Elio Gaspari

Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

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Descrição de chapéu Milícia no RJ violência

Cláudio Castro é personagem patético e simbólico da desordem geral

A crise da segurança pública não tem bala de prata, mas, se os doutores pararem de empulhar, será um bom começo

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Pela lógica, os bandidos delinquem, mas não faz sentido que as autoridades federais, estaduais e municipais cultivem a arte de empulhar o público. Depois do que aconteceu no Rio, Lula tirou do baralho a carta dos militares e saiu-se com a seguinte platitude:

"Eu já conversei com o Flávio Dino e vou conversar com o Múcio [Defesa]. Vamos usar a estrutura dos Ministérios da Justiça e da Defesa para ajudar a combater o crime organizado e a milícia no Rio."

Se conversa resolvesse, o crime não estaria solto e, se as estruturas existentes servissem para alguma coisa, as milícias e as quadrilhas não teriam chegado ao nível em que estão.

Coisas como criar (ou extinguir) o Ministério da Segurança Pública, inventar forças-tarefa ou mudanças nas leis são apenas truques verbais.

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), durante entrevista para a Folha, no Palácio Guanabara, na zona sul do Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli - 6.abr.2023 / Folhapress

A crise da segurança pública não tem bala de prata, mas, se os doutores pararem de empulhar, será um bom começo.

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, é o personagem patético e simbólico da desordem geral, proclamou: "Zinho, Tandera e Abelha: não descansaremos enquanto não os prendermos."

Referia-se aos três chefes de quadrilhas de milicianos e traficantes.

A biografia da trinca é uma viagem à ruína que Cláudio Castro herdou e ceva.

Zinho foi preso em 2015, em companhia de um guarda-costas que pertencia aos quadros da Polícia Militar. Além de armas, o miliciano guardava um caderno com parte da contabilidade de seus negócios. Cinco dias depois, ganhou um habeas corpus do plantonista do Tribunal de Justiça.

Solto, Zinho escafedeu-se. Na segunda-feira passada, a polícia matou seu sobrinho Faustão e deu no que deu. Passa-se assim a outro braço da ruína: o bandido chefia sua milícia porque seus dois irmãos, Carlinhos Três Pontes e Ecko, foram mortos pela polícia.

Tandera também foi preso, duas vezes. Na primeira, viu-se absolvido. Na segunda, fugiu. Em 2020 a polícia matou 17 pessoas do Bonde do Ecko. Entre eles estava René, um ex-PM que controlava uma franquia da quadrilha em Itaguaí. Tandera ascendeu na hierarquia do grupo e passou também a criar cavalos manga-larga.

Abelha, o terceiro bandido, é acima de tudo um traficante. Quando esteve na cadeia foi até visitado pelo secretário de Administração Penitenciária do Rio, preso mais tarde pela Polícia Federal. Ele estava preso em 2021 e saiu da cadeia com alvará de soltura falso, carregando consigo um mandado de prisão. Ele teria sido o responsável pela devolução de oito metralhadoras roubadas no arsenal de São Paulo.

Os três bandidos mencionados por Cláudio Castro já foram presos. Um fugiu, outro deu um golpe e o terceiro foi libertado por um juiz. Em paralelo à ascensão da trinca foram mortos pela polícia pelo menos 5 de seus chefes e cerca de 50 "suspeitos" em ações espetaculosas da polícia.

O poderoso deputado Canella

O governador Cláudio Castro extinguiu a Secretaria da Segurança e trabalha com duas, a Civil e a Militar.

Em três anos, Castro teve quatro secretários da Polícia Civil. O terceiro ficou um mês na cadeira e foi dispensado porque não atendia direito os pedidos de deputados estaduais. Para o lugar, foi o delegado Marcus Amin, vindo da direção do Detran. Foi empossado graças a uma pirueta, pois não preenchia requisitos legais.

No ano passado, por iniciativa do deputado Márcio Canella, o delegado Amin recebeu a medalha Tiradentes. Até aí, nada demais. Um bom delegado pode dirigir o Detran e ser promovido para a Secretaria da Polícia Civil.

A coisa complica quando se olha para o padrinho. O deputado tem seu reduto eleitoral na Baixada Fluminense. Entre seus cabos eleitorais na eleição de 2022 estava o miliciano Jura.

Canella foi o deputado estadual mais votado em 2022, mas nenhum candidato está livre do apoio de um miliciano como Jura, um ex-PM, condenado a 26 anos de prisão em 2014.

Em julho de 2017, a Justiça colocou o miliciano no regime de prisão semiaberta, e ele foi nomeado para a assessoria da Secretaria de Ordem Urbana de Belford Roxo. (O benefício foi suspenso em 2020.)

A mulher de Jura trabalha no gabinete do deputado Márcio Canella.

O fundador da milícia de Jura foi profético ao criá-la. Ela se chama "Somos Comunidade".

Eremildo, o idiota

Eremildo é um idiota e não sai mais de casa desde a hora em que soube que o ministro da Justiça, Flávio Dino, recusou-se a comparecer a uma reunião de colegiado de Segurança Pública porque temia pela sua integridade física.

No dia seguinte ele foi, mas o cretino acredita que, se o ministro da Justiça são se sente seguro para ir ao Congresso, um idiota qualquer, como ele, não deve ir a lugar algum.

LEIA OUTRO TRECHO DA COLUNA DE ELIO GASPARI

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