Katia Rubio

Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

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É difícil ser mulher, mãe e atleta

Mulheres que mudam o mundo. Esse é o título de Shelly-Ann e Allyson Felix

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Não estamos em março, quando se celebra o Dia Internacional da Mulher, mas a última semana foi digna de entrar para a história como a semana das mulheres atletas. No atletismo e no futebol, mulheres consideradas velhas ou impróprias para a prática esportiva, por viverem a maternidade, provaram que a definição do limite da prática esportiva é dada por elas, não por manuais construídos há dois séculos.

Nunca é demais lembrar que mulheres foram privadas do direito ao esporte por serem consideradas frágeis. Se hoje elas frequentam e dominam pistas, campos, quadras, tatames e piscinas, é porque algumas lutaram para que muitas pudessem demonstrar publicamente suas habilidades. Passados mais de cem anos, persiste o preconceito, porém, encoberto por novos argumentos.

As mulheres podem praticar esporte acompanhadas sempre dos adversativos mas, porém, contudo, todavia, entretanto, não obstante, senão. Ou seja, a mulher pode sim ter contrato, mas não pode engravidar. A mulher pode competir, entretanto deve respeitar os limites do seu corpo. A mulher pode se profissionalizar, todavia deve ter contratos inferiores aos homens. Assim passou mais de um século, e elas ainda não alcançaram o mesmo patamar dos prêmios oferecidos aos atletas homens ou a liberdade de expressar suas reivindicações com a mesma visibilidade que os homens.

A norte-americana Allyson Felix, mãe de Camryn, é atleta excepcional - Aleksandra Szmigiel - 29.set.19/Reuters

Não bastassem essas limitações, o tempo parece também não ser muito favorável às atletas mulheres. Enquanto homens têm vida reprodutiva até idade avançada, as mulheres correm contra o tempo para realizar a maternidade biológica. Coincidentemente, esse momento é o mesmo em que se vive a plenitude da vida esportiva. Isso leva muitos clubes e patrocinadores a exigir que mulheres atletas optem pela carreira esportiva ou pela maternidade. Sem um rei Salomão para oferecer a solução para essa divisão, o que se vê é o abandono da carreira esportiva ou da maternidade.

A sociedade que ainda transpira patriarcado e critica mulheres que amamentam seus filhos em lugares públicos mostra seus dentes e garras para atletas que ousam voltar da maternidade e ainda se provar habilidosas nas competições. Basta ler com atenção os textos que se referem a Allyson Felix, 33 anos, dona de 17 medalhas em Mundiais de atletismo, maior recordista de todos os tempos e mãe de Camryn, e Shelly-Ann Fraser-Pryce, 32 anos, 8 medalhas de ouro de 10 conquistadas em mundiais e mãe de Zyon.

Nesta última semana, essas mulheres se destacaram não porque conquistaram medalhas dentro das pistas, mas porque quebraram o tabu da idade e da maternidade. Maduras e mães, voltaram para a pista para se reafirmar como atletas habilidosas e competentes. Provaram que a idade e a pausa para gerar um filho não podem ser limitantes para a carreira esportiva. Mostraram ao mundo, e também a dirigentes e patrocinadores, que é preciso cuidado com a afirmação de conceitos seculares sobre a fragilidade ou incapacidade feminina.

Mulheres que mudam o mundo. Esse é o maior título de Shelly-Ann e Allyson Felix.

E também de Sydney Leroux, atacante da seleção americana de futebol, que entrou em campo apenas três meses depois de dar à luz sua segunda filha. Apoiada por sua equipe e pelo público, ela voltou a jogar levando consigo a filha a quem amamentou no banco.

Essas cenas provam que a vida e o mercado de trabalho para as mulheres, seja ou não no esporte, é marcado por determinações que transcendem a competência. É preciso muita força, muita raça e muita gana para manter essa estranha mania de ter fé na vida.

Erramos: o texto foi alterado

O Dia Internacional da Mulher é celebrado em março e não em maio, como foi publicado na coluna "É difícil ser mulher, mãe e atleta". O texto foi corrigido. 

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