Sabe aquele tipo de rei despótico medieval que, quando não gostava da mensagem recebida, mandava matar o mensageiro? Pois boa parte da militância de esquerda e de direita tem agido da mesma forma em relação ao jornalismo, que, de um lado, recebe a alcunha de "imprensa golpista" e, do outro, de "a mídia globalista". O jornalismo pode e deve ser criticado, óbvio, mas a partir de análises fundamentadas e sem generalizações.
Porém, eis como age o militante: quando um jornal publica acusações sobre um político de que eu gosto, desconsidero todas as outras matérias com acusações sobre políticos de que desgosto. Assim, consigo afirmar que tal jornal é contra quem eu gosto e, em um salto ilógico, concluo que tudo o que publica é interessado ou inverídico.
O pior é que esse mecanismo está também na academia, onde se espera encontrar embasamento metodológico básico. Um exemplo das ciências naturais: se quero comprovar a hipótese de que só existem cisnes brancos, devo procurar por cisnes pretos, já que a mera existência de cisnes brancos não comprova que não possa haver cisnes pretos. Só no caso de não encontrar cisnes pretos posso confirmar minha hipótese. Da mesma forma, em pesquisas sobre jornalismo, se quero comprovar que tal jornal é contra o político A, preciso ir atrás de matérias deste veículo que são contra o político B. Se só procuro por matérias contra A, não consigo nem confirmar nem invalidar minha hipótese.
O resultado de análises rasas sobre o jornalismo e da postura anti-imprensa das militâncias pode ser devastador. Como demonstra Jean Chalaby, em "A Invenção do Jornalismo", a imprensa não é uma consequência residual das revoluções que fundaram a democracia moderna. Na verdade, é fator sine qua non para a formação da democracia e para a sua manutenção. Matar o mensageiro não faz com o que o problema contido na mensagem desapareça, faz apenas com que fiquemos vulneráveis, posto que ignorantes. E, em ano de eleições, isso é um perigo.
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