Pablo Ortellado

Professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.

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Pablo Ortellado

Para Bolsonaro, unir o país é derrotar a dissidência

Capitão reformado tem repetido que será o 'presidente de todos' e que 'pacificará o país'

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Bolsonaro tem falado bastante sobre o fim das divisões. Ele atribui a gênese da dinâmica divisiva que tomou a sociedade brasileira à ação dos adversários e se coloca como aquele que poderia enfim unificar o país. 

Mas ao contrário do que pode parecer, a união que propõe não é a da reconciliação, mas a do seu triunfo sobre a ruína dos derrotados. Nada esclarece melhor essa postura do que seu elogio à figura de Duque de Caxias, patrono do Exército brasileiro. 

Caxias ganhou o epíteto de “o pacificador” por reprimir e derrotar uma série de revoltas durante o período do Segundo Reinado, como a Balaiada, no Maranhão e a Revolução Farroupilha, no Rio Grande do Sul —o nome do seu título, aliás, foi escolha própria, homenageando a violenta retomada da cidade de Caxias, último bastião dos rebeldes maranhenses.

Por isso, não é surpresa que, em sucessivas declarações dizendo que será “o presidente de todos” e que vai “pacificar o Brasil”, ele não esteja com isso adotando uma postura republicana visando cicatrizar as feridas da campanha eleitoral e se colocar como presidente tanto dos que votaram como dos que não votaram nele. 

As divisões, para Bolsonaro, são uma fabricação artificial dos petistas e outros esquerdistas que desuniram o Brasil fomentando a luta de classe e criando políticas de cotas raciais e de gênero. 

O que ele não parece perceber, porém, é que a grande divisão do país hoje é entre os ativistas conservadores que conduziram a sua campanha e os ativistas de esquerda. É essa divisão explorando identidades políticas que contamina a esfera pública e inviabiliza o debate e o compromisso.

No seu discurso de posse, após afirmar querer construir uma sociedade “sem divisão”,  Bolsonaro concluiu que isso se traduziria em fazer escolas que preparem para o mercado de trabalho e não para a militância política, em permitir que cidadãos não sejam vitimados pelo crime e em ajudar as pessoas a conquistarem o bem-estar econômico por meio do trabalho (e não de políticas sociais). 

Ora, a liberdade de cátedra dos professores, o respeito aos direitos humanos e o papel das políticas sociais são precisamente os temas que dividem o país. 

Ao polemizar permanente sobres esses assuntos e manter aceso o espírito belicoso da campanha, Bolsonaro não sinaliza a união, mas a divisão estrutural e permanente.

O que ele parece querer, no fundo, é esmagar os que acredita terem fabricado distinções de classe, de raça e de gênero, pacificando e reunindo o país sob os escombros dos vencidos —mais ou menos como fez o duque nos tempos de dom Pedro.

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