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As conexões entre Mariana, Brumadinho e Maceió

Falhas no processo de licenciamento ambiental de atividades mineradoras são uma das causas das tragédias situadas em região de Mata Atlântica

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Luis Fernando Guedes Pinto

Diretor-executivo da Fundação SOS Mata Atlântica e membro da Rede Folha de Empreendedores Sociais

Malu Ribeiro

Diretora de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica

Bruno Stefanis

Presidente do Instituto Biota de Conservação

Maceió é uma das capitais dos 17 estados onde ocorre a Mata Atlântica no Brasil, assim como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador e Recife, entre outras. Um pouco mais da metade do território de Alagoas (55%) é ocupado pelo bioma, e sua situação reflete o drama da floresta mais ameaçada do Brasil —restam somente 10% do que havia em 1500.

Essa é a primeira conexão com as tragédias de Mariana e Brumadinho, localizadas na região de Mata Atlântica de Minas Gerais. A seguinte é que as três tragédias são decorrentes de atividades de empresas mineradoras. Vale, Samarco e BHP exploram minério de ferro em Minas Gerais e Braskem explora sal gema em Alagoas.

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Vista aérea de uma mina de sal gema, na cidade de Maceió (AL), explorada pela petroquímica Braskem - Ovni Áudios e Videos/Secom AL

Os rompimentos das barragens de rejeito de Mariana, em 2015, e de Brumadinho, em 2019, decorreram por falhas de ações humanas e resultaram na trágica morte de centenas de pessoas e na contaminação de rios e bacias hidrográficas em larga escala, com consequências sentidas até hoje pelas populações locais e pela biodiversidade.

O caso de Maceió ganhou visibilidade no início de dezembro, com a iminência da abertura de uma cratera na região onde, em 2018, houve o afundamento do solo em cinco bairros da cidade em função das atividades de diversas minas operadas pela Braskem.

O ocorrido, que não é um acidente natural, já afetou a moradia de mais de 60 mil pessoas e é considerado o maior desastre urbano da história do Brasil.

Os primeiros sinais da tragédia surgiram em 2018, mas a atividade mineradora se iniciou na década de 1970. Em 10 de dezembro de 2023, uma das minas rompeu e ainda não se sabe as consequências que isso trará para a Laguna Mundaú e para a região do entorno da mina.

A última e principal conexão entre os três casos, ou crimes, é a raiz na falha do processo de licenciamento ambiental das atividades mineradoras.

E, para isso, é importante entender que o licenciamento envolve a avaliação prévia do projeto a ser empreendido, a questão locacional, o desenho de atividades mitigadoras e compensatórias dos impactos ambientais e sociais que podem decorrer do projeto e o seu contínuo monitoramento, incluindo a revisão das medidas que garantam a segurança do projeto, dos ecossistemas e a minimização dos seus impactos.

Portanto, o licenciamento é um processo contínuo, fundamental para garantir segurança tanto para o empreendedor quanto para a sociedade.

Nos três casos, houve falha no processo de monitoramento da atividade mineradora, onde medidas preventivas não foram seguidas. A conduta irresponsável das empresas e dos responsáveis públicos e privados pelo licenciamento levou aos previsíveis desastres do rompimento das barragens em Minas Gerais e do afundamento do solo em Maceió.

O caso de Maceió também tem como marca o racismo ambiental ou o tratamento diferenciado das populações afetadas pela tragédia. A situação das famílias mais ricas e moradoras dos bairros mais nobres foram enfrentadas antes de se solucionar o drama das populações mais pobres e que vivem em bairros periféricos.

Tudo isto aponta para o Congresso Nacional, onde há um projeto de lei para se revisar o processo de licenciamento ambiental, por meio do projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental.

Mas há uma enorme chance de que isso se resuma à diminuição de etapas burocráticas, em vez de cumprir o papel de avaliar os riscos e prever medidas mitigadoras e compensadoras dos impactos socioambientais de empreendimentos ou até mesmo decidir pela inviabilidade de projetos com impactos incontornáveis.

Certamente, a legislação atual brasileira é reconhecida internacionalmente por sua qualidade. No entanto, mesmo com essa reputação, falhas nos processos de licenciamento continuam a ocorrer. A discussão em torno da possibilidade de flexibilização dessas leis levanta questionamentos pertinentes sobre os possíveis impactos desse movimento.

É inegável que os processos de licenciamento ambiental têm o objetivo de assegurar a sustentabilidade e a proteção dos recursos naturais. Qualquer redução nas exigências legais poderia comprometer a integridade dos ecossistemas, aumentando os impactos negativos sobre recursos ambientais essenciais e estratégicos.

É fundamental a ampla participação das organizações civis, da comunidade científica e de órgãos gestores para que o projeto de lei garanta a função primordial do licenciamento ambiental como uma ferramenta de gestão.

Principalmente para um país que tem planos ambiciosos e necessidades urgentes de infraestrutura para garantir prosperidade e alcançarmos objetivos de desenvolvimento sustentável e equitativo.

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