Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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A reinvenção de Lula

Desproporcionalidade na alocação de pastas ministeriais foi a marca dos mandatos do ex-presidente, mas pode mudar

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Lula anunciou que o novo governo não será do PT, mas da aliança de forças que se forjou no segundo turno das eleições. Se essa promessa se concretizar na forma clássica de partilha de poder, equivalerá a uma radical inversão.

Apoiadores do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) festejam na avenida Paulista a vitória no segundo turno na eleição presidencial - Nelson Almeida - 30.out.22/AFP

Ela não se deve apenas ao fato de que o PT é muito menor hoje (68 deputados), à hegemonia da oposição no Congresso ou nos estados mais importantes da federação. Aqui a variável central é o resultado renhido das urnas; o país cindido.

A característica principal das coalizões dos governos Lula, no passado, foi a desproporcionalidade na alocação de pastas ministeriais. A concentração de pastas no PT e os métodos heterodoxos de premiação da fidelidade de parceiros produziram insatisfação e estão por trás do mensalão. Antecipa-se a inversão desse padrão.

Em 2002, Lula alocou 21 ministérios (60% do total) para membros de seu partido, cuja bancada tinha 91 deputados, correspondentes a 18% da Câmara. Com 78 deputados, o PMDB, maior partido da coalizão de governo, ficou com 2 ministérios, de um total de 35. O contraste é marcante quando se considera o governo FHC: o PSDB detinha ainda mais deputados que o PT (99), mas acabou ocupando 26% das 23 pastas, menos da metade que o PT.

A decisão de partilha de poder só ocorreu por default, na 25ª hora; é consistente com o padrão descrito acima. A base do novo governo ainda não está definida, mas algumas sinalizações surpreenderam pela velocidade. É o caso do PP. A polarização destruiu pontes, mas o partido "estendeu a mão" menos de uma hora depois do anúncio do resultado oficial. O que está por trás é o multipartidarismo.

O que me veio de imediato à mente foi Vitor Nunes Leal, que afirmou que, na República Velha, os governadores disputavam o privilégio de colaborar com os presidentes. Agora há muito mais em jogo.

Primeiro, as relações Executivo-Legislativo sofreram grande transformação em duas décadas. E isso ocorreu em detrimento do Poder Executivo. As emendas individuais e de bancada, que o presidente já não controla, perderam importância. Surge o "orçamento secreto", que no passado correspondia a recursos de livre alocação pelos ministérios. (Foi neles que a grossa corrupção se concentrou, mostraram Boas, Hidalgo e Richardson, 2014).

A alocação de pastas ministeriais embutia a partilha de recursos políticos no atacado; o "orçamento secreto", no varejo. Os recursos dos ministérios de "porteira fechada" são hoje pulverizados em projetos localistas, sob controle legislativo centralizado.

Em segundo lugar, os protagonistas do jogo também são vitoriosos e detêm poder de agenda sobre a transição de governo. E continuarão a ser protagonistas no futuro.

Erramos: o texto foi alterado

Por um erro de digitação, versão anterior deste texto dizia disse que o PSDB ocupou 6% das 23 pastas ministeriais no governo FHC; o percentual correto é 26%. O texto foi corrigido.

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