Juliano Spyer

Antropólogo, autor de "Povo de Deus" (Geração 2020), criador do Observatório Evangélico e sócio da consultoria Nosotros

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E o voto evangélico vai para...

Os evangélicos preferem votar em Bolsonaro, embora a discrepância entre os dados de institutos de pesquisa sugira que eles ainda não se decidiram

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Uma guerra de narrativas está em curso. Lulistas querem dizer que "evangélicos estão abandonando Bolsonaro". E bolsonaristas, que "evangélicos seguem fiéis ao presidente" mesmo com os resultados ruins do governo. Em vez de apontar uma tendência, dados discrepantes de duas pesquisas mantiveram a disputa em suspense.

O Datafolha anunciou Lula e Bolsonaro praticamente empatados na preferência do eleitor evangélico; e o DataPoder indicou vantagem folgada para o presidente. A diferença alimentou uma terceira narrativa: a de que "alguém está mentindo".

Comparar os métodos de coleta de dados usados por cada instituto poderia explicar a discrepância. Mas ainda não há consenso sobre as tecnologias usadas pelos institutos. Cada lado defende seu negócio.

Culto na 48ª Assembleia Geral Extraordinária da Convenção Nacional das Assembleias de Deus do Ministério de Madureira, com a presença do presidente Jair Bolsonaro
Culto na 48ª Assembleia Geral Extraordinária da Convenção Nacional das Assembleias de Deus do Ministério de Madureira, com a presença do presidente Jair Bolsonaro - Anderson Riedel/PR

Um caminho mais promissor para entender as preferências do eleitorado evangélico é examinar os dados das pesquisas que chamaram menos atenção. E a primeira conclusão que salta à vista é que o terreno evangélico está em plena disputa. Assim como outros eleitores antes de as campanhas começarem, evangélicos estão examinando suas opções a partir do contraste de suas experiências com os candidatos conhecidos.

"A discrepância entre os resultados das pesquisas ocultou um dado mais importante," diz Vinicius do Valle, cientista político e autor de "Entre a Religião e o Lulismo" (Recriar 2019). Ele chama a atenção, a partir dos dados do Datafolha, que o grupo que não quer Lula nem Bolsonaro se destaca em comparação com outros segmentos — 40% dizem que não votariam de jeito nenhum em Bolsonaro no primeiro turno e 46% dizem o mesmo sobre Lula.

Para Vinicius, "ainda que as pesquisas de diferentes institutos não tenham a mesma metodologia e não possam ser comparadas, o compilado dos últimos resultados está mostrando uma alta volatilidade do eleitor evangélico. Em outras palavras: mais do que nunca, os evangélicos estão em disputa, e não podem ser vistos como automaticamente aliados a Bolsonaro."

Valdinei Ferreira, pastor presbiteriano e doutor em sociologia pela USP, também notou o baixo entusiasmo dos eleitores evangélicos pelos dois candidatos mais cotados para vencer a eleição.

Ele explica o desinteresse desse grupo pelos dois protagonistas porque nenhum deles representa o tema do combate à corrupção. "O discurso da Lava Jato encontrou eco em muitas Igrejas evangélicas," explica Valdinei. Por causa disso, para ele, "um caminho possível para os candidatos que querem furar a polarização seria empolgar esse eleitorado com a bandeira da anticorrupção."

Para Valdinei, o presidente deve radicalizar seu discurso na defesa de temas que sejam caros aos evangélicos para manter a influência sobre esse eleitorado, numa estratégia semelhante à que tem feito com seus eleitores de extrema-direita. "O problema é que não estamos mais em 2018 e ‘requentar’ os assuntos relacionados à ideologia de gênero provavelmente não terá mais o mesmo efeito, vide o caso de Marcelo Crivella que tentou, sem êxito, esse caminho na campanha pela reeleição na cidade do Rio de Janeiro."

Pesquisador sênior da Universidade de Zurique e autor do recém-lançado "A Religião Distrai os Pobres?" (Almedina), o cientista político Victor Araújo avalia que os dois institutos apresentaram cenários extremos e que a preferência dos evangélicos neste momento deve estar no meio do caminho entre os dois resultados. Mas ele analisa que a intenção de voto em Bolsonaro esteja subestimada. "Tem uma orientação promovida por várias lideranças religiosas para fiéis não responderem pesquisas porque elas seriam financiadas ‘pelo sistema’ para derrotar Bolsonaro."

Apesar de considerar cedo para fazer previsões, Victor arrisca um palpite. "Se eu tiver que apostar, diria que a diferença vai aumentar a favor de Bolsonaro quando a guerra cultural [sobre as pautas morais] começar… Ele não vai ter os 70% de votos evangélicos como em 2018, mas será muito mais bem votado do que o Lula nesse segmento."

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