Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa

Controle de curva de juro

Ao empinar a curva, o mercado pode anular o efeito expansionista da queda da Selic

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Em tempos normais, o Copom fixa a taxa de juro de curto prazo, e o mercado determina a taxa de juro de longo prazo.

Considerando os títulos do governo, a taxa de longo prazo é uma média ponderada das taxas de curto prazo esperadas para o cada período (um ano, dois anos etc.), mais um prêmio de risco.

A média é calculada em termos geométricos, mas podemos simplificar isso usando logaritmo (fique comigo mais algumas linhas).

Por exemplo, suponha que a Selic seja de 3% em log neste ano e a expectativa de mercado seja Selic de 2% em log para o próximo ano. Nesse caso, se o investidor não se importa com risco, a taxa de juro de dois anos deve ser de 2,5% em log.

Traduzindo do economês, ao analisar uma aplicação de dois anos, o retorno esperado de comprar e carregar um título de dois anos deve ser igual a comprar um título de um ano e reaplicar o dinheiro, dentro de 12 meses, em outro título de um ano.

Dado que a maioria dos agentes é avessa ao risco, o título de dois anos acaba pagando mais do que 2,5%, e nós, economistas, chamamos isso de prêmio de risco. A curva de juro é a relação entre taxa de juro e o prazo da aplicação.

Quando o BC reduz a Selic, a taxa curta cai, mas a taxa longa pode subir se o mercado achar que o BC terá que compensar o juro mais baixo de hoje com juro mais alto no futuro. A taxa longa também pode subir se o mercado achar que o futuro ficou mais incerto e, portanto, quiser mais prêmio de risco.

O que aconteceu no Brasil? O BC cortou a Selic e deve repetir a dose dentro de algumas semanas. Diante disso, a taxa de juro de curto prazo caiu, mas a resposta inicial do mercado foi elevar as taxas de juro de longo prazo.

Pode ser que o mercado ache que o BC voltará a subir a Selic dentro de um ano. Mas também pode ser que o risco-país tenha subido muito devido à incerteza política e fiscal associada ao governo Bolsonaro.

Seja qual for o motivo, o custo de crédito para empresas, famílias e governo é mais influenciado pela taxa longa do que pela taxa curta de juro. Assim, ao “empinar a curva”, o mercado pode anular o efeito expansionista da queda da Selic.

Para evitar volatilidade excessiva das taxas longas de juro, o BC pode intervir no mercado de títulos públicos, o que nós, economistas, chamamos de “controle de curva”.

No contexto atual, a ação seria de compra. O BC poderia fazer leilões de compra de títulos públicos de longo prazo, aumentando o seu preço e reduzindo a taxa de juro correspondente.

Intervenção nas taxas de juro de longo prazo é, sem dúvida, uma medida heterodoxa. Ela tende a ser adotada somente em condições excepcionais, como fizeram os EUA e o Japão após a crise de 2008.

Mais recentemente, o banco central da Austrália aderiu à heterodoxia e anunciou que manterá a taxa de juro de um dia a três anos em 0,25%. Em outras palavras, o BC australiano disse que “paga o que for” por títulos de renda fixa para segurar a taxa de juro de até três anos em 0,25%.

Como seria no Brasil? Assim como lá fora, podemos intervir nas taxas longas, sobretudo agora que a “PEC do Orçamento de Guerra” diminuiu a incerteza jurídica para o BC comprar e carregar títulos públicos até o vencimento. Se isso vai ou não acontecer, depende do mercado e do BC.

Por enquanto, as taxas de juro longo subiram, mas no horizonte de até cinco anos elas ainda estão mais baixas do que no fim de 2019. A expectativa de recessão é tão grave, e a de inflação, tão baixa, que isso mais do que compensou a elevação do risco fiscal e político nos próximos cinco anos.

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