Ana Cristina Rosa

Jornalista especializada em comunicação pública e vice-presidente de gestão e parcerias da Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPública)

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Parece, mas não é

'Reverência' à negritude se aplica quando há prazo de validade definido e o assunto é diversão

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Carnaval é uma época do ano em que o Brasil parece ter orgulho de suas raízes africanas —apesar de a festividade ter origem europeia. Quem vê de fora até pensa que aqui há uma democracia racial e reinam a harmonia e o apreço pela cultura negra em toda a sua magnitude. Ao ritmo do samba, do axé e do frevo, o brasileiro se mistura.

Para tudo acabar na quarta-feira...

A festa mais popular do país, onde a criatividade se materializa numa espetacular manifestação cultural, é o momento em que o negro tem algum protagonismo. O desfile das escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro, considerado o maior espetáculo da Terra, é prova disso. A "paradinha" da bateria (invenção de Mestre André da Mocidade Independente), que mudou a forma de tocar samba, serve de exemplo.

Desfile do Afoxé Filhos da Coroa de Dadá no Sambódromo Anhembi - Mathilde Missioneiro/Folhapress

Mas a "reverência" à negritude se aplica quando há prazo de validade definido e o assunto é diversão, cenário em que está garantida a preservação do status quo. Com isso, se mantém a desvantagem histórica de pretos e pardos, que seguirão tocando suas vidas em pé de desigualdade em múltiplas dimensões. Inclusive no Carnaval, quando são avaliados por comissões julgadoras formadas majoritariamente por brancos.

Na prática, não deixa de ser mais uma usurpação. Em situações específicas, o racismo e o preconceito que marginalizam a cultura afro permitem a celebração de tradições e de personagens que habitualmente deprecia, desde que o protagonismo negro seja esvaziado.

Em Salvador, os cordeiros (quem mantém foliões pagantes separados dos demais) penaram para conseguir 20 reais de aumento na diária de 2024. E o tradicional bloco afro Araketu, de origem periférica, anunciou que não vai desfilar por falta de incentivo da prefeitura.

Enquanto a negritude for tema recreativo, o Brasil continuará mantendo um apartheid socioeconômico baseado na raça, a despeito do arcabouço legal em contrário. Mas é tempo de festa. E parece até que está tudo bem.

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