artificial, as placas tectônicas da busca e da oferta de conteúdo na internet estão se movimentando, mas o interesse pelos gols e pelo dinheiro jogado nas "bets" dificilmente vai arrefecer.

Enquanto isso, o cada vez mais raro leitor que aposta no jornal impresso, o produto "premium" e mais caro da Folha, é estimulado pelo próprio veículo a largar o papel e "dar um Google" no que quer saber. É prova de resistência.

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