Gustavo Alonso

Doutor em história, é autor de 'Cowboys do Asfalto: Música Sertaneja e Modernização Brasileira' e 'Simonal: Quem Não Tem Swing Morre com a Boca Cheia de Formiga'.

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Gustavo Alonso

Quando vamos estatizar a CBF?

Se os democratas não tentarem algo renovador no esporte, os bolsonaristas continuarão se apropriando de nosso futebol

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Entre as maiores empresas do país estão o Itaú, a Vale e a Ambev. Nenhuma dessas empresas se vê como a representante oficial do Brasil. Mas a Confederação Brasileira de Futebol, uma entidade privada, se arvora detentora da brasilidade. Diante de tantos fracassos dessa empresa privada, já passou da hora de estatizarmos a CBF.

Em época de hegemonia de pensamento pretensamente liberal, falar em estatizar é quase um crime. Com certeza surgirão aqueles que chamarão este colunista de comunista, afinal basta trocar uma letra. Mas estatizar uma empresa não precisa ser feito nos moldes comunistas.

Logotipo da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), que cuida da seleção brasileira e organiza os campeonatos Brasileiro e Copa do Brasil, no Rio de Janeiro
Logotipo da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), que cuida da seleção brasileira e organiza os campeonatos Brasileiro e Copa do Brasil, no Rio de Janeiro - YASUYOSHI CHIBA/Yasuyoshi Chiba - 29.mai.15/AFP

Em outras épocas, como nos mandatos de Vargas e Juscelino Kubitschek, governos claramente capitalistas, tivemos a estatização de empresas com o intuito de, a partir do aporte governamental, dinamizar o setor privado.

Há determinadas circunstâncias históricas do capitalismo nas quais as empresas privadas não conseguem alavancar a economia e a sociedade por si sós. Que empresa privada seria capaz de construir a Companhia Siderúrgica Nacional? Qual capital conseguiria levar eletricidade e telefonia a todo país?

Nenhuma empresa privada teria sido capaz de fazê-lo: os custos eram muito altos e os lucros a longo prazo baixos. Foi aí que o desenvolvimentismo mostrou sua razão histórica de ser. O Brasil moderno, industrial, foi constituído não através do liberalismo voluntarista, mas do desenvolvimentismo.

Claro, o estatismo exagerado também é pernicioso. Nos anos 1990 percebemos isso e fizemos a saudável privatização de empresas que já tinham cumprido a missão de criar a infraestrutura do país. Casos como a privatização da telefonia, apesar de poderem ser questionados aqui e acolá, mostraram-se fundamentais para o Brasil adentrar o mundo globalizado.

Mas o que o futebol tem a ver com isso?

A CBF é uma entidade privada. Isso em si não é um problema. Pelo contrário, foi através dessa empresa que conseguimos nos transformar na principal potência futebolística do mundo. No entanto, diante da crise do futebol brasileiro que remonta há décadas, esta empresa privada não se mostra capaz de se reformular por si só. E leva o futebol brasileiro cada vez mais para o buraco.

Não dá mais para torcermos para o time de uma empresa. Ainda mais uma empresa que há anos sabota o esporte nacional a ponto de nos expor ao ridículo mundial. Estatizando-se a CBF finalmente os brasileiros serão donos da seleção. Alguns dirão: "a FIFA não permitirá!" É sério que vocês acham que a FIFA proibirá o Brasil de jogar uma Copa? Claro que não!

Aqueles que têm pesadelos com comunistas embaixo da cama logo perguntarão: "vai querer estatizar os clubes e os jogadores também?" O objetivo estatizante que defendo aqui é para dinamizar as entidades privadas em parceria com o Estado, alavancando-as do marasmo. É um projeto social-democrata real, utopia disruptiva hoje fora de moda desde que as esquerdas se renderam à hegemonia liberal nos anos 1990.

A meu ver, um projeto utópico como esse só vale a pena se estatizar for sinônimo de democratizar. Em meu sonho futebolístico, todos elegeremos o técnico da seleção pelo celular, em eleição democrática universal, tudo legitimado pelo Tribunal Superior Eleitoral e pela nova —e pública— CBF.

Assim, através do futebol democratizado, poderíamos desenvolver "know-how" eleitoral para aprofundar a participação popular em referendos diretos.

Há garantias de que a estatização resolverá todos os problemas do futebol? Não, nenhuma. Mas é uma alternativa que ainda não foi tentada. O caos futebolístico nacional pede solução drástica.

Se os democratas não tentarem algo concreto e renovador, os bolsonaristas estarão à espreita, vestidos com a camisa amarela e bradando as tolices de sempre, apropriando-se de nossa mediocridade futebolística.

Já passou da hora: é preciso estatizar e democratizar a CBF!

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