Renato Terra

Roteirista e autor de “Diário da Dilma”. Dirigiu o documentário “Uma Noite em 67”.

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Renato Terra

Alegria é a prova dos nove

Como reagir ao obscurantismo?

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Gilberto Gil saiu da prisão numa Quarta-Feira de Cinzas. A ditadura militar imperava naquele ano de 1969. Meses antes, em dezembro de 1968, Gil e Caetano ficaram numa solitária por uma semana e mais dois meses encarcerados. Demoraram para saber por que estavam presos. A acusação foi uma fake news espalhada pelo comunicador Randal Juliano de que os tropicalistas tinham "deturpado o hino nacional" num show. Com a mentira desfeita, Caetano e Gil foram soltos. Mas eram obrigados a se apresentar todo dia no Exército. Foram praticamente expulsos do Brasil.

Mas Gilberto Gil saiu da prisão numa Quarta-Feira de Cinzas. As imagens do que restou do Carnaval —que ele não viu— foram suficientes para despertar sua força criadora. Nesse contexto de ditadura, prisão e crueldade, Gil compôs uma música de despedida que irradiava alegria. O Brasil inteiro cantou "Aquele Abraço" quando Caetano e Gil foram embora.

Sobre um fundo amarelo há uma boca magenta com dentes brancos, gengiva cyan e garganta preta sorrindo.
Ilustração de Débora Gonzales para coluna de Renato Terra - Débora Gonzales

"Quando eu cheguei ao Brasil, estava uma tristeza, uma melancolia. Você não pode fazer da melancolia um objeto de luta cultural no Brasil que você está cometendo um grave erro, e um pecado contra o Brasil", disse Cacá Diegues sobre o seu retorno depois do exílio. Em 1972, ainda sob ditadura, Cacá lançou o filme "Quando o Carnaval Chegar", um musical solar com Chico Buarque, Maria Bethânia, Nara Leão, Hugo Carvana e Antonio Pitanga.

"Nunca consegui dar um passo à frente que não fosse vestido num momento de alegria. Eu acho que a alegria é, de fato, transformadora. A alegria é uma invenção de uma superação de algo", disse Bia Lessa no filme "Alegria é a Prova dos Nove", de Murilo Salles.

A frase que batiza o filme (e batiza esta coluna) está no "Manifesto Antropófago" de Oswald de Andrade. O modernismo, de certa forma, empoderou a alegria e esparramou frutos que, misturados com outros ingredientes, foram dar no tropicalismo, em Caetano, Gil, Cacá Diegues e Bia Lessa.

Uma alegria criativa que transformou a sofrência num alívio coletivo, o funk carioca na música pop mais poderosa do mundo, que move o melhor de cada um de nós, que aponta pro futuro com esperança.

Num momento em que estamos inundados na lama dos clubes de tiro, dos pastores que pregam a idolatria ao ódio, das mentiras são impulsionadas pelo ressentimento, cabe apostar na alegria.

Quem viu o filme "No", dirigido por Pablo Larraín, sabe o que estou dizendo. A alegria já vem.

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