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A aposta arriscada de Lula em relação ao Banco Central

Redução da Selic pelo BC será interpretada como decisão técnica ou política?

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Mauro Rodrigues

Professor de economia na USP e autor do livro "Sob a Lupa do Economista"

As decisões do Banco Central, assim como as de qualquer órgão do governo, podem sempre ser criticadas. Há espaço para debate sobre o valor da taxa Selic estipulado pela instituição. Entretanto o Executivo está fazendo isso de maneira contraproducente, colocando pressão pesada sobre a instituição. A discussão não se dá em termos técnicos e frequentemente apela para o lado pessoal –por exemplo, focando potenciais motivos escusos do presidente do Banco Central, sem nenhuma base factual para tal.

A racionalidade por trás da autonomia do Banco Central é blindar a instituição de pressões políticas. Há sempre o cenário em que o Executivo subjugará o Banco Central, utilizando a política monetária para fechar o rombo nas contas públicas, o que descamba em inflação alta. Esse cenário não é uma ficção teórica de economistas. Nosso passado recente de hiperinflação (que durou até meados dos anos 1990) mostra exatamente esse mecanismo em operação. Atualmente, nossa vizinha Argentina, cuja inflação de 12 meses acaba de chegar aos três dígitos, vive esse drama.

Com a autonomia, o presidente da República não pode demitir os diretores do Banco Central. Ele precisa esperar os mandatos se encerrarem para apontar sucessores. E os mandatos dos diretores não coincidem com o do chefe de Estado. Isso, em tese, reduz o potencial do Executivo em interferir nos rumos da política monetária. O cenário ruim de inflação alta torna-se menos provável, reduzindo as expectativas de inflação.

É importante pontuar que, por autonomia, entende-se que o Banco Central escolhe os instrumentos para manter a inflação o mais próximo possível da meta. Mas a instituição não determina a meta de inflação –quem o faz é o Conselho Monetário Nacional, formado pelo presidente do Banco Central e pelos ministros da Fazenda e do Planejamento.

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em evento em Brasília - Edu Andrade - 6.mar.23/Ascom/MF

Controlar as expectativas é crucial para o controle da própria inflação. Isso porque muitos preços na economia são rígidos, isto é, eles só mudam de tempos em tempos. Quem está reajustando o preço hoje não quer que ele fique muito desatualizado (nem muito alto, nem muito baixo) durante o tempo em que ele permanecerá parado. Como não se sabe qual será a inflação no futuro, muitos reajustes são feitos com base em expectativas.

Se a expectativa de inflação é elevada, os reajustes hoje serão mais agressivos, o que contribui para impulsionar a inflação no presente. A autonomia do Banco Central, ao manter as expectativas ancoradas, ajuda a colocar rédeas nesse processo.

No entanto, a autonomia no papel não é condição suficiente. É preciso que o Banco Central seja percebido como uma instituição de fato autônoma, cujo principal objetivo é manter a inflação sob controle. Por isso a estratégia do Executivo de pressionar o Banco Central é extremamente arriscada. Quando o Banco Central finalmente baixar a Selic, isso será interpretado como uma decisão técnica ou parecerá que ele finalmente cedeu às pressões do presidente Lula?

Se a interpretação do público pender para o segundo caso, a percepção de autonomia do Banco Central cai por terra (mesmo com a autonomia no papel). Trata-se de um convite para que as expectativas se desancorem. Nessa situação, controlar a inflação se tornaria uma tarefa ainda mais difícil e custosa.

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