Laura Carvalho

Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".

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Meirelles também aposta em 'ficção inspirada em fatos reais'

É mais difícil fazer 'fake fiction' quando os personagens são os próprios espectadores

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O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles - Ueslei Marcelino - 27.mar.18/Reuters

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, anunciou na terça-feira (27) sua filiação ao MDB, antecipando assim uma decisão que teria de acontecer até o dia 7 de abril.

Assim como o gestor eleito para a Prefeitura de São Paulo, o líder do técnico “dream team” econômico de Temer deixará o posto porque é movido, vejam vocês, por puras ambições políticas.

A saída de Meirelles escancara o que tantos analistas já haviam enfatizado desde que a reforma da Previdência deu lugar à segurança pública no centro do discurso do governo: nada de relevante acontecerá na área econômica até o fim do ano.

Para se cacifar como candidato à Presidência da República, o ministro tentará vender a ideia de que fez muito pela economia do país desde que assumiu a Fazenda, em maio de 2016. No anúncio de filiação ao MDB, feito por meio de sua conta no Twitter, comprometeu-se a “aprofundar as mudanças que tiraram o Brasil da pior crise da nossa história”.

A história contada por Meirelles tem tudo para tornar-se uma série no Netflix Brasil: trata-se de “obra de ficção livremente inspirada em fatos reais”, com mínimo potencial de entretenimento.

No primeiro episódio da série, vende-se a ideia de que a queda de 3,5% do PIB e o déficit primário maior em 2016 são fruto da gastança do governo Dilma.

O cenário externo desfavorável e os efeitos econômicos da Operação Lava Jato nem sequer entram no roteiro. Omite-se que entre 2011 e 2014 as despesas federais cresceram menos do que nos governos anteriores e que em 2015 os cortes no Orçamento foram muito maiores do que os de 2016. Ignora-se ainda o efeito negativo desses cortes sobre a própria economia, o nível de emprego e a arrecadação do governo.

No segundo episódio, a queda da inflação e a redução da taxa de juros são celebrados como resultados da maior credibilidade da equipe econômica e da aprovação de um teto constitucional para os gastos públicos.

Omite-se a informação de que a inflação começou a cair logo no início de 2016, antes mesmo do impeachment de Dilma. Tampouco consta que essa queda já fosse esperada, dada a alta do desemprego e o fim do efeito do reajuste de tarifas energéticas e outros preços administrados em 2015.

No terceiro episódio, o crescimento pífio de 1% da economia em 2017 é celebrado como um sintoma da maior confiança dos investidores e consumidores nos rumos da política econômica do “dream team”. A supersafra de soja no primeiro trimestre e o caráter temporário do efeito dos saques de contas inativas do FGTS e do PIS-Pasep sobre o consumo das famílias são cortados na edição final. A dívida pública cada vez maior também desaparece. Por fim, não se faz nenhuma menção à falta de dinamismo dos investimentos das empresas ou ao fato de estarmos diante da mais lenta das recuperações entre as crises da nossa história.

No quarto episódio, comemora-se a queda no desemprego após a reforma trabalhista sem dizer que os poucos postos de trabalho gerados no setor privado são em sua grande maioria informais ou precários, o que contribui para elevar desigualdades.

O que talvez Henrique Meirelles não tenha notado é que é mais difícil fazer “fake fiction” quando os personagens são os próprios espectadores. E uma coisa é certa: os eleitores sabem que sua situação piorou muito desde que votaram pela última vez para a Presidência da República.

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