Quanto mais primitivo um governante, mais ele tende a confundir seus próprios interesses com os do país que governa. E isso costuma ser um problema, pois nações, ao contrário de pessoas, não têm amigos, apenas interesses. Jair Bolsonaro deve ter quebrado todos os recordes ao nem cumprimentar dirigentes mais à esquerda quando ganham eleições, mas, em algum grau, o fenômeno afeta a todos, especialmente nestes tempos em que se cobra de todos que comentem tudo.
Joe Biden, por exemplo, disse o diabo de Mohammad bin Salman e de Nicolás Maduro, ditadores da Arábia Saudita e da Venezuela. Não era para menos. O primeiro é apontado como mandante do assassinato e esquartejamento do jornalista Jamal Khashoggi, entre outras atrocidades, e o segundo é responsável por enterrar a democracia venezuelana e cometer crimes contra a humanidade.
São violações morais graves. Eu e você, leitor, podemos e devemos dizer isso. Presidentes e premiês precisam ser mais cuidadosos. Não estou, obviamente, sugerindo que fechem os olhos para abusos, mas precisam encontrar uma fórmula para denunciar as violações sem transformá-las numa restrição moral à pessoa do ditador (mesmo que sejam).
Voltando a Biden, ele disse o que disse e depois Putin invadiu a Ucrânia. Não sei se iniciar uma guerra é moralmente melhor ou pior que esquartejar um desafeto, mas não há dúvida de que o ataque russo tem repercussões mais gerais do que as ações de Bin Salman ou Maduro. O ponto é que, para tentar remediar a bagunça global provocada por Moscou, os EUA precisariam convencer a Arábia Saudita e a Venezuela a aumentar sua produção de petróleo. É mais difícil para o presidente americano ter sucesso nessa missão depois de ter usado palavras duras contra esses líderes.
Como o futuro é contingente e ninguém sabe de quem vai precisar amanhã, países não podem se dar ao luxo de queimar as pontes de que podem precisar.
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