Djamila Ribeiro

Mestre em filosofia política pela Unifesp e coordenadora da coleção de livros Feminismos Plurais.

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Descrição de chapéu Gal Costa

Milton Nascimento se despediu em show apoteótico no Mineirão

O gigante deixou os palcos, mas seguirá para sempre na música e nos nossos corações

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O dia 13 de novembro de 2022 foi um dos dias mais emblemáticos da história da música brasileira. A despedida dos palcos de um gênio. A última sessão de música. O abraço do país ao mais mineiro de todos os cariocas. O trem de partida do clube da esquina mais famoso do mundo.

Estou falando do show apoteótico de Milton Bituca Nascimento para um Mineirão com mais de 60 mil pessoas presentes e para milhões de pessoas que viram ao vivo e acompanharam emocionadas os clássicos de muitas gerações. Era gente, gente, gente, gente, gente!

Palco de muitas emoções, seria injusto dizer que o Mineirão ficou pequeno com o tanto de gente que lá estava, mas sim que aquele grandioso estádio ficou grande como nunca. Como disse o Samuel Rosa, que esteve no palco com Bituca para cantar "Trem Azul", "desculpem, Cruzeiro, Atlético, América, todos os grandes craques e artistas que por aqui passaram, mas ontem o Mineirão teve a noite mais gloriosa de sua história".

Ilustração de Milton Nascimento, abraçado com um violão, ele usa boina marrom, camisa azul escura, com desenhos de pássaros azuis e estrelas brancas estampados. Atrás de Milton estão ornamentos florais.
Ilustração de Aline Bispo para coluna de Djamila Ribeiro - Aline Bispo

Minhas queridas leitoras, meus queridos leitores, posso dizer que tive a honra e a imensa alegria de ser uma das tantas pessoas presentes nesse dia tão especial. Brinquei que era um dia tão especial que, daqui para frente, 13 de novembro deveria ser feriado em Minas, e, por que não, no Brasil todo. Seria o Dia de Bituca! Um dia para nos edificarmos, revisitarmos nossos sonhos e tomarmos uma boa dose de coragem para viver a vida.

Junto com as pessoas ali, um frio percorreu toda minha espinha e me arrepiei quando "Ponta de Areia" abriu o espetáculo esperado. "Ponta de Areia, ponto final"... E lá estava ele como uma divindade, sentado à frente de sua banda que o acompanhou com o pé na estrada nos últimos anos. A banda comandada pelo maestro e guitarrista Wilson Lopes foi ao palco com Lincoln Cheib (bateria), Ademir Fox (piano), Widor Santiago (metais), Zé Ibarra (vocal e violão), Ronaldo Silva (percussão), Alexandre Ito Primo (baixo acústico) e Fred Heliodoro (vocal e baixo elétrico). Além de toda uma equipe atrás dos palcos.

As pessoas estavam eufóricas, gritavam "Bituca, te amo!". "Eu também amo vocês", respondeu Milton Nascimento. Sua timidez do tamanho de sua grandeza acolheu o coração do público, que chorou junto com ele, quando aos prantos dedicou aquele momento único à sua querida amiga de tantos bailes da vida, a icônica Gal Costa. A saudade apertou e a beleza daquela dedicatória está eternizada.

Para quem ama a música popular brasileira, os trens na estação são os de despedidas. Resta-nos apreciar e agradecer ao que esses gigantes fizeram, num misto de nostalgia e gratidão. Uma geração de gênios que conviveram nos rádios com a gente nos almoços de domingo, em noites de solidão, em momentos que mais precisávamos de fé na vida. Geração esta que Bituca e Gal representam tão bem.

Esses sentimentos se misturaram com a constatação de que aquilo que víamos naquele momento era único, formando um sentimento enigmático. Um sentimento de que estávamos ouvindo nos palcos a "Canção da América" pela última vez. Que ouvíamos "Travessia" nos palcos pela última vez. Era uma mistura de nostalgia, gratidão, euforia, emoção, alegria, tristeza, tudo junto. Penso que não há substantivo que dê nome a ele, pelo menos não consegui encontrar um. São essas coisas que só Milton Nascimento produz na gente.

Embalados nessa misteriosa sensação, nós —digo eu e as 60 mil pessoas que lá estavam— aproveitamos para irmos à loucura quando o Clube da Esquina subiu ao palco no que pode ter sido a última vez. Ao lado de Bituca, os parceiros Lô Borges, Wagner Tiso, Beto Guedes, Toninho Horta e Nelson Angelo presentearam a multidão com os sucessos do maior álbum de todos os tempos.

Ficaram marcadas a homenagem a Fernando Brant, que morreu em 2015 ("Onde quer que você esteja, eu te amo!", disse Bituca); a Mercedes Sosa, a voz do Terceiro Mundo, a quem foi dedicada a música "Volver a los 17", e a Márcio Borges, a quem Bituca deu um abraço carinhoso no final do show. Que noite!

Sob longos aplausos e enxurradas de palavras de amor, Milton se despediu do palco emocionado e abraçado em seu filho, Augusto Nascimento, seu apoio e empresário responsável, por organizar a turnê mais significativa dos últimos tempos na música brasileira.

Fogos de artifício iluminaram o céu, lágrimas correram e as cortinas se fecharam. E o gigante se despediu dos palcos, mas seguirá para sempre na música e nos nossos corações. Obrigada, Bituca!

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