Becky S. Korich

Advogada, escritora e dramaturga, é autora de 'Caos e Amor'

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Descrição de chapéu Todas Beleza

Paolla Oliveira é vítima de 'belezofobia'

O corpo da mulher vive um BBB permanente: está sempre vigiado

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Margot Robbie foi criticada por ser "não ser bonita o suficiente" para interpretar Barbie. Recentemente, Paolla Oliveira foi chamada de gorda e Yasmin Brunet de velha. Só fico pensando o que serei eu nos meus 50+ (também no peso), com a minha aparência comum.

"Chuto uma árvore em Balneário Camboriú e cai 15 dessas", comentou um brasileiro em uma foto de Margot divulgada nas redes. "Eu me pergunto se sua aparência melhoraria com um pouco de maquiagem", "definitivamente mediana", observaram outros. Margot, linda, inteligente e rica (foi a atriz mais bem paga em 2023) não deve estar preocupada com isso.

Paolla Oliveira posa para fotos na Grande Rio em Duque de Caxias (RJ) - Paulo Tauil - 19.dez.2023/AgNews

Já a nossa Paolla, linda de morrer, depois de compartilhar um vídeo do ensaio da escola de samba Grande Rio, recebeu simpáticos comentários belezofóbicos do tipo "gorda", "fora de forma", "precisa fazer dieta para o carnaval". Até o seu braço foi criticado, mesmo com tantas outras partes no seu corpo para apreciar. "Braço de merendeira", escreveu um (ou uma) fiscal da beleza. Quisera eu que meus tchauzinhos, que mais se parecem com a gelatina da merenda saíssem de braços assim.

Yasmin Brunet foi outro monumento atacado recentemente por dois brothers muy machos que estão confinados com ela no BBB. O tal de Nizam decretou: "ela tem um rosto bonito, mas um corpo estranho". E Rodriguinho sentenciou: "ela já foi melhor" e que "tá mais velha e largou mão".

Não tenho intenção de participar do coro que demoniza Nizam e Rodriguinho, nem de criticar a aparência deles como muitas mulheres têm feito, isso significa entrar no mesmo jogo. Tampouco posso contradizê-los, porque concordo com eles, o corpo de Yasmin é mesmo incomum, ou "estranho" como preferiram, considerando o cenário de celulites e barrigas de corpos normais que não foram agraciados com a genética de Yasmin. Um corpo estranhamente belo.

Nizam e Rodriguinho não são vilões. Não são imprestáveis. Não são do mal. São pessoas comuns. É justamente esse o maior problema: a normalização (não só por homens, mas também por mulheres) da exigência do corpo feminino perfeito. Sim, ainda temos que falar sobre isso.

O corpo da mulher vive um BBB permanente: está sempre vigiado e fiscalizado, como fosse domínio público. A mulher que não atender aos estereótipos está sujeita a sofrer penalidades básicas, como distúrbios, obsessões, medo do próprio corpo e, é claro, dietas à base de rúcula. "A dieta é o sedativo político mais potente na história das mulheres", escreveu Naomi Wolf em 1991. A regra é não haver singularidade, mascarar a passagem do tempo, imobilizar a beleza (já imaginou como isso seria enfadonho?). O mandamento é obedecer às regras sociais do bom comportamento corporal, comme il faut, não nos atos, mas na forma.

O método é simples: engaiolar a beleza única e pessoal, e sufocá-la até ela que ela se renda aos padrões. Metaforicamente falando, é como aplicar uma dose alta de botox no próprio conceito de beleza, para que seus músculos fiquem paralisados, sem movimentos nem expressão. Mas o que será uma beleza estática, inerte e genérica? A ordem se inverteu, em vez de adequar a beleza ao nosso corpo, é o corpo que tem que se adequar às normas estéticas –muitas delas, aliás, de gosto duvidoso. Assim, somos condicionadas a apagar as nossas marcas, cicatrizes e "imperfeições" (aspas propositais), calar a expressão do nosso corpo para parecer mais do que ser.

A beleza perfeita é uma miragem, só existe à distância, só existe nos filtros, esses espelhos adulterados. A busca é eterna –porque o objeto da busca é irreal. Enquanto o relógio anda para frente, queremos uma aparência inversa; enquanto a gravidade empurra para baixo, fazemos de tudo para levantar o que caiu.

Tento deixar a manutenção da lataria em dia, é um passo para frente e dois para trás; um centímetro para cima, dois para baixo. Meu corpo nem sempre me obedece, quando perde gordura, escolhe as partes erradas, e me ludibria quando me faz acordar com uma barriga chapada para depois devolver a minha barriga original.

Mas podemos ficar tranquilos, com tantos filtros e edições, só seremos feios pessoalmente.

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