Reportagem de Filipe Oliveira mostrou que grandes empresas estão utilizando ferramentas de inteligência artificial para avaliar o perfil de candidatos a empregos, com o objetivo de ampliar a diversidade de seus futuros quadros. Não sei quão generalizado é o fenômeno, mas ele mexe com tradições arraigadas em nosso sistema de educação superior e no mercado de trabalho e tem potencial para mudar bastante as coisas.
Um dos principais efeitos é que o curso feito pelo candidato deixa de ter um peso tão grande. Agora que a tecnologia permite olhar de forma um pouco mais holística para os estudantes, avaliando não só o diploma que obteve mas também seus interesses intelectuais, experiências e perfil psicológico, o aspecto mais credencialista do sistema de ensino perde preponderância.
Bryan Caplan, autor de “The Case Against Education”, contextualiza bem o problema. Ele explica que é baixa a correlação entre aquilo que os cursos superiores ensinam e as habilidades que as empresas efetivamente precisam que seus profissionais tenham. O sistema só sobrevive porque empregadores utilizam o diploma como um credenciamento, isto é, uma espécie de teste de QI acrescido de provas de conformismo e capacidade de trabalhar em grupo (gente muito preguiçosa ou encrenqueira não resiste a quatro anos numa faculdade).
Ao reduzir o custo de avaliar individualmente cada candidato, as novas ferramentas de triagem permitirão que as empresas deixem de delegar essa tarefa inteiramente para as universidades. E isso pode representar uma forte disrupção num sistema que vem funcionando há décadas ou mesmo séculos. Nada que já não tenhamos visto acontecer em relação a outras indústrias.
Se não se revelar excessivamente destrutivo, é um movimento que pode trazer bons frutos, já que tende a deixar os processos seletivos mais sofisticados e favorece a interdisciplinaridade numa escala muito maior.
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