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Descrição de chapéu Congresso Nacional indígenas

Raoni diz ao papa Francisco que Congresso brasileiro não ouve palavra da Igreja sobre indígenas

Cacique se reuniu com o pontífice nesta quinta (16), em Roma

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O cacique Raoni Metuktire, uma das mais importantes lideranças indígenas do mundo, entregou ao papa Francisco nesta quinta-feira (16) uma carta em que faz um apelo para que as preocupações do pontífice relacionadas à crise climática e aos povos indígenas sejam transmitidas a parlamentares do Congresso Nacional brasileiro.

Raoni foi a Roma, na Itália, participar da Cúpula do Clima das Pontifícias Academias de Ciências e de Ciências Sociais. O documento entregue por ele a Francisco afirma que, embora os povos originários tenham um papel importante para a conservação e recuperação de recursos naturais, eles não costumam ser ouvidos e ainda são alvos de ofensivas que atentam contra os seus direitos.

O cacique Raoni Metuktire e o papa Francisco nesta quinta-feira (16), em Roma. Foto: Divulgação - Divulgação

A carta diz que o Parlamento brasileiro "tem desafiado até os julgamentos do Supremo Tribunal Federal", citando o embate em torno do marco temporal. A lei que trata do tema foi promulgada no ano passado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em resposta à decisão do STF que julgou a tese inconstitucional.

"Viemos para rogar que Vossa Santidade continue nos ajudando ao fazer com que a palavra da Igreja Católica, o chamado da Encíclica Laudato Sí e da Pastoral da Amazônia [que versam sobre a crise ambiental e o papel dos povos indígenas] cheguem aos membros de nosso Congresso, que aparentemente não receberam ou compreenderam devidamente, até hoje, tal solene e alertadora mensagem", diz a carta.

"Essa ofensiva explícita e sem precedentes contra os povos indígenas encoraja também invasores, que geram prejuízos irreversíveis, tais como é o caso do garimpo ilegal de ouro e outros minerais, que envenena nossos rios e nossa comida", afirma ainda.

Além de Raoni, o documento é assinado pelo cacique Almir Narayamoga Suruí, da região da Amazônia ocidental, e pelo diretor da Associação Hutukara, Maurício Ye’kwana, que representa os povos Yanomami e Ye’kwana do norte da Amazônia.

A carta afirma que o país tem enfrentado "catástrofes climáticas sem precedentes", a exemplo das enchentes que assolam o estado do Rio Grande do Sul e da seca histórica que fustigou o Norte brasileiro no ano passado, e diz haver uma expectativa cada vez maior em torno da atuação dos povos originários.

"Um paradoxo caracteriza a situação dos povos indígenas: de um lado, somos os mais imediatamente vulneráveis aos impactos de mudanças climáticas e da perda de biodiversidade. Do outro, aumenta expressivamente nossa responsabilidade pela conservação e recuperação de bens essenciais para o bem-estar de toda a humanidade, assim como a expectativa para que desempenhemos referido papel", diz.

Leia, abaixo, a íntegra da carta entregue por Raoni ao papa Francisco:

"Sua Santidade,

ao longo de seu Pontificado, a Igreja Católica se manifestou com explícitas força e clareza sobre a crise ambiental e o papel dos povos indígenas, em documentos como os da Encíclica Laudato Sí e da Pastoral da Amazônia.

Nos últimos meses, o Brasil viveu duas catástrofes climáticas sem precedentes: antes, a inédita seca que assolou o Norte do País, agora as trágicas enchentes que vitimaram a população do Sul.

Um paradoxo caracteriza a situação dos povos indígenas: de um lado, somos os mais imediatamente vulneráveis aos impactos de mudanças climáticas e da perda de biodiversidade. Do outro, aumenta expressivamente nossa responsabilidade pela conservação e recuperação de bens essenciais para o bem-estar de toda a Humanidade, assim como a expectativa para que desempenhemos referido papel.

No âmbito internacional, ao mesmo tempo em que fica claro nosso papel de gestores de enormes recursos ambientais, os programas que visam abordar a mitigação e a adaptação em relação à crise global têm chegado de forma inexpressiva aos territórios que gerenciamos e manejamos. E muitas vezes nem somos ouvidos sobre o que é necessário para viabilizar o que se espera de nós.

Já dentro do Brasil, também de forma paradoxal, estamos assistindo a uma ostensiva tentativa de reverter nossos direitos garantidos pela Constituição. O atual Congresso tem desafiado até os julgamentos do Supremo Tribunal Federal, no caso do chamado Marco Temporal e de outras normas que buscam impedir que o próprio governo possa executar suas obrigações para o cumprimento da Constituição.

Essa ofensiva explícita e sem precedentes contra os povos indígenas encoraja também invasores que geram prejuízos irreversíveis, tais como é o caso do garimpo ilegal de ouro e outros minerais, que envenena nossos rios e nossa comida. Vossa Santidade já manifestou preocupação – ao receber recentemente o cacique Davi Yanomami – sobre as nefastas consequências dessa prática.

É por isso que –na oportunidade da Cúpula do Clima das Pontifícias Academias de Ciências e de Ciências Sociais– viemos para rogar que Vossa Santidade continue nos ajudando, ao fazer com que a palavra da Igreja Católica, o chamado da Encíclica Laudato Sí e da Pastoral da Amazônia, cheguem aos membros de nosso Congresso que aparentemente não receberam ou compreenderam devidamente, até hoje, tal solene e alertadora mensagem.

Em nome dos nossos povos –que habitam e preservam territórios de centenas de milhares de quilômetros quadrados nos estados de Roraima, Amazonas, Rondônia, Pará e Mato Grosso– assim como de todos os parentes dos povos indígenas do Brasil e da bacia amazônica, gostaríamos de saudar e cumprimentar Vossa Santidade, ao transmitir-lhe votos de força e confiança.

Cacique Raoni Metuktire, povo Kayapó (região do Xingu, Amazônia Sul-oriental)

Cacique Almir Narayamoga Suruí (Amazônia Ocidental)

Maurício Ye’kwana, diretor da Associação Hutukara, dos povos Yanomami e Ye’kwana (Norte da Amazônia)"


LENTES

O fotógrafo Sebastião Salgado e sua mulher, a curadora Lélia Wanick Salgado, compareceram à abertura da exposição "Maio Fotografia" no MIS (Museu da Imagem e do Som), em São Paulo, na semana passada. A atriz Mariana Ximenes passou por lá.

com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH

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