Joel Pinheiro da Fonseca

Economista, mestre em filosofia pela USP.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Joel Pinheiro da Fonseca
Descrição de chapéu COP28

O governo Lula não cansa de fracassar nas relações internacionais?

Parece que vivemos nos anos 1970: os olhos brilham é com petróleo e geopolítica da Guerra Fria

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Parabéns ao governo Lula pelo prêmio "Fóssil do Dia", pela decisão de entrar na Opep+ no meio da COP28, cujo objetivo é combater as mudanças climáticas! O prêmio é, evidentemente, uma brincadeira feita pela Climate Action Network para apontar países que dão mau exemplo no esforço de combater as emissões de CO2 ao longo dos dias do evento.

Mudança climática é coisa séria. 2023 tem sido um ano de calor e eventos climáticos extremos por todo o Brasil, de secas no Norte e enchentes no Sul causando mortes e destruição. A perda também é econômica. Em 2022, agricultores e pecuaristas perderam R$ 85 bilhões devido a condições climáticas (levantamento da Confederação Nacional dos Municípios).

O cubano Miguel Diaz-Canel, o xeique Mohamed bin Zayed Al Nahyan, dos Emirados Árabes, e Lula, durante a COP28, no sábado (2) - Divulgação UAE via AFP

Já adianto que não tenho nada contra extrair petróleo: não é pelo lado da oferta que combateremos o uso de combustíveis fósseis. Se o Brasil parasse de extrair petróleo, a demanda global seria suprida por outros. O efeito estufa continuaria, e o Brasil teria perdido uma fonte de receita. O combate ao aquecimento global tem que vir pelo lado da demanda: fazendo motores de combustíveis fósseis mais eficientes (e portanto consumindo menos) e, principalmente, tornando o uso de combustíveis fósseis menos vantajoso do que o de alternativas limpas —como solar, etanol, etc.

Tampouco é algo ruim ter um assento na Opep+. Algum poder de influência nas decisões da produção de petróleo mundial é melhor do que nenhum. O que temos de questionar, além do timing, são as prioridades do nosso governo no plano global.

O Brasil tem tudo para ser a liderança global na temática ambiental: temos a maior reserva de água doce do mundo; nossa matriz energética, baseada principalmente em hidrelétricas, já emite pouco CO2. Tem em seu território a maior parte da Amazônia, nosso maior e inestimável patrimônio ambiental. Basta conter o desmatamento e, se possível, restaurar a floresta que já estará fazendo um serviço importante a si e ao mundo, pelo qual pode e deve cobrar, como já vem acontecendo —em escala tímida— via Fundo Amazônia.

O mundo (democrático e capitalista) agora não quer produzir apenas onde é mais barato. Critérios ambientais e de estabilidade política falarão cada vez mais alto. O Brasil está muito bem posicionado para ser um polo atrativo de investimentos e de comércio, se fizer sua lição de casa ambiental e econômica (reforma tributária) e abrir a economia. Meio ambiente, democracia e comércio caminham juntos, ao menos por enquanto.

Apesar da pressão interna, o Ministério do Meio Ambiente vem apresentando alguns bons resultados e passando a mensagem correta ao mundo. E, no entanto, a julgar pelo próprio Lula, Alexandre Silveira e Celso Amorim, parece que vivemos nos anos 70: os olhos brilham é com petróleo, protecionismo industrial e geopolítica da Guerra Fria.

Até hoje, os royalties do petróleo falharam em trazer desenvolvimento humano aos municípios agraciados. O desejo de proteger nossa indústria pode ser mais uma peça no já bem possível fracasso do acordo União Europeia-Mercosul; Lula quer privilegiar empresas brasileiras nas compras governamentais. Nas mãos de agricultores franceses e industriais brasileiros, ficaremos todos mais pobres.

Estamos repetindo a velha estratégia do protecionismo nacionalista que já falhou no nosso passado e continuará falhando, condenando nossa indústria à ineficiência e o Brasil ao escanteio global. Acordos econômicos são descartados em nome de uma sonhada projeção geopolítica. Enquanto isso, como anda nossa brilhante intermediação do diálogo entre Rússia e Ucrânia? Será que algum dia cansaremos de fracassar?

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.