Além de morte, medo, isolamento e máscaras de crochê, a pandemia multiplicou o número de negacionistas.
Por causa deles, médicos e cientistas vieram a público contestar teorias estapafúrdias. Muitos se tornaram referência, até mesmo celebridades.
Mas o ego é como o bichinho fofo do filme "Gremlins", que, com um pouco de água, vira um monstro violento. Tanto que alguns desses especialistas se autointitulam os detentores oficiais do carimbo que define o que é ou não é ciência.
A bióloga Natália Pasternak, famosa por defender a ciência na pandemia, lançou o livro "Que Bobagem! Pseudociências e Outros Absurdos que Não Merecem Ser Levados a Sério". A obra ataca qualquer prática que não seja comprovada com dados estatísticos e compara psicanálise à crença em discos voadores.
Em artigo no jornal O Globo, ela criticou a resolução do Conselho Nacional de Saúde de incentivar parcerias entre religiões de matrizes africanas e serviços de saúde e comparou os cultos à ozonioterapia.
Além do preconceito, a bióloga deixa claro que não usou nenhum método científico para escrever o artigo, poucos dias depois do assassinato de uma líder do candomblé.
Também não cita verdadeiras feitiçarias da medicina, como "chips da beleza", anfetamina para crianças e opioides para tratar até unha encravada.
Como defensora do selo "100% ciência", Pasternak esquece que saúde também é bem-estar mental, o que inclui religião e cultura, muito além de um diagnóstico e um remédio.
Se continuar assim, é capaz de recriminar qualquer um que diga "Se Deus quiser", pois a existência de Deus não foi comprovada cientificamente, muito menos se ele quer alguma coisa de nós.
Os Doutores da Alegria serão banidos de hospitais, pois são palhaços, não doutores. O filósofo Sartre entrará na lista de negacionistas, pois cientistas já comprovaram que palavras não são pistolas carregadas e que o inferno não são os outros, pois o inferno não existe.
Quem pular onda no Ano Novo, em vez de Iemanjá, verá a própria Pasternak saindo do mar, dizendo que rituais não são comprovados cientificamente.
O país terá que se contentar com especialistas que repetem palavras como "ciência", "comprovação científica" e "dados quantitativos" como mantras, agindo, eles sim, como fanáticos religiosos.
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