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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Se é para discutir meta de inflação, que seja logo, diz ex-diretor do BC

Para Luiz Fernando Figueiredo, assunto tomou dimensão muito grande e espera é contraproducente

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São Paulo

O conflito de Lula contra o Banco Central deve perder temperatura nos próximos dias, segundo as previsões de Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do Banco Central e presidente do conselho da Jive Investments.

Ele avalia que os sinais dados pelos ministros Fernando Haddad, Simone Tebet e Alexandre Padilha tenham ajudado a acalmar os ânimos, mas a crise já deixou impactos.

Diante do ponto a que se chegou, Figueiredo defende que se antecipe o debate sobre revisão da meta de inflação. "Essa discussão tomou um calor e uma dimensão muito grande. Eu acho que esperar até junho é contraproducente. Se é para discutir, se discute já e se define já", diz.

O economista Luiz Fernando Figueiredo, presidente do Conselho de Administração da Jive Investments e ex-diretor do Banco Central
O economista Luiz Fernando Figueiredo, presidente do Conselho de Administração da Jive Investments e ex-diretor do Banco Central - Divulgação

Qual foi o saldo dessa escalada retórica de Lula contra o BC durante a semana? O saldo foi uma elevação das expectativas de inflação, o que torna muito mais difícil o trabalho do Banco Central e joga para a frente a possibilidade de queda das taxas de juros.

Para dar uma ideia, antes da discussão sobre responsabilidade fiscal e Banco Central, o mercado já previa uma queda de juros entre abril e maio, ou seja, daqui a dois meses. Só que isso tudo mudou, porque as expectativas subiram muito. Então, o saldo é uma queda na confiança, receio e expectativas de inflação mais alta e, muito provavelmente, uma taxa de juros mais alta.

A fervura deve baixar nas próximas semanas? A minha impressão é que deve baixar. Houve um aceno do Banco Central, do próprio Roberto Campos na ata, dizendo que o ajuste fiscal ajuda a reduzir inflação.

Houve uma conversa dele com a ministra Simone Tebet. O Haddad reconheceu que a ata foi mais simpática. Acho que há uma tentativa por parte de Haddad, Simone Tebet, Alexandre Padilha de convergir e baixar essa temperatura. Acho que do lado do Roberto Campos, a mesma coisa. Vamos ver se se constrói uma ponte para acalmar, mas vai depender da postura do próprio presidente.

Se o resultado econômico das falas de Lula é tão ruim, qual seria, na sua opinião, o objetivo político? É muito difícil dizer. Existe uma rejeição a tudo o que foi feito pelo governo anterior, em vários assuntos, no trato dos bancos públicos, das empresas públicas, reforma trabalhista, até na da Previdência se falou, lei das estatais e por aí vai.

Nessa mesma linha, por mais que tenha sido algo feito pelo Congresso, ou seja, o Banco Central se tornou formalmente independente pela aprovação no Congresso, o Roberto Campos veio do governo anterior. Então, é mais uma rejeição ao que vem do governo anterior, mesmo que o Banco Central tenha se tornado um organismo de Estado e não mais de governo. Quando ele adquiriu a independência, ele se tornou uma entidade como Judiciário, Forças Armadas.

E a ideia de antecipar revisão de meta de inflação teria qual efeito? O processo normal é que na reunião do conselho monetário de junho se discute a meta dois anos à frente. Agora, essa discussão tomou um calor e uma dimensão muito grande.

Eu acho que esperar até junho é contraproducente. Se é para discutir, se discute já e se define já. Por que esperar até junho? Os agentes todos vão ficar com receio do que vem pela frente por mais três ou quatro meses. Como essa discussão chegou ao grau que chegou, acho que ela tem de ser discutida já. Se define e pronto.

Se isso acontecer, então talvez ele tenha atingido algum objetivo prático de influência sobre o Banco Central? Talvez sim. Agora, vamos lembrar que no formato que temos no Brasil, o Banco Central cumpre o que foi definido pelo conselho monetário. Então, se o conselho monetário decide uma inflação de 5%, o Banco Central vai perseguir isso. O que ele tem é independência para perseguir uma meta definida pelo conselho monetário do qual o Banco Central é um de três votos.

Questionamento e pressão sempre teve de todos os lados? Como lidar com isso? O modelo de Banco Central independente formalmente é o modelo seguido por todos os países razoáveis no mundo, tando de primeiro mundo como emergentes. Esse é um arcabouço que dá liberdade para eles fazerem o que quiserem, apesar dessa ou daquela pressão.

No meu período no Banco Central, o Fernando Henrique nos deu total liberdade. Nem ele nem o ministro Malan falavam sobre política monetária em nenhum momento. Agora, essa foi uma liberdade que foi dada, ou seja, em qualquer momento poderia ser retirada.

Por exemplo, vamos imaginar essa mesma discussão sem ter o Banco Central independente, ou seja, questionamentos da meta, da taxa de juros. Hoje, está em 13,5%. Ia estar em 16% ou 17%. O custo de rolagem da dívida subiu, mas teria subido duas ou três vezes mais.

O que está se falando publicamente só não está sendo seguido por causa da formalização da independência do Banco Central. Há alguns anos, eu escrevi um artigo sobre isso em que eu chamava de Lei de Responsabilidade Monetária. A política vai para um lado ou outro, tem interesses, mas essa decisão tem que ser técnica. Não quer dizer que o Banco Central acerte todas as vezes, mas ao longo do tempo ele vai acertando mais do que errando.


Raio-X

Presidente do conselho de administração da Jive Investments e ex-diretor do Banco Central (1999-2003), o economista trabalhou em instituições como Banco BBA, Banco Nacional e JP Morgan. Foi sócio-fundador da Mauá Capital e um dos fundadores da Gávea Investimentos.

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