Reinaldo Azevedo

Jornalista, autor de “Máximas de um País Mínimo”

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Reinaldo Azevedo

Petistas que atacam aliança com Alckmin fazem um favor a Lula

Os conservadores e reaças brasileiros não sabem nada sobre mal menor. Mas têm tradição firmada no mal maior

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Correntes do PT avessas a uma chapa Lula-Alckmin e potenciais aliados à esquerda cumprem o seu papel: criticam a eventual aliança, apontam as contradições tidas por inelutáveis, ressuscitam momentos em que os dois políticos estiveram em trincheiras opostas —inclusive na eleição de 2006— e pintam a composição com as tintas de uma conciliação inaceitável. A coisa chega a ter um lado pitoresco.

Ao longo da história, os setores mais à esquerda do partido sempre prestaram um serviço ao líder: cobraram dele a radicalização, de modo a lhe dar a oportunidade de fazer a escolha pela moderação. Não chega a ser um jogo combinado. Trata-se de acordos —ou desacordos— tácitos. Assim, a resistência ao ex-tucano não é um problema, mas um dado do jogo.

Alckmin será o vice de Lula? Não sei. Mas ou haverá esse sinal de que o ex-presidente pretende, se vitorioso, um governo além das fronteiras da esquerda, ou outro se fará necessário. O compromisso —que, parece-me, é público— já está anunciado. E, é evidente, pensando o que penso, avalio que um governo o mais amplo possível é uma solução, não um problema.

O ex-goernador Geraldo Alckmin e o ex-presidente Lula se reencontram em jantar promovido pelo grupo Prerrogativas
O ex-governador Geraldo Alckmin e o ex-presidente Lula - Ricardo Stuckert/Divulgação

A exemplo de todo político que conta realmente com uma militância —sim, Bolsonaro também tem a sua...—, o líder petista tem de ser haver com seus puristas, seus exclusivistas, seus sectários, seus extremistas. A questão é saber se vai liderá-los, escolhendo o caminho, ou será caudatário de visionários do próprio delírio. Em seu processo de construção, o PT fez muitas escolhas que seriam insanas caso fosse ele o protagonista da história.

Recusou-se, por exemplo, a participar do Colégio Eleitoral que elegeu Tancredo Neves. Sempre considerei a decisão lamentável, mas nunca temerária. Não tinha o protagonismo. A solução se daria com ou sem a concordância da legenda, que apostava na definição da própria identidade. Oportunista, sim, mas com risco zero à democracia. Em 2022, sendo a legenda mais bem-sucedida em eleições realmente democráticas, há o peso da responsabilidade de um eventual quinto mandato.

"Alckmin é um aceno do PT para os mercados, Reinaldo?" Ah, caras e caros, não me dedico a jogos dessa natureza. Esses "mercáduz" de que falam são os mesmos que viam virtudes naquele tal que achava o estupro uma distinção, coisa de merecimento? Para quem quilombolas se pesavam em arrobas? Que tinha um torturador como herói? Que prometia extinguir o Ministério do Meio Ambiente?

Curioso! Nunca se cobrou do biltre uma "Carta ao Povo Brasileiro" assegurando compromissos com a ordem democrática, não é mesmo? Ao contrário até! Dava-se de barato que o ogro era apenas um ser meio apalhaçado, que serviria para conjurar as forças que não queriam a volta do PT, mas que ele acabaria, no fim das contas, se submetendo aos limites institucionais.

Mentira! Fiel a si mesmo, à sua pregação e a seus extremistas, tentou romper os limites da legalidade e, como resta sabido, testou as possibilidades de um golpe de estado. Não venham com a conversa de que Lula está obrigado a oferecer credenciais de confiabilidade a esses "mercáduz" —Alckmin ou outras quaisquer.

Os que jamais cobraram de um postulante com evidente discurso fascistóide o compromisso com a civilidade gostariam agora de arrancar de um candidato de oposição a promessa solene de que nada mudará, por exemplo, no teto de gastos —que acabou faz tempo— ou na reforma trabalhista? E o fazem em nome do que chamam "previsibilidade"? Ora...

Se o PT realmente levar adiante a aliança com Alckmin, o ex-governador, parece-me, representa a garantia adicional de um modo de fazer as coisas, buscando, reitere-se, o diálogo amplo. Até porque, no semipresidencialismo informal que temos, ninguém governa sem o Congresso.

Mas é evidente que o ex-tucano não seria a garantia de que Lula, se eleito, deixaria tudo como está. A continuidade tem várias nuances, não é mesmo? E todas elas se juntarão contra o PT, de novo, num eventual segundo turno. Afinal, os conservadores e reaças brasileiros não sabem nada sobre mal menor. Mas têm tradição firmada no mal maior.

Bolsonaro é a prova.

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