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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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CVM investiga empresa que negocia meio bilhão para Temer e parceiros no acidente de Mariana

Autarquia diz que M4 não tem registro para fazer captação dos chamados ativos judiciais; causa renderia R$ 1 bilhão para advogados

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Brasília

A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) investiga a M4, empresa que busca no mercado interessados em comprar cotas de um fundo que pretende levantar R$ 480 milhões para antecipar honorários advocatícios de um processo sobre o acidente de Mariana (MG) a dois escritórios, um deles do ex-presidente Michel Temer.

A M4 não tem registro para operar no mercado, o que motivou a apuração do órgão regulador. Por meio de sua assessoria, a CVM confirmou a existência do processo.

O ex-presidente Michel Temer durante palestra em evento - 03.fev.2023-Rodrigo Antunes/Reuters

No prospecto do investimento enviado a potenciais interessados, a empresa afirma que Temer e a CBM Advogados são patronos de uma ação civil pública e cedentes do ativo —uma causa reparatória de R$ 120 bilhões para 585 mil moradores de cerca de 13 municípios afetados pelo acidente causado pela Samarco.

Ainda de acordo com o documento, quase metade dos honorários da ação —que totalizariam R$ 1 bilhão— seriam cedidos pelos advogados e negociados na praça com um desconto de 62,45% do valor de face —o que resultaria em R$ 480 milhões pagos antecipadamente aos escritórios envolvidos na defesa da causa.

Para entrar no negócio, o investidor precisaria desembolsar ao menos R$ 37,5 mil (cota mínima). O retorno oferecido era de 55,65% ao ano ou 4,63% ao mês —quatro vezes mais que qualquer fundo de renda fixa do mercado.

A ação está em curso na Justiça Federal em Belo Horizonte (MG), ainda sem nenhuma decisão de mérito.

A compra e venda de créditos judiciais é uma modalidade de investimento praticada cada vez mais por importantes corretoras. São os chamados ativos judiciais.

A Samarco e seus controladores —a Vale e BHP— souberam da oferta da M4 ao mercado e fizeram uma denúncia à CVM, pedindo que ela fosse interrompida. A suspensão, no entanto, ainda não ocorreu.

Com o acidente ambiental provocado pelo estouro da barragem do Fundão, em 2015, a Samarco fechou um acordo com autoridades públicas e as vítimas passaram a receber indenizações por meio de um processo conduzido pela Renova, uma instituição independente criada com aval do Ministério Público, para gerenciar o problema.

Pelo Termo de Transação e Ajustamento de Conduta ficou acertado que qualquer ação judicial de caráter indenizatório só poderá ser paga via Renova.

As quatro associações hoje representadas por Temer somam praticamente toda a população já contemplada pela Renova, o que levanta dúvidas sobre o sucesso da ação civil pública movida por elas.

Por meio de assessoria, o ex-presidente confirmou a parceria na ação civil pública e recomendou que o advogado Diego Carvalho, da CBM Advogados, explicasse o caso.

Em entrevista à coluna, Carvalho afirmou que a ação se deve à inércia da Renova, que, desde 2016, ignora os danos causados à população pelo uso na água de tanfloc, substância cancerígena usada na mineração, ainda segundo ele.

O advogado disse ser ele próprio o autor (patrono) da ação civil e ter contatado Temer no primeiro semestre de 2022, pela sua capacidade de negociação e visibilidade para a causa. A M4 teria procurado seu escritório em 2023, após o ingresso do ex-presidente na causa.

"Foi comigo que eles assinaram um contrato para a negociação dos ativos", disse Carvalho. "O presidente Temer não é o patrono da causa."

O advogado disse que sua relação com o ex-presidente é de substabelecimento —Temer atuaria por meio de procuração.

Ele não quis revelar as condições de remuneração pactuadas porque o contrato está protegido por sigilo.

Sobre a M4, afirmou ter sido procurado pela empresa que ofereceu um ativo "que nada tem de ilegal e segue a legislação vigente.

"Se a M4 atuou de forma irregular no mercado, isso não posso dizer", disse Carvalho.

Procurado, o dono da M4, Paulo Rogério Barbosa da Silva, não respondeu aos diversos contatos feitos pela reportagem na sede da Monetae, outra empresa de seu grupo.

Consultadas, Samarco, Vale e BHP não quiseram comentar.

Com Diego Felix

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