Reinaldo Azevedo

Jornalista, autor de “Máximas de um País Mínimo”

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Reinaldo Azevedo
Descrição de chapéu Eleições 2022 Datafolha

Datafolha mostra que maioria vê a democracia como o melhor plano de governo

E se Bolsonaro vencer? Será preciso refazer o país desde o fim

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Os números da pesquisa Datafolha indicam que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem chance de se sagrar vitorioso no primeiro turno. Fossem os 50% a metade exata, poderia faltar o seu voto, leitor. O embate se dá só no domingo, e a experiência indica que a gente só acerta as previsões que antecedem as 48 horas depois do fato consumado. Neste espaço, quando ainda se discutia a quimera da "terceira via", antevi um embate bem mais acirrado entre os dois primeiros colocados do que apontam as pesquisas. A ver. Certamente subestimei a disposição fanática de Jair Bolsonaro para a truculência contraproducente.

Caso as coisas se resolvam em favor de Lula no dia 2 ou no dia 30, muitas linhas se produzirão para saber o que mais pesou na definição do resultado. Foi o petista a conduzir uma campanha quase sem erros —como avalio—, ou foi sua nêmesis a cometer toda sorte de desatinos para manter unidos seus celerados? O que lhe terá garantido o conforto do segundo lugar também terá impedido a sua vitória. "E se Bolsonaro vencer, Reinaldo?" Bem, caras e caros, aí será preciso, um dia, refazer o país desde o fim.

LULA X BOLSONARO
Lula e Bolsonaro - Marlene Bergamo/Folhapress e Adriano Machado/Reuters

Há pelo menos três semanas se intensificaram as cobranças —oriundas mais das viúvas e dos viúvos da Lava Jato do que do mercado— para que o petista apresente o tal plano detalhado de governo, ou, então, afirma-se, o eleitorado estaria lhe dando "um cheque em branco", metáfora que, convenham, precisa, quando menos, ser atualizada. Vai ser o quê? Chave do Pix? Quem sabe o "aggiornamento" das figuras de linguagem induzam senão à modernização do pensamento, ao menos a uma perspectiva realista.

Tenho cá, como todo mundo, as minhas ilusões sobre o futuro, mas o realismo é meu modo de ser otimista. Quando Lula afirma que é preciso saber com que Congresso teria de governar para chegar a minudências de um plano de governo, isso não é desconversa, mas reconhecimento dos limites da realidade.

O Orçamento de 2023, por exemplo, é uma peça de ficção, com a chancela de Paulo Guedes, que começou a sua trajetória no governo como reformador do mundo e termina como corretor imobiliário de praias, escrevendo a sua própria versão de "Bancarrota Blues", de Chico Buarque. Eu o imagino, afetando uma inteligência que jamais terá, a cantar, estalando polegar e dedo médio para acompanhar o ritmo: "Ninguém me tira nem por mal/ Mas posso vender/ Deixe algum sinal"... É o Pestana do liberalismo chinfrim. Explica-se por que tucanos e petistas o renegaram e foi justamente Bolsonaro a lhe dar guarida.

Não há dinheiro previsto para pagar os R$ 600 do Bolsa Família —"Auxílio Brasil" é bolsonarês arcaico. Os R$ 200 a mais fazem parte do Pix de R$ 41 bilhões que Bolsonaro enviou para si mesmo, junto com os benefícios pagos para caminhoneiros e taxistas. A tal PEC apelidada de "Kamikaze" e a do ICMS dos combustíveis são escancaradamente ilegais e concorrem para falsear Orçamento, teto de gastos, preços, inflação, crescimento, arrecadação, tudo. Nada ficou no lugar. E se vem exigir de Lula que detalhe, em meio ao mar revolto, cada trecho da trilha quando —e se— chegar à terra firme? Pior: alguns donos do dinheiro que condescenderam ou aplaudiram as lambanças do biltre reforçam a pressão. E há, sim, os de boa-fé a fazer cobranças, mas representam a exceção.

Também não é despropositado que Lula apele a seu compromisso passado com a Lei de Responsabilidade Fiscal para sinalizar a indisposição para a lambança. Não prometeu, em 2002, alçar o Brasil a "grau de investimento", condição reconhecida pelas três principais agências de classificação de risco entre 2008 e 2009. Já o luminar da Escola de Chicago chegou propondo a revolução liberal e termina seus dias como mascate do nosso litoral. Se Bolsonaro perder, fiquemos atentos, restam ainda dois ou três meses para planejar o dilúvio.

Estão aí os números do Datafolha. A maioria entende, por ora, que o grande plano de governo é a democracia, tese a que resistem as viúvas e os viúvos da Lava Jato. Ou não teriam colaborado para jogar o Brasil no buraco com seu moralismo obtuso e autoritário, que é sempre o túmulo da moral.

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