Nosso estranho amor

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Nosso estranho amor
Descrição de chapéu Relacionamentos LGBTQIA+

Enrico estava sem paciência para homens, e aí conheceu Isa

Levando uma vida sem rótulos, o menino que sempre gostou de meninos se apaixonou por uma menina

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São Paulo

Desde criança, "tipo muito pequeninho mesmo", Enrico Fernandes, 26, compreendia-se como gay. Até rolava de dar bitocas nas amigas de vez em quando. Só que mais por esporte mesmo, sem nenhuma segunda intenção, ele conta.

Lá pelos 15 anos, começaram os encontros com homens. "Beijava meninas se me pedissem ou se eu estivesse naquela fúria hormonal e realmente não tivesse encontrado um boy."

Mas ele acha que a mulherada vai entender quando diz: gostar de macho não é fácil. "Fui tocando minha vida ficando com homens, que eram, afinal, o meu público-alvo. Só que, meu... Homem é uma coisa, né? Nossa. Não tenho muita paciência."

(A gente te entende, Enrico!)

Pés de casa para fora do edredom, na cama
stock.adobe.com

E foi ficando cada vez mais claro na sua cabeça: tesão é uma coisa, dividir a vida com outro homem "é outra totalmente diferente". Se fosse para resumir num tuíte, Enrico diz, seria este: "Total desisti de homem mesmo, kkkkkk".

Por que não sair com mulheres então? Ao contrário de outros amigos gays, o corpo feminino nunca lhe provocou aversão. E Enrico sempre preferiu a companhia delas. Suas amizades mais próximas eram sempre com mulheres.

Fez sentido para ele. "Só tive experiência tranqueira saindo com homem. Saí com boy de todo tipo, e poucos me fizeram de fato querer elevar o nível da relação além do ‘pente-rala’, perdoe-me o modo de colocar assim", diz, evocando o código nas ruas para sexo casual.

Conheceu Isa, 24, no Twitter. Tinham vários amigos em comum, e gostos idem. Os dois, aliás, eram fãs da Charli XCX, britânica que se apresentaria no Cultura Inglesa Festival 2017. Deram o primeiro beijo naquele dia.

A bem da verdade, Enrico já tinha Isa em mente fazia um tempinho. Havia terminado um namoro com um rapaz meses antes. Duas semanas depois, mandou mensagens "com segundas, terceiras e demais intenções" para a jovem que até ali só trombava virtualmente, e já sabia que achava gata.

No começo a geografia não colaborou. Ela morava em Santos, ele, em São Paulo. O segundo date demorou três meses para acontecer. Isa descobriu que o Secreto, um bar na zona oeste paulistana que amava, ia fechar. Combinaram então de curtir a balada derradeira e passar a noite juntos.

Dali em diante a coisa engrenou. "Eu resolvi dar uma chance de me relacionar mais profundamente com ela, que é alguém que eu sempre achei muito atraente", diz Enrico.

Pegaram muita estrada para superar a distância física. Dançaram techno à beça, passearam no parque Ibirapuera, esticaram domingos no Sesc Pompeia, dividiram muitos risotos. Quando era ele quem ia ao encontro dela no litoral, levava sempre um chocolatinho Trento Massimo.

Enrico começou a ensaiar um pedido de namoro no show da Lana Del Rey no Lollapalooza de 2018. A coragem chegou três meses depois, na esquina do Dia dos Namorados. Sem pressão, claro.

"Estávamos passando o final de semana na minha casa, 9 e 10 de junho. Então imagine, ‘love is in the air everywhere you look around’. Ficamos de casalsito pra cima e pra baixo, declarações pra lá e pra cá, um enjoo que só."

Chegou a temida segunda-feira, dia 11. Ela precisava voltar para Santos. "Aí rolou um tchau um pouco mais pesaroso no metrô." Ninguém queria largar a mão de ninguém. Isa acabou indo, e Enrico ficou com a cara inchada de tanto chorar.

Aí já era: ele sacou que não tinha mais jeito, óbvio que eram um casal, só faltava oficializar. Pois bem. "À meia-noite do dia 12, mandei pra ela: "Você quer ganhar um namorado de Dia dos Namorados?’"

Temeu um "não feroz", ganhou um sim retumbante. Estão nessa há cinco anos, agora morando juntos em Santos com dois gatos pretos: Lilith, a mais velha, classuda e graciosa, e Balerion, o mais novo, comedor de lixo e lindo de morrer.

Enrico sabe que sua história de amor pode alimentar ideias erradas. Mas já se adianta: o caso dele não tem nada a ver com essa falsa premissa da cura gay. "De forma alguma esse foi o motivo pelo qual parei de ficar com homens. Isso nunca me foi um problema e não é hoje que será."

Inclusive, se um dia ele e Isa terminassem, tem certeza que os homens entrariam de novo em seu radar.

A questão, para Enrico, é não se prender a rótulos. Ser gay ou hétero, isso ou aquilo. Seu plano hoje é apenas este: envelhecer com quem lhe faz bem. Isa. "Eu a amo e quero ficar com ela. Não tem jeito."

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