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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Descrição de chapéu Banco Central

Empresários criticam falas de Lula sobre BC e defendem Campos Neto

Declarações do presidente geram efeito contrário ao que presidente deveria buscar, afirmam

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São Paulo

A escalada das críticas que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem fazendo ao Banco Central aumentou o desconforto no setor privado. Incomodados com as falas do presidente, empresários defendem o chefe da autarquia, Roberto Campos Neto, e alertam que a retórica tem provocado um efeito inverso ao que deveria ser o intuito de Lula, com piora nas expectativas de inflação e pressão sobre os juros.

Nesta segunda (6), Lula voltou a criticar a atuação da autoridade monetária e disse que o atual patamar da Selic em 13,75% ao ano é uma vergonha.

Flavio Rocha, dono da Riachuelo, diz que vê projeto eleitoral e defende contenção de gasto público. "O que pressiona o juro para cima é a perspectiva que o mercado está tendo de forte crescimento do gasto público. Acabar com a independência do Banco Central, explodir o gasto público e colocar o BC subordinado ao governo federal é simplesmente quebrar o termômetro. Tem duas maneiras de curar a febre: descobrir a causa e recomendar o antibiótico correto ou quebrar o termômetro, o que significa deixar de ver os sintomas. Você tem que atacar os sintomas, não quebrar o termômetro", diz o empresário.

Lula está com a cabeça erguida, olhando para cima. Ele usa um terno preto com gravata vermelha.
O presidente Lula durante cerimônia de posse de Aloizio Mercadante para a presidência do BNDES, no Teatro do BNDES, no Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli - 6.fev.23/Folhapress

O banqueiro Ricardo Lacerda, do BR Partners, também critica. "É lamentável ver o chefe do Executivo atacando a independência do Banco Central, uma conquista da sociedade. A política monetária é mero reflexo da irresponsabilidade fiscal em que o país mergulhou. Roberto Campos é nosso último bastião contra a insanidade de políticas econômicas", diz ele.

Na semana passada, Lula se referiu a Campos Neto como "esse cidadão" e disse que vai esperar acabar o atual mandato no BC (que vai até o fim de 2024) para reavaliar o Banco Central independente.

O investidor Lawrence Pih afirma que os sinais que Lula vem emitindo contra a independência do BC e o patamar dos juros preocupam porque, na gestão Dilma Rousseff, com Alexandre Tombini na presidência da autarquia, a Selic foi pressionada para baixo até o patamar de 7,25%, mas depois teve de subir para 14,25% enquanto a alta dos preços não cedia.

"Imagine se nos últimos seis meses, antes de uma eleição com Bolsonaro na Presidência, não temos um BC independente. Para onde iria a Selic? Zero? A meta do BC é cumprir a meta de inflação, não tem mandato para fazer a economia crescer", diz ele.

"Todo governo gostaria de ter recursos ilimitados e juros baixos para fazer a economia crescer, o problema é a inflação. Sem um BC independente, não há freio. Os agentes econômicos são racionais, agem de acordo com a lógica econômica e podem agir em direção contrária ao desejado pelo governo. Vimos recentemente a queda dos preços dos ativos, das Bolsas, do real e a alta dos juros. Tudo isso prejudica a economia. O mercado é composto de todos os agentes econômicos, inclusive o estado em todos níveis de governo", afirma Pih.

A ex-presidente do BNDES Maria Silvia Bastos Marques afirma que vê as falas de Lula com preocupação. "Infelizmente, essas declarações vão exatamente no sentido oposto do que ele deseja, que é a redução da taxa de juros, da inflação, a volta do crescimento, que vai beneficiar a todos, especialmente os mais pobres", afirma.

Sobre a independência do BC, a executiva também relembra a gestão Tombini nos anos Dilma. Nas abordagens sobre o Banco Central, Lula costuma dizer que, em seus governos anteriores, Henrique Meirelles não era menos independente do que Campos Neto é hoje.

Maria Silvia ressalva que, no governo Dilma, o BC era visto exatamente como não independente. "Em 2015, tivemos a maior taxa de juros recente. Foi 14,25%, a inflação chegando a 11%, uma desancoragem das expectativas, exatamente porque o BC era visto como não independente. Isso foi uma das razões pelas quais se fortaleceu o debate da autonomia. O Brasil passou por uma recessão profunda entre 2015 e 2017, e tudo isso foi gestado por esse desajuste macroeconômico, essa desancoragem das expectativas de inflação. Quando ele fala, por exemplo, que vamos mudar a meta de inflação, quando nós não temos um novo marco fiscal que ancore as expectativas e as projeções de inflação e de resultado de dívida/PIB, isso é mais combustível", diz ela.

Alexandre Ostrowiecki, dono da Multilaser, também vê a autonomia do BC como conquista a ser preservada. "É uma conquista histórica brasileira, que ajuda a dar credibilidade para que investidores confiem na nossa economia. Certamente, essa autonomia não resolve tudo, mas ajuda a aliviar um pouco nosso crônico problema de déficits fiscais. Se houver retrocesso nesse campo, poderemos esperar um desequilíbrio maior ainda, com descontrole inflacionário, fuga de investimentos e maior desemprego", afirma o empresário.

Para o ex-banqueiro João Amoêdo, o Brasil poderia estar com a taxa de juros mais baixa, se não fossem os comentários do petista para atrapalhar. "Cada vez que Lula faz uma declaração como esta [reavaliar autonomia do BC], ele aumenta a instabilidade, o risco institucional e o resultado é o aumento de juros", escreveu Amoêdo em rede social.

Joana Cunha com Paulo Ricardo Martins e Diego Felix

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