Nabil Bonduki

Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, foi relator do Plano Diretor e Secretário de Cultura de São Paulo.

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Nabil Bonduki
Descrição de chapéu Mobilidade

Quantos apoiadores de Bolsonaro irão à Paulista no 7 de Setembro?

Máquina de propaganda bolsonarista tentará superestimar a presença de apoiadores

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Fará parte da narrativa pós-7 de Setembro a guerra de números a ser difundida pela máquina de propaganda bolsonarista para superestimar a presença de apoiadores aos atos programados, sobretudo para Brasília e São Paulo, onde o presidente estará presente.

O objetivo dos atos é demonstrar força. Como afirmou Celso Rocha de Barros, é a manifestação fascista que passou mais tempo sendo planejada, com apoio de políticos, prefeitos, pastores, caminhoneiros e líderes do agronegócio bolsonaristas. Logo, propalar grandes números, ainda que falsos, é essencial nessa estratégia.

O número de participantes que prevalecer será um indicador da avaliação do apoio popular que o presidente ainda consegue mobilizar para sua aventura autoritária e/ou reeleitoral. Com ele, pretendem alimentar sua legião de seguidores e manter apoio político.

Antes dessa guerra de números ocorrer, vamos falar de métodos científicos, coisa que os bolsonaristas e os terraplanistas odeiam, para fazer essa estimativa de modo objetivo e relativizar os números fake que certamente serão divulgados.

Isso é particularmente importante considerando que os dados divulgados pelas Polícias Militares, que têm sido utilizados frequentemente como a principal fonte de informação para estimar a adesão aos atos políticos, são desprovidos de consistente método científico.

Isso é preocupante quando se sabe que as PM estão repletas de apoiadores do presidente e que, via de regra, estimam participantes em manifestações, maximizando ou minimizando a presença popular, de acordo com os interesses da corporação.

Calcular o número de pessoas presentes em manifestações em espaços públicos não é uma tarefa simples, mas pode ser feita de maneira objetiva utilizando técnicas baseadas em aerofotogrametria e georreferenciamento, combinadas com pesquisa em campo.

O Datafolha prestou um excelente serviço quando desenvolveu em 2015 uma metodologia científica para calcular o número de presentes nas manifestações pelo impeachment da ex-presidenta Dilma, que mostraram uma assombrosa disparidade com as estimativas que vinham sendo difundidas.

No ato de 13 de março de 2016, enquanto o Vem para a Rua, um dos organizadores, anunciava 2,5 milhões de participantes e a PM calculava 1,4 milhões, o Datafolha estimou, baseado nessa metodologia, a presença de 0,5 milhão de pessoas, número que estava mais próximo da realidade desse que foi o maior ato político, em número de participantes, da história de São Paulo.

O método desenvolvido pelo Datafolha considera a área da manifestação, calculada a partir de georreferenciamento, excluindo mobiliário urbano e outros obstáculos; a densidade (número de participantes por metro quadrado) em cada subsetor ocupado, verificada in loco; e a hora de chegada ao ato, levantada a partir da aplicação de um questionário em uma amostra dos participantes, permite calcular o número de "entrantes" a cada hora e o número total de pessoas presente.

O cálculo da densidade por subsetores é essencial. Como afirmou Mauro Paulino, diretor do Datafolha, esse aspecto é decisivo para o cálculo do público porque a ocupação varia muito em cada trecho da manifestação.

Não se pode, simplesmente, considerar um número fixo, por exemplo, cinco pessoas por metro quadrado, como faz a PM, e multiplicá-lo pela área total da manifestação, calculado por uma visão aérea que desconsidera que nem todo o espaço pode ser ocupado por pessoas.

Herbert Jacobs, professor da Universidade da Califórnia, modernizou a estimativa de pessoas em multidões. Ele criou uma regra básica de densidade, que vai de um multidão "pouco densa" a um multidão "muito densa", como em um ônibus lotado.

Segundo o método Jacobs, como é conhecido, uma multidão pouco densa tem, por metro quadrado, uma pessoa, densa tem três pessoas e muito densa tem cinco pessoas, quando a mobilidade é muito prejudicada. Já sete pessoas ou mais por metro quadrado é uma “lata de sardinha”, como um ônibus, trem ou metrô superlotado onde as pessoas ficam espremidas.

A aplicação desse método alterou completamente as estimativas de público em atos públicos e eventos culturais, cujos números têm sido inflados escandalosamente pelos seus promotores.

Por exemplo, tornou-se absurdo falar em 4 milhões de pessoas na Parada LBGT, como seus promotores propalavam, pois mesmo que a Avenida Paulista e a Consolação estivessem totalmente superlotadas, de calçada a calçada, com cinco pessoas por metro quadrado (o que não permitiria o deslocamento), o público não superaria 1,5 milhão de participantes.

Os manifestantes no ato pelas Diretas no Vale do Anhangabaú, que, por décadas, foi avaliado no número mágico de 1 milhão de participantes, foi recalculado, segundo essa metodologia, em 240 mil.

A Avenida Paulista em todos os seus 2,6 km de extensão, da Praça do Ciclista até a Praça Osvaldo Cruz, tem cerca de 125 mil metros quadrados ocupáveis pelos manifestantes. Para alcançar os 500 mil manifestantes presentes no maior ato da história de São Paulo, ela precisaria estar inteiramente e densamente ocupada. Cada quarteirão, se estiver denso com três pessoas por metro quadrado, comportaria cerca de 20 mil pessoas.

Fiquem com isso na cabeça quando os promotores do ato bolsonarista anunciarem seus números do ato do dia 7 de Setembro.

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