Martin Wolf

Comentarista-chefe de economia no Financial Times, doutor em economia pela London School of Economics.

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Martin Wolf
Descrição de chapéu Financial Times juros inflação

O futuro das taxas de juros é um enigma

A volta das inflações mudou o mundo, mas o quanto ainda não sabemos

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O retorno da inflação surpreendeu a muitos, inclusive os banqueiros centrais. O mesmo aconteceu com o aumento resultante nas taxas de juros nominais. Essas surpresas trouxeram outras consigo, notadamente um minichoque no setor bancário.

A pergunta, então, é: "E agora?" A inflação cairá para níveis ultrabaixos pré-Covid, ou será um problema persistente, como nos anos 1970 e início dos 1980? E, também, o que acontecerá com as taxas de juros?

Como observa Stephen King, consultor do HSBC, em "Precisamos falar sobre a inflação", muitos foram complacentes demais com a possibilidade de retorno da inflação. Ele observa também que, uma vez que a inflação e, acima de tudo, as expectativas inflacionárias estejam consolidadas, torna-se muito difícil eliminá-las. Chegamos a esse ponto? Ou será que nossas instituições ainda têm bastante credibilidade e a inflação ainda é transitória o suficiente para que possamos voltar a uma inflação baixa com baixo custo?

Fachada do Federal Reserve, o banco central dos EUA - Jonathan Ernst - 31.jul.13/Reuters

Na minha opinião, é mais provável que voltemos à inflação em torno de 2% ao ano, ou talvez um pouco mais. É também o que os mercados esperam: de acordo com o Federal Reserve Bank de Cleveland, a inflação esperada nos Estados Unidos é de 2,1%, quase exatamente em linha com a meta. Isso demonstra confiança de que a meta será entregue. O prêmio de risco de inflação também está estimado em 0,5 ponto percentual, o que está em linha com as valorizações históricas.

Existem dois argumentos (sobrepostos) pelos quais isso pode ser excesso de otimismo. Um deles é que as condições de oferta se tornaram mais inflacionárias. A desglobalização e outros choques reduziram permanentemente a elasticidade da oferta de insumos essenciais. Isso vai aumentar os custos de manter a inflação baixa. O outro é que a economia política de conter a inflação piorou. Assim, o público se preocupa menos com a inflação agora, em parte porque não se lembra de um longo período de alta inflação. Além disso, os governos querem reduzir seu endividamento, que hoje é muito maior do que era há 15 anos, sem conter os déficits fiscais. Finalmente, o gênio da inflação saiu da garrafa. Colocar de volta vai doer.

Continuo não convencido. Obviamente, não há ligação necessária entre oferta e inflação, já que a demanda também importa. Desde que a demanda agregada cresça em linha com a produção potencial e a estrutura da produção seja razoavelmente flexível, as restrições específicas são perfeitamente consistentes com uma inflação geral baixa. Além disso, os responsáveis pela política monetária não vão querer passar à história como os responsáveis pela perda da estabilidade monetária. Por último, mas não menos importante, eles sabem que será muito mais fácil esmagar a inflação agora do que ter que apertar novamente mais tarde.

Suponha que isso esteja correto. Então os componentes da inflação nas taxas de juros nominais não serão aumentados permanentemente. Mas e quanto ao elemento real? As taxas de juros reais caíram durante uma geração, antes de atingir níveis negativos durante a pandemia. Desde então, elas se recuperaram drasticamente. O que acontece agora?

Em sua última Perspectiva Econômica Mundial, o FMI aborda essa questão investigando a "taxa de juros natural", que é definida como "a taxa de juros real que não estimula nem contrai a economia". Essa também é a taxa na qual se esperaria que a inflação permanecesse estável (na ausência de choques). A taxa natural não é diretamente observável. Mas pode ser estimada. A principal conclusão da análise do FMI é que "passado o atual episódio inflacionário, é provável que as taxas de juros voltem aos níveis pré-pandêmicos nas economias avançadas". Após os choques recentes, as taxas reais e nominais cairão para onde estavam em 2019. Em particular, espera-se que o efeito do envelhecimento adicional da população seja modesto, assim como o efeito (oposto) da dívida pública mais alta.

Em março, dois importantes macroeconomistas, Olivier Blanchard e Lawrence Summers, debateram essa questão em detalhe para o Instituto Peterson para Economia Internacional. Dos dois, Blanchard foi o que mais se aproximou da posição do FMI. Summers, que relançou a ideia de "estagnação secular" no debate político em 2015, agora mudou de ideia, argumentando que as taxas serão significativamente mais altas do que no passado recente.

A diferença não é grande. Blanchard argumenta que as taxas de juros reais permanecerão abaixo da taxa real de crescimento econômico, o que é crucial para a sustentabilidade da dívida. Ele não sugere que elas retornarão a níveis negativos. Summers acha que serão um pouco mais altas do que a estimativa do Fed de uma taxa natural de 0,5%. Uma razão pela qual as taxas reais serão mais altas do que antes, eles concordam, é o maior investimento na transição energética. Outra é a necessidade de gastar mais em defesa. A dívida pública mais alta também pode aumentar as taxas reais, embora a inflação esteja corroendo a dívida.

Os dois discordam, no entanto, sobre se a demanda persistente reflete fatores temporários (relacionados à Covid) ou tem força mais duradoura. Eles discordam sobre até que ponto a aversão ao risco manterá baixos os rendimentos de ativos seguros. Eles discordam sobre se o envelhecimento da população aumentará ainda mais a poupança. E também discordam sobre o provável impacto da dívida pública nas taxas de juros. Em todos esses aspectos, Blanchard assume uma posição que justifica taxas naturais mais baixas, e Summers uma que justifica o contrário. Sua posição é próxima da adotada por Charles Goodhart e Manoj Pradhan.

Assim, suponha que a inflação caia para 2% a 3%. Suponha, também, uma taxa de juros real de equilíbrio de 0 a 2%. Então as taxas de curto prazo nominais seriam de 2% a 5% e, dados os prêmios de risco, as taxas de longo prazo seriam de 3% a 6%. Na extremidade inferior, a sustentabilidade da dívida seria simples. Na extremidade superior, seria um desafio. Esse intervalo de incerteza é grande. No entanto, a realidade ainda poderá ser diferente.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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