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Penas mais duras diminuem a violência?

Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, mas apesar de prendermos muito, prendemos mal

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O índice de mortes por homicídio no Brasil é assustadoramente elevado. Com efeito, como se vê na figura abaixo, a violência no continente latino-americano é ponto fora da curva no mapa mundial. Abrigamos os três países mais perigosos do mundo: Venezuela, Honduras e El Salvador. Na América do Sul, o Chile é a famosa exceção que corrobora a regra. O bem-estar das pessoas e o potencial de desenvolvimento econômico são seriamente afetados pelo crime. A violência resulta em vidas precocemente desperdiçadas, pois normalmente quem mata e morre são os mais jovens. Mas também consome tempo e recursos que, em vez de serem canalizados para a proteção da integridade física e patrimonial das pessoas, poderiam ser alocados para outros fins, digamos, mais interessantes. E mesmo quem consegue escapar da violência tem que pagar o custo psicológico associado ao medo constante, ao perigo latente, dentro e fora de casa. Como travar uma luta eficaz contra violência? O que sabemos da literatura e estudos de caso sobre o tema?

Mapa com homicídios pelo mundo
Homicídios pelo mundo - Por quê?/WDI/World Bank

Que o leitor não se irrite com a afirmação de que o tema é complexo, mas não há solução mágica para o problema. Há, sim, caminhos e descaminhos, e para escolher corretamente qual seguir, melhor um bom diagnóstico primeiro.

Comecemos pelas teorias falhas, representantes da esquerda e da direita ideológicas, respectivamente: “o crime é um problema social, o criminoso é vítima da sociedade” e “o crime é um problema moral, meu avô nasceu pobre e venceu pelo trabalho”.

Os dados mostram com clareza que, de fato, regiões mais desiguais são também lugares onde há maior número de homicídios. Mas daí para isentar o criminoso que mata alguém para roubar seu celular vai uma longa distância. E em que pese o tal avô fictício, a realidade é que ele é como a andorinha do ditado. A realidade é infelizmente mais dura: jovens que nascem em ambiente violento, de baixo capital humano, que não são devidamente assistidos pelo Estado e cuidados pela família têm mais chance de fazer escolhas ruins na vida, como entrar para o tráfico, por exemplo. No jargão do economista, seu conjunto de escolhas é bem mais restrito do que o do rapaz que frequentou boa escola, fez curso de computação e não apanhou do pai.

Beira o óbvio que no longo prazo uma educação pública de qualidade, menor desigualdade de renda e uma economia mais rica levariam a menores índices de violência.  O custo de oportunidade de ser bandido num país com boas escolas, ótimas perspectivas de trabalho e baixa desigualdade de renda é brutalmente elevado. Olhando pelo lado do benefício, simplesmente não parece valer a pena.

Há dois problemas quando se extrapola esse argumento, no entanto. Primeiro: esse desenvolvimento de longo prazo é em si dificultado pela própria violência (causalidade reversa). Segundo: na história do parágrafo anterior, falamos do declínio dos benefícios de ser criminoso. Mas qualquer análise que se preze precisa também incorporar o lado dos custos!

Talvez com a exceção dos crimes passionais, quem comete ato de violência faz implicitamente uma conta custo-benefício; o bandido não é um idiota, ele sabe bem dos riscos que corre. E a conta do lado dos custos é probabilística: ele leva em conta a probabilidade de ser pego e a penalidade que lhe imposta será caso pego. Em resumo, a equação é: custo = probabilidade prisão X pena.

No Brasil, não estão centralizados os dados de homicídios resolvidos. Mas, com base nos números apurados pelo Ministério da Justiça, pesquisadores da área chegam a algo entre 2% e 5%. Isso mesmo, a cada 100 assassinatos, não mais que cinco terminam com o criminoso preso. Somos péssimos em capturar assassinos. Nos Estados Unidos, esse número está mais para 70%, ou seja, é 20 vezes maior.

É por esse motivo que vemos com cautela o plano de segurança do governo: ele visa endurecer as penas, entre outras coisas. Não discordamos, mas o crucial não é isso. É, sim, aumentar a probabilidade de capturar o assassino. E para isso é preciso investir mais em inteligência policial, capacidade de resolver casos. Veja, se a probabilidade de ser pego sobe de 3% para modestos 30%, o custo de matar alguém decuplica, muda de ordem de grandeza.

Por fim, dadas as imperfeições do sistema penitenciário, é crucial prender apenas quem de fato constitui risco para a sociedade, e encontrar penas alternativas para o famoso ladrão de galinhas. Ponha um ladrão de galinhas ou um aviãozinho na prisão e terminamos com um criminoso de alta periculosidade depois.

Para o moralista, o cara que furta uma bicicleta e o que assalta à mão armada têm que terminar em cana.

Mas não é por aí que reduziremos a violência. O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, o que mostra que não prendemos pouco. Mas apesar de prendermos muito, prendemos mal. 

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