Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Descrição de chapéu aborto Congresso Nacional

Batalha de metáforas

PL Antiaborto por Estupro perdeu apoio parlamentar porque permitiu descrever mudança como uma medida que imporia à vítima pena maior do que a prevista para o estuprador

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São Paulo

Pelo que leio nos jornais, o famigerado PL Antiaborto por Estupro vai para a geladeira. A repercussão negativa da proposta foi de tal ordem que os deputados do centrão que ajudaram a aprovar o regime de urgência pularam fora. Em seguida, a própria bancada evangélica, sentindo cheiro de derrota, começou a achar melhor deixar a investida contra os direitos das mulheres para uma próxima ocasião. O que aconteceu?

Um dos achados da neurociência mais relevantes para a política é que metáforas têm existência concreta no cérebro e influenciam nossos pensamentos. Até onde sei, o primeiro a explorar isso foi o linguista George Lakoff. Neurônios que com frequência disparam juntos formam conexões entre si que se fortalecem à medida que são mais utilizadas. Metáforas são justamente essas conexões entre ideias e sentimentos negativos ou positivos que imprimem um conteúdo emocional (e político) à comparação mental.

Ato Contra o PL Antiaborto por Estupro, que quer aumentar a pena para o aborto depois de 22 semanas, na avenida Paulista. - Tuane Fernandes - 15.jun.2024/Folhapress

A metáfora "aborto é assassinar bebês" está bem assentada no Brasil. É ela que dificulta o reconhecimento de um direito tão básico como o de que as mulheres devem ter soberania sobre seus próprios úteros. Mas, desta vez, a bancada evangélica comeu mosca. Foi tão afoita em endurecer a legislação do aborto que permitiu descrever o PL como uma medida que faria com que a vítima de estupro ficasse sujeita a penas maiores do que as previstas para seu estuprador. E isso foi fatal para o projeto. As caixas de mensagens e o WhatsApp dos parlamentares devem ter ficado atulhadas de protestos.

Esse tipo de movimento que leva congressistas a "mudar de ideia" não acontece todos os dias, mas não chega a ser inédito. Costuma ocorrer em situações de rematado exagero ou de franco corporativismo.
Gostaria de interpretar essa batalha de metáforas como um avanço civilizacional, mas receio que ela traduza mais um impulso punitivista da população do que uma reflexão madura sobre a autonomia individual.

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