Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Deborah Bizarria

Show da Taylor Swift: economia comportamental explica polêmica com cambistas

Dificuldade para comprar ingressos deixa fãs revoltados

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Imagine que você seja fã de uma banda ou de uma estrela pop e esteja ansioso para assistir ao seu primeiro show no Brasil. Não podendo ir à bilheteria física, você se prepara para comprar o seu ingresso online. Mas quando chega a sua vez na fila virtual os ingressos estão esgotados. Você tenta procurar em outros sites, mas se depara com preços absurdos, que chegam a custar até cinco vezes o valor original.

Esse é o cenário que muitos fãs de Taylor Swift enfrentam ao tentar comprar os ingressos para os seus shows no Brasil. A comercialização dos bilhetes para os shows gerou polêmica e revolta entre os admiradores da cantora, que reclamam de problemas como longas filas online e presenciais, preços exorbitantes no mercado paralelo e até mesmo brigas que chegam às vias de fato.

A venda de ingressos para eventos culturais é um exemplo de mercado imperfeito devido à informação assimétrica, à oferta limitada desses bilhetes e ao tamanho da devoção dos fãs. Apesar disso, os produtores dos eventos geralmente não cobram o preço máximo que consumidores estariam dispostos a pagar. Na prática, por mais altos que sejam, esses preços poderiam estar ainda mais altos e mesmo assim o local do evento ficaria lotado. Essa decisão de não "exagerar" nos preços pode ocorrer por diversos motivos: para não haver o risco de não vender todos os lugares disponíveis, para não perder um fã fiel que pode comprar essa merchandise e, principalmente, para preservar a imagem do artista como uma pessoa justa.

Para além do show de Taylor, a noção de justiça de uma comunidade afeta diretamente a definição de preços e salários em diferentes mercados, como mostra um estudo de Daniel Kahneman, Jack L. Knetsch e Richard Thaler.

Os autores realizaram 11 pesquisas telefônicas com amostras aleatórias de adultos nos Estados Unidos e no Canadá. Os entrevistados foram apresentados a cenários hipotéticos envolvendo situações de mercado, como aumentos de preços, cortes de salários e mudanças de custos ou de demanda. Em cada cenário, os entrevistados foram questionados sobre o grau de aceitabilidade ou injustiça das ações das empresas, usando uma escala de 6 pontos, variando de -3 (muito injusto) a +3 (muito justo).

Os autores descobriram que os entrevistados seguem alguns princípios de justiça, como a aceitação de aumentos de preços quando os lucros estão ameaçados e a rejeição desses aumentos quando a demanda aumenta rapidamente. Esses padrões de justiça influenciam o comportamento das empresas e geram algumas anomalias de mercado, como a resistência e a demora em adequar os preços ao aumento de custos ou de demanda. A busca pelo comportamento justo é um instrumento das empresas para a maximização dos lucros a longo prazo, pois evita a reação hostil dos clientes ou dos trabalhadores que se sentem tratados injustamente.

Curiosamente, é exatamente a diferença entre o "preço justo" e o preço que os fãs estariam dispostos a pagar que cria o mercado paralelo de ingressos. Os cambistas se beneficiam da escassez, da alta procura e da impossibilidade de muitos fãs de irem à bilheteria presencial. Assim, podem ter um alto lucro se acertarem na previsão de alta demanda pelos ingressos. Se errarem, provavelmente irão vender ingressos na porta do evento a preços mais baixos do que compraram nos meios oficiais.

Como a origem do mercado paralelo são os preços relativamente baixos dos ingressos vendidos nos meios oficiais, a questão é desafiadora e não será resolvida por canetadas e leis. Um caminho possível para a solução está ligado a uma mudança de postura dos produtores, caso passem a julgar que a venda direta dos ingressos para os fãs seja um ativo importante para a marca dos artistas.

Nesse cenário, poderiam adotar algumas medidas, como limitar a quantidade de ingressos por pessoa, utilizar tecnologia que impede que sistemas inteligentes (robôs) façam as compras, exigir a identificação do comprador e do usuário do ingresso, implantar leitura biométrica na entrada, oferecer benefícios a membros de clubes de fidelidade e utilizar plataformas digitais que permitam a revenda de forma controlada. Vale salientar que a maioria dessas medidas encareceria os ingressos vendidos, mas possivelmente apaziguaria os fãs.

A situação vivenciada pelos fãs na tentativa de adquirir ingressos para os shows de Taylor Swift aqui no Brasil ilustra como muitos mercados fixam preços a partir de outros elementos de comportamento, para além da oferta e da demanda. O medo de produtores de eventos de desagradar os fãs, diante da perspectiva de considerarem os valores cobrados injustos, faz com que os ingressos sejam mais baratos do que poderiam ser e possibilita altos lucros no mercado paralelo.

Na prática, portanto, há um paradoxo: se os produtores não implementarem algumas medidas —e parte delas pode provocar aumento no preço dos ingressos—, os fãs com menos sorte que quiserem ir a shows de divas pop sempre terão que acabar desembolsando alguns milhares de reais.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.