Laura Carvalho

Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".

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A ficha não caiu

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Ao anunciar, na sexta-feira passada (19), sua proposta de redução da meta fiscal, o governo deu sinais de ter aprendido com os erros de 2015. Afinal, estabelecer uma meta incompatível com o cenário de frustração de receitas não engana investidores; dificulta o planejamento da política econômica e expõe ao constrangimento de ter de revê-la ao longo do ano.

O restante do pacote fiscal anunciado indica, entretanto, que o governo continua cavando sua própria cova.

É sempre bom relembrar o histórico recente da política fiscal no Brasil. Ao se deparar com a desaceleração econômica em seu primeiro mandato, o governo contribuiu para deteriorar a situação fiscal por meio de desonerações e subsídios, que, por sua vez, não funcionaram para recuperar a economia ou mesmo resgatar sua popularidade junto ao setor empresarial.

Diante do deficit maior e de uma crise econômica e política ainda mais profunda, realiza um ajuste fiscal centrado no corte de investimentos públicos, que acelera a queda do nível de emprego, do crescimento e da arrecadação tributária. A estratégia não obtém o apoio almejado e deteriora sua antiga base de sustentação.

Agora, vendo-se obrigado a reduzir sua própria meta fiscal, que todos já julgavam excessivamente otimista, o governo resolve compensar oferecendo uma intenção de reformar a Previdência, com impacto fiscal previsto para daqui a duas décadas, e uma regra para limitar o crescimento dos gastos públicos em relação ao PIB. Em caso de descumprimento dessa regra, o pacote prevê também uma sequência de ajustes automáticos de despesas.

Na primeira etapa, além de não serem concedidas novas desonerações (ufa!), seriam interrompidos os aumentos reais de despesas de diversos tipos, incluindo salários de servidores, novos concursos e outros itens. Caso não seja suficiente, uma segunda etapa congelaria essas despesas em termos nominais. E finalmente, em um eventual último círculo de Dante, suspenderia o aumento real do salário mínimo, entre outras medidas impopulares.

A substituição de uma meta de superavit primário baseada em receitas incertas por um limite para o crescimento real dos gastos que não fosse atrelado a um PIB igualmente incerto poderia facilitar o planejamento e a ação anticíclica da política fiscal. O mesmo não vale para a fixação de um limite para os gastos como proporção do PIB, e em patamar abaixo do atual, como quer o governo.

Se o Congresso e o conjunto de agentes econômicos fossem inteiramente compostos de economistas fiscalistas, a estratégia talvez funcionasse enquanto saída para a crise política e econômica. Mas, na realidade em que vivemos, essa venda casada não arrancará nenhum aplauso da oposição, servindo apenas para injetar mais desânimo na base do governo.

Além de não mencionar o aumento na taxação de grandes heranças ou o fim da isenção de Imposto de Renda da Pessoa Física sobre dividendos demandado por sua base progressista, a proposta não deixa claro o espaço fiscal para a retomada substantiva dos investimentos públicos e a preservação de empregos. Empregos esses que são fundamentais para a recuperação da confiança dos brasileiros, ao contrário de uma promessa difusa de um ajuste fiscal concentrador de renda para o médio e longo prazo.

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