Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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Marcus André Melo
Descrição de chapéu Argentina

Milei e o inédito presidencialismo de coalizão na Argentina

O que levou o país a escolher entre o dito libertário e o peronismo em ruína?

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A única surpresa no segundo turno das eleições presidenciais argentinas foi a margem de vitória entre os candidatos. Foi muito superior ao esperado, o que confere a Javier Milei um mandato claro. Mas ele será minoritário no Congresso, gerando incentivos para que embarque em unilateralismo plebiscitário —o que será provavelmente um dos riscos menores de seu governo.

O presidente eleito da Argentina, Javier Milei, faz em Buenos Aires o discurso da vitória sobre o peronista Sergio Massa - Agustín Marcarian - 19.nov.23/Reuters

No mais, nenhuma surpresa. Já havia antecipado na coluna o malogro histórico do peronismo. Milei ganhou em 21 das 24 províncias: é "o candidato do interior sublevado, do subsolo da pátria", como afirmou o cientista político Andrés Malamud.

O peronismo não é mais o mesmo, o que é boa notícia para Milei. Um dos seus traços marcantes é o vale-tudo institucional, sobretudo através de "piqueteros". Mas seu braço sindical está muito enfraquecido. Vale lembrar o bordão "o peronismo, quando perde eleição, não deixa governar". Aconteceu com o radical Raúl Alfonsín (1983-1989), que deixou a Presidência cinco meses antes de o mandato expirar.

O apoio de Patricia Bullrich e Mauricio Macri no segundo turno já apontava para um inédito presidencialismo de coalizão no país. A primeira eleição ampla com representação proporcional ocorreu em 1963, duas décadas depois da brasileira. E durou pouco tempo. Depois do regime militar (1976-1983), permaneceu a clivagem histórica entre radicais (UCR) e peronistas (PJ).

Após a debacle do último governo radical de De la Rúa (1999-01), o sistema partidário se desnacionalizou, faccionalizou, personificou e fragmentou. O campo não peronista cindiu entre o PROS e a UCR, a qual encolheu. O peronismo, entre facções rivais. O partido de Milei elegeu 14% das cadeiras da Câmara, mas, com o apoio pleno do PROS, de micropartidos provinciais (proibidos no Brasil desde 1946) e de parte da UCR, poderá obter uma maioria.

Terá apoio também de governadores de províncias importantes que continuam cruciais malgrado o fim do colégio eleitoral, em 1994, e da eleição de senadores pelas assembleias legislativas das províncias que controlam. Governadores de províncias pequenas também poderão passar a apoiar o governo.

O caráter minoritário do governo não é, portanto, insuperável; a magnitude do ajuste macroeconômico com custos elevadíssimos, sim. O mais impressionante é que Milei foi eleito com uma proposta política de ajuste ultrarradical e não escamoteou o que faria. Aqui não há estelionato eleitoral. A seu favor: pela primeira vez na história há um sentimento público da necessidade de mudança radical. A chave para o drama argentino é perguntar: o que levou o país a se defrontar com a escolha entre alguém como Milei e o peronismo em ruína?

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