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O crime organizado faz o México ajoelhar-se

Estado não tem capacidade de reagir ou controlar muitos territórios do país, e homicídios crescem

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Carlos Barrachina Lisón

É professor da Universidade Anáhuac México e do Instituto Mexicano de Estudos Estratégicos de Segurança e Defensa Nacionais (SEDENA).

Nem a estratégia de Felipe Calderón “guerra às drogas”, nem o discurso de Enrique Peña Nieto “prevenção do crime”, nem os “abraços, não balas” de Andrés Manuel López Obrador e a distribuição direta de recursos aos mais pobres produziram resultados.

Os homicídios, que aumentaram dramaticamente durante o governo de Calderón, e que após uma moderação nos primeiros anos do mandato de Peña Nieto voltaram a crescer em 2016, atingiram um máximo histórico em 2019, já na administração de AMLO.

Desde então, o número de homicídios tem permanecido semelhante.

A credibilidade do governo mexicano e a possibilidade de uma transformação da forma como a política é conduzida no país está em risco devido à situação incontrolável de violência.

Além disso, as estatísticas do Secretariado Executivo do Sistema Nacional de Segurança Pública (SESNSP) e do Instituto Nacional de Estatística e Geografia (Inegi) não são confiáveis.

Em alguns casos devido à intencionalidade política dos governos estatais, noutros devido ao medo das autoridades locais de represálias do crime organizado, especialmente em Tamaulipas e Veracruz, e também devido ao elevado número de pessoas desaparecidas encontradas em sepulturas clandestinas que não podem ser quantificadas.

Os dados oficiais, contudo, mostram uma geografia aproximada da violência homicida.

Os homicídios no México situam-se atualmente entre 32 mil e 37 mil por ano, ou mais de 26 homicídios por 100 mil habitantes.

Em 2020, os cinco estados com mais homicídios por 100 mil habitantes foram Colima (76,2), Baja California (70,5), Quintana Roo (65), Chihuahua (62,1) e Guanajuato (59,9).

Membros do Exército mexicano monitoram o local onde havia restos de ossos, em área de floresta no estado de Quintana Roo
Membros do Exército mexicano monitoram o local onde havia restos de ossos, em área de floresta no estado de Quintana Roo - Adolfo Jasso - 14.jul.2021/Xinhua

​O que explica a violência incontrolável no México?

Há duas razões fundamentais. A classe política desistiu de reformar o sistema nacional de segurança pública, o que implicou transformar as forças policiais estatais e locais, e ter uma estratégia de segurança clara. Por outro lado, a luta entre diferentes grupos do crime organizado está a intensificar-se.

Durante o mandato de seis anos de Calderón, foi iniciada uma política que reconheceu a fraqueza das forças policiais locais como o grande desafio enfrentado pelo sistema de segurança pública nacional.

Foi concebida uma estratégia de profissionalização e foi atribuída uma grande quantidade de recursos econômicos para alcançar esse objetivo. A reforma falhou, tanto devido à falta de empenho das diferentes autoridades como ao claro desvio de recursos econômicos.

Na segunda metade do mandato de seis anos de Peña Nieto, essa estratégia, que também permitiu aos oficiais militares reformados tornarem-se diretores das forças policiais locais, foi abandonada.

A partir daí, a polícia militar começou a ser destacada para o território para apoiar a polícia municipal e estatal, organizando operações conjuntas.

Foi também aprovada uma lei de segurança interna –mais tarde declarada inconstitucional– que autorizava os militares a participar em atividades de ordem pública.

No mandato de seis anos de Andrés Manuel López Obrador essa estratégia teve continuidade e foi criada a Guarda Nacional, composta principalmente por elementos militares.

O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, durante entrevista no Palácio Nacional, na capital do país
O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, durante entrevista no Palácio Nacional, na capital do país - 5.ago.2021/Xinhua

​A luta do crime organizado pelas 'praças'

A violência deve-se à intensificação da luta do crime organizado pelo território e pelas “praças”.

O México é um país de consumo e trânsito de diferentes tipos de drogas, mas os grupos do crime organizado também estão envolvidos no “huachicoleo” (o roubo e comercialização de hidrocarbonetos), ou tráfico de seres humanos (especialmente migrantes em trânsito para os Estados Unidos).

Os centros turísticos do país, especialmente Acapulco (Guerrero), Cancún e a Riviera Maia (Quintana Roo) e Guanajuato, são pontos importantes do consumo de drogas, que, juntamente com o recolhimento de “derecho de piso” (uma espécie de “taxa de piso’) das empresas e do tráfico de drogas, desencadearam lutas pelos mercados da droga –ou seja, a luta pelas praças.

Em Acapulco a violência sobe e desce dependendo da dinâmica da luta entre os diferentes grupos do crime organizado.

Em Quintana Roo, que é também um importante ponto de entrada de drogas no país, os homicídios começaram a escalar rapidamente em 2017 e não pararam.

Entretanto, cidades como Los Cabos e La Paz na Baja California Sur, que foram identificadas em 2016 e 2017 como as mais violentas do mundo, foram postas sob controle.

Para além do consumo de drogas, a luta entre grupos por roubo de combustível levou a um aumento de confrontos e execuções em Guanajuato.

E a chegada do fentanil aos portos do Pacífico, especialmente a Manzanillo (Colima), levou a um recente aumento da atividade criminosa nesse território e em Zacatecas, que é um ponto central de trânsito para os Estados Unidos.

Por outro lado, a violência voltou a aumentar em estados fronteiriços como a Baja California e Chihuahua; e certamente, apesar dos números oficiais, também em Tamaulipas.

Finalmente, noutros estados em que os grupos do crime organizado têm tradicionalmente tido conflitos, tais como Michoacán, Sonora, e Sinaloa, as taxas de homicídios estão novamente elevadas.

Para concluir, a falta de polícia local profissional, de uma Guarda Nacional em formação e de uma política confusa de aproximação ao crime (“abraços e não balas”), fizeram com que os homicídios continuassem a aumentar no México, enquanto o Estado não tem capacidade de reagir ou controlar muitos territórios do país.

Isso torna claro que, enquanto o governo não implementar reformas profundas na estratégia de segurança, a violência dificilmente irá diminuir.

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