Marcelo Coelho

Mestre em sociologia pela USP, é autor dos romances “Jantando com Melvin” e “Noturno”.

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Marcelo Coelho

Votação congelada

Réu não poderia pagar pelo fato de o Supremo não estar disposto a estender a sessão

Falando no STF em defesa de Lula, o advogado José Roberto Batochio apelou para a cultura francesa.

Comparou seu cliente a Luís 16 e ao ex-presidente francês Nicholas Sarkozy, outras vítimas, segundo ele, de uma “volúpia do encarceramento” e de um “jacobinismo sanguinário”.

Ministros do STF discutem se votariam nesta quinta (22) habeas corpus do ex-presidente Lula
Ministros do STF discutem se votariam nesta quinta (22) habeas corpus do ex-presidente Lula - Carlos Moura / STF

O autoritarismo pode ter “a cor verde-oliva” do uniforme militar, mas também a cor negra das...  Do que mesmo? Ele queria aludir às togas dos juízes, mas saiu-se com um clichê: “das asas da graúna!”

O relator do caso, Edson Fachin, elogiou o desempenho de Batochio, que “saiu da cidade de Dois Córregos para inundar o mundo com sua inteligência”. A sessão logo entraria em terreno mais árido. Não se tratava de discutir o conteúdo da condenação de Lula. Nem de voltar ao debate sobre a constitucionalidade das prisões depois da segunda instância.

O problema era de ordem processual. A defesa pedia que se garantisse, face a ameaças iminentes, a liberdade de Lula. A tradição democrática tem um instrumento para isso, o habeas corpus.

Para alguns ministros, o Supremo não deveria tomar conhecimento desse pedido. Havia uma falha formal naquela ação.

O argumento, em resumo, é que os advogados pediram o habeas corpus contra uma decisão individual do presidente do Superior Tribunal de Justiça, que numa liminar aceitava a prisão de Lula.

Ocorre que, depois dessa liminar do ministro Humberto Martins, o plenário do STJ analisou a questão –mantendo, aliás, a possibilidade de Lula ser preso.

Para Luis Roberto Barroso, os advogados de Lula teriam então de apresentar outro habeas corpus. Aquele original já não tinha mais validade, uma vez só que contestava a decisão de um juiz isolado, e não o resultado real da votação no STJ.

Além disso, seria possível recorrer contra o STJ sem mobilizar o Supremo nesse caso. Luiz Fux, por exemplo, reclamou de um excesso, de uma “promiscuidade” no uso do habeas corpus, atolando o Supremo.

A maioria, entretanto, não o acompanhou. Com delicadeza, Rosa Weber observou que se o STF se recusasse sequer a analisar o conteúdo do habeas corpus, pedindo aos advogados que enviassem outro, estaria privilegiando formalismos.

Sempre com espírito prático, Dias Toffoli lembrou que os pedidos da defesa e a questão da prisão em segunda instância terão de ser examinados cedo ou tarde, não havendo razão para ignorá-los agora.

Por 7 votos a 4, a decisão final, nessa questão preliminar, foi que o habeas corpus de Lula deve ser examinado pelo STF. Faltava, então, analisá-lo. Mas já eram 18h.

E, com o julgamento ficando para depois, Lula continuaria desprotegido: o Tribunal Regional Federal está pronto para prendê-lo já na segunda-feira (26).

O que fazer? A defesa pediu uma liminar, suspendendo a prisão. 

Marco Aurélio concordou: cabe “congelar” a situação jurídica de Lula, até o STF voltar ao caso, no dia 4 de abril.

Simpático ao exame do habeas corpus, Alexandre de Moraes alinhou-se então aos “duros”, como Fachin, Barroso, Carmen Lúcia e Fux, opondo-se a interromper o caminho de Lula até a prisão. 

Não há nada de monstruoso no que foi decidido até agora pelos outros tribunais, e não seria bom desautorizá-los.

Rosa e Toffoli foram pela lógica: se não tivemos tempo para julgar o caso, é errado deixar a situação como se o habeas corpus tivesse sido recusado. O réu não poderia pagar pelo fato de o Supremo não estar disposto a estender a sessão para depois das 18h.

Lula não é “mais cidadão que os outros”, mas também não é “menos cidadão”, disse Gilmar, insuspeito de petismo. Foi a opinião da maioria nesse ponto. Seis a cinco, novamente. 

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