Em 1960, The New York Times publicou um anúncio denunciando os processos contra Martin Luther King em Alabama. O anúncio continha erros, como o número de vezes em que Dr. King fora preso até então pelos seus protestos contra a segregação racial.
L. B. Sullivan, chefe da polícia, entrou com uma ação judicial por difamação e ganhou nas cortes locais. O jornal foi multado em U$ 500 mil.
O caso foi parar na Suprema Corte Americana. Por 9 a 0, a corte deu ganho de causa a The New York Times e revolucionou o direito à liberdade de expressão nos Estados Unidos.
Servidores públicos só podem processar a imprensa se provarem que houve erro intencional ou que não se tentou averiguar a veracidade da reportagem. Caso contrário, mesmo notícias erradas não são passíveis de punição.
O direito à liberdade de expressão protege a sociedade contra possíveis abusos do poder público, que tem a seu dispor os instrumentos de pressão do Estado. Pelo bem da democracia, melhor que pessoas bem-intencionadas possam errar publicamente, desde que de boa-fé. E o ônus da prova cabe a quem acusa.
Anos depois, em 1971, um jovem que trabalhava para o governo americano resolveu divulgar na imprensa documentos sigilosos que revelavam os imensos equívocos dos Estados Unidos na guerra do Vietnã.
O governo entrou com um pedido judicial para censurar o jornal alegando que poderia haver informações que beneficiassem o inimigo.
A Suprema Corte decidiu que a censura era o pior inimigo. Cabia ao governo demonstrar os riscos iminentes da divulgação dos documentos. Não conseguiu.
Mais uma vez, o jornal em litígio era The New York Times.
O papel da imprensa é duvidar e buscar contradições. Sua função, em uma democracia, é a crítica que beira a irresponsabilidade.
Artigos muitas vezes são escritos com base em fontes protegidas pelo sigilo, afinal podem temer retaliações, e espera-se que os editores tenham o bom senso de saber se são confiáveis, afinal reputações podem estar em jogo.
Pois bem, quem define o limite da responsabilidade é o próprio jornal, que apenas pode ser punido caso seja demonstrada malícia intencional.
Somente a sociedade deve determinar se um jornal erra em demasia. A saída é fácil. Basta trocar de jornal.
Qualquer alternativa é pior. Vale lembrar que do outro lado está o Estado e todo o seu poder.
Preocupa quando um novo presidente afirma que vai discriminar um jornal pelas suas reportagens críticas. Cabe à sociedade livre, não ao poder constituído, decidir se um jornal merece ser lido.
Deve-se permitir a ousadia quase irresponsável da imprensa. Por outro lado, espera-se autocontenção do poder eleito. Ambas são essenciais para a democracia.
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