Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman

As doenças imaginadas

Livro que combina memórias com crítica cultural e informações médicas traça uma história da hipocondria

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Eu gostei, mas os hipocondríacos vão adorar "A Body Made of Glass", de Caroline Crampton. É uma combinação de livro de memórias com história cultural da hipocondria e tutorial médico.

Crampton parte de seu caso pessoal. Aos 17, ela recebeu um diagnóstico de linfoma de Hodgkin. Fez um ciclo de quimioterapia, mas o tumor reapareceu. Ela fez então um segundo ciclo, mais agressivo, e submeteu-se a um transplante de medula. Desta vez, deu certo, mas o efeito colateral da experiência foi a hipocondria, que a acompanha desde então.

A ilustração de Annette Schwartsman, publicada na Folha de São Paulo no dia 13 de maio de 2024, mostra, sobre um fundo verde, um jovem hipocondríaco de cabelos ruivos que veste calça marrom, camiseta azul e meias amarelas, deitado sobre um sofá bordô. Ele tem uma bolsa de gelo sobre o joelho direito, um termômetro na boca, um oxímetro no indicador direito, um aparelho de medir pressão no pulso esquerdo e um curativo no mesmo braço. Sobre uma mesinha, dois potes de remédios e um celular aberto na página do Google. No chão, uma caixa de primeiros socorros aberta e um estetoscópio.
Annette Schwartsman

A autora fez a lição de casa. Vai de Hipócrates aos dias de hoje. O termo "hipocondria" já desapareceu dos manuais de psiquiatria contemporâneos, que falam em "ansiedade em relação à saúde". Crampton não se detém diante das dificuldades e contradições. Se a ansiedade é definida como uma preocupação exagerada, o que configura o exagero? Pessoas como ela que já passaram por más experiências estão exagerando ou sendo razoáveis quando ficam hipervigilantes em relação a sinais de uma recidiva? Se a hipocondria é uma doença que está apenas na mente de seus portadores, ela se torna menos real?

Como não poderia deixar de ser num livro como esse, Crampton fala de hipocondríacos ilustres, que incluem Marcel Proust, John Donne, Charles Darwin, Immanuel Kant, Virginia Woolf e Philip Larkin. Jane Austen não é propriamente uma hipocondríaca, mas sua mãe, com a qual ela tinha uma relação difícil, era. Por isso, em sua obra abundam hipocondríacos retratados de forma pouco favorável.

Nas páginas finais, a autora nos brinda com interessantes reflexões sobre o problema mente-corpo. Ao menos para os que, como eu, abraçam o paradigma materialista, a mente é uma ilusão. À medida que nosso conhecimento médico avançar, psiquiatria e neurologia se tornarão uma coisa só, e doenças que "que estão apenas na sua cabeça" se tornarão tão concretas como um osso quebrado.

helio@uol.com.br

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