Elio Gaspari

Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

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Bolsonaro passou pelo JN

O candidato aprendeu a ouvir perguntas de jornalistas

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A grande notícia saída da entrevista de Jair Bolsonaro a Renata Vasconcellos e William Bonner é que ele aguentou os 40 minutos de perguntas. Por muito menos ele já insultou jornalistas, mandou que se procurassem vacinas "na casa da tua mãe" e abandonou uma entrevista com André Marinho que lhe perguntava se "rachadinha" era crime. (Em 2002 Lula abandonou a mesa de almoço da Folha de S.Paulo diante de perguntas de Otavio Frias Filho).

Bolsonaro deveria ter aceitado a sugestão de submeter-se a um treinamento com profissionais. Preferiu treinar com ministros. Disso resultou um candidato defensivo. Parecia um boxeador querendo apenas ficar de pé até o fim do certame. Faltou-lhe qualquer vestígio de senso de humor.

Presidente Jair Bolsonaro em entrevista ao Jornal Nacional - Reprodução/TV Globo

Bolsonaro saiu da armadilha que ele mesmo criou ao hostilizar o Supremo Tribunal Federal, com a frase mágica da "página virada". Contudo, o livro de Alexandre de Moraes na presidência do Tribunal Superior Eleitoral tem mais páginas.

Não conseguiu explicar o mau desempenho de seus ministros da Educação. (O segundo da série, Abraham Weintraub, endossou o ataque de Wilker Leão que chamou-o de "tchuchuca do centrão": "Verdades são difíceis de engolir"). Bolsonaro entrou numa realidade paralela quando disse que em 2018 "não tinha centrão". Tinha desde o século passado e continuará a existir no mandato do próximo presidente, sempre o apoiando.

Bolsonaro faz uma má aposta quando acredita que poderá atravessar a campanha repetindo o bordão de "fizemos a nossa parte" em relação à pandemia. Disse-a quatro vezes durante a entrevista. Os mortos passaram de 680 mil e, pelo que se viu, ele continua acreditando no "tratamento precoce".

Bolsonaro acha que fez a sua parte na pandemia, a economia vai bem, que o Brasil é um exemplo no respeito ao meio ambiente e quer ser reeleito. Gastou tempo na defensiva disparando números e em nenhum momento deu uma razão para que se vote nele.

É verdade que se comprometeu a aceitar o resultado de outubro. Enfiou um "desde que" a apuração seja limpa e atribuiu às Forças Armadas um poder sancionador que não existe. Quem sanciona o resultado é a Justiça Eleitoral, em cuja comissão de transparência, o Ministério da Defesa tem assento.

Um eleitor que já decidiu votar nele pode ter sido revigorado. Seu desempenho foi prejudicado pela pandemia por uma guerra na Ucrânia. Juntar-se ao centrão foi uma necessidade da vida e o Auxílio Brasil beneficiará 20 milhões de pessoas.

Tudo bem, mas pelas contas da semana passada, o Datafolha mostrava que Lula tem 47% das preferências e ele, 32%. Como observou Mauro Paulino, veterano mastigador de pesquisas, a entrevista ao Jornal Nacional não deve ter somado votos em seu benefício.

Se Bolsonaro sentou-se diante dos entrevistadores com o objetivo de aguentar a entrevista, ele foi bem-sucedido. O "desde que" continuará a persegui-lo, sobretudo nos debates.

Falta a Bolsonaro a sensibilidade de Juscelino Kubitschek. Quando confrontado com um recuo ou com uma má decisão ele repetia: "Não tenho compromisso com o erro."

Diante de Bonner e Vasconcellos, Bolsonaro sugere que entrará na campanha pela sua reeleição comprometido com os próprios erros.

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