Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros

Nova alta de commodities pode servir apenas para pagar o custo de ter Bolsonaro como presidente

Lula não teve apenas sorte; fez o dever de casa no país desigual e gastou dinheiro com pobre

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A economia brasileira cresceu um pouco mais do que o esperado no primeiro trimestre (1,2%), em boa parte porque os produtos que o Brasil exporta subiram de preço. Isso aconteceu porque Estados Unidos e China se recuperam bem da pandemia e voltaram a comprar.

A última vez em que as commodities (minérios, produtos agrícolas, etc.) subiram bastante de preço foi durante o governo Lula. A coisa durou vários anos, o governo aproveitou a bonança para distribuir renda sem sacrificar os ricos ou o equilíbrio fiscal, 30 milhões de brasileiros saíram da miséria, pobres e negros chegaram à universidade, foi bacana.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, e Jair Bolsonaro - Adriano Machado - 18.mai-2021/Reuters

Ao que tudo indica, dessa vez durará bem menos. Há quem ache que um novo superciclo das commodities pode acontecer, mas a aposta mais segura é que a alta atual acabará quando a recuperação mundial tiver terminado em mais ou menos dois anos.

Aí você vai dizer: mas se está acontecendo a mesma coisa que aconteceu no governo Lula, por que eu não estou com tanto dinheiro no bolso quanto estava, digamos, em 2007?

O desemprego é o maior da história, a miséria é visível nos números e nas ruas. Como bem disse a economista Zeina Latif, a “sensação térmica” para a população ainda não é de crescimento do PIB.

Bom, em primeiro lugar, isso mostra que Lula não teve apenas sorte. Fez o dever de casa de presidente de país pobre e desigual: quando apareceu dinheiro para gastar, gastou com pobre. Se você não gosta do Lula, pode dizer que isso era óbvio, qualquer idiota faria. Mas se você realmente não gosta do Lula, provavelmente votou em um idiota que não está fazendo.

Para escândalo geral, Bolsonaro não renovou o auxílio emergencial no começo de 2021. Como mostrou estudo do Centro de Estudos de Macroeconomia e Desigualdade da USP (Nota de Política Econômica nº 7, de fevereiro de 2021), foi o auxílio que garantiu que a economia brasileira não tivesse uma queda muito maior no ano passado. Bolsonaro não renovou o auxílio em janeiro, teve que voltar com um auxílio menor feito às pressas, e já mandou pobre que quiser mais auxílio ir pedir empréstimo no banco.

E não comprou vacina. No manifesto “O país exige respeito”, assinado por vários dos maiores economistas brasileiros em março de 2021, a estimativa do custo do atraso na vacinação era de R$ 131,4 bilhões neste ano. Some a isso a projeção do que teríamos ganho com a continuidade do auxílio e veja o trabalho que as pobres commodities vão ter que fazer só para pagar o custo de ter Bolsonaro como presidente.

Enfim, ao que tudo indica, a nova alta de commodities pode nos gerar crescimento, e, pelo amor de Deus, tomara que gere, precisamos muito de crescimento.

Mas será surpreendente se nos entregar uma era de ouro como nos anos Lula, ao menos no cenário em que dure só dois anos. Nesse caso, passaremos o primeiro ano morrendo sem vacina e o segundo em crise institucional, tentando evitar um golpe de Estado quando Bolsonaro perder a eleição.

O cenário otimista é tudo isso, mas sem apagão.

O cenário pessimista é, além disso tudo, que a alta das commodities dure o suficiente para reeleger Bolsonaro, mas acabe pouco depois de ele tomar posse, deixando-nos de novo miseráveis, mas agora com um governante dez vezes mais golpista. É o cenário “Deus nos odeia”.

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