Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Mariliz Pereira Jorge

Coentro da discórdia

Crédito: Antonio Rodrigues/Divulgação Ceviche combina peixe fresco, leche de tigre, cebola-roxa, pimenta dedo-de-moça e coentro
Ceviche combina peixe fresco, leche de tigre, cebola-roxa, pimenta dedo-de-moça e coentro

Decidi ficar fora do Flá-Flu que tomou conta das redes sociais nesta quarta (24), por conta do julgamento de Luiz Inácio Lula da Silva. Pensei, está um dia bom para falar sobre amenidades, só comentarei posts sobre assuntos banais. E de repente me vi numa treta tão desnecessária quanto. De cada lado, argumentos apaixonados e, às vezes, carregados de ódio. No centro da disputa, o coentro.

Poucas coisas no mundo, além do destino do ex-presidente, parecem provocar tanta polarização quanto essa erva tão disseminada nos países do Sudeste Asiático, na América Latina, incluindo o Brasil, especificamente no Nordeste.

É difícil encontrar alguém em cima do muro. "Moqueca sem coentro não é moqueca, é golpe", "os anticoentro não passarão", "coentro é um injustiçado", gritaram de um lado. "Coentro é ficha suja", #foracoentro", "#coentronacadeia", veio como resposta.

A turma que pede a absolvição do coentro diz que não existem provas de que ele tenha gosto de sabão, de que deixe tudo com o mesmo sabor (horrível). Os coentrofóbicos defendem que a erva perca todos os seus direitos nas receitas e seja banido de vez da vida pública.

Todos têm suas razões. Cientistas acreditam que a aversão ao coentro tem fatores genéticos e é hereditário. Essa repulsa está ligada ao olfato, que por causa de uma alteração, deixa o pessoal do #foracoentro mais sensível ao aldeído, presente nas folhas da erva. A intolerância cresce, assim como os argumentos de que apenas com coentro a cozinha seria mais democrática.

A turma do "moqueca sem coentro é fraude" jamais vai aceitar que haja gente que coloque a culpa de tudo no coentro e faz o coro #julgamentojustoaocoentro, além de achar que ele é o salvador de tudo, do feijão, da salada, no peixe, do frango, da sopa, das #comidatudo. Isso sem atentar para as provas apresentadas pela acusação, que mostram que o coentro pode mesmo ser indigesto para muita gente. Assim como falta um pouco de boa vontade dos coentrofóbicos para aceitar que, apesar da ojeriza, a participação do coentro na vida gastronômica do país é considerada legítima por muitos.

Nessa guerra que alimenta tantas paixões, acato o que relatores dos dois lados argumentam. Por via das dúvidas, quando tem moqueca aqui em casa, preparo duas panelas, uma com e uma sem o coentro da discórdia. Ou sirvo a erva separadamente e garanto que todos se sentem à mesa, recuperem o diálogo, exerçam suas preferências num estado democrático de direito e que a gente respeite e acredite nas instituições mesmo quando não concordamos com elas.

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